Parte III - Ame Elise

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   Teodoro sentiu um alívio, as palavras lhe faziam rodopiar pelo ar. Estava contente em ter a certeza de que Elise não temia a criatura. Eles se entendiam. Os três estavam juntos e precisavam concluir o serviço.

    —Quem é a garota? —Questionou a cúmplice.

    —Não sei, quando acordei já estava aí. Você não a conhece?

    —Não posso afirmar com o rosto nessa situação. Você fez um belo de um trabalho, hein? —Teodoro inclinou a cabeça, envergonhado do ato. —Tudo bem, precisamos separar todos os membros e colocá-los em sacos de lixo. Assim ficará mais fácil para levá-los para incineração.

    —Incineração?

    —Sim, vamos dividir o corpo em pedaços menores e camuflar entre os lixos da cozinha e do banheiro. A coleta é feita toda segunda-feira, ou seja, amanhã. É uma ideia arriscada, mas acho que é a única que temos. Você consegue me ajudar com isso?

    —Ce..certo.

   As funções de Teodoro eram assistir ao mutilamento, abrir os sacos plásticos e vez ou outra ajudar Elise quando precisava romper algum osso. As mãos delicadas executavam a tarefa com enorme maestria, como se já tivessem feito aquilo em inúmeras ocasiões. A garota transformara o cômodo em seu próprio açougue, hora nenhuma demonstrando hesitação ao degolar ou picotar a vítima.

   Então isso é o amor. Pensou a criatura. O amor era capaz de transformar qualquer barbárie em um pequeno deslize.

   Os pensamentos foram silenciados pelo toque histérico do telefone da casa. O relógio marcava 9:30, Teodoro estava atrasado para o trabalho. Provavelmente Messias ligava para a residência procurando o paradeiro do colega, foi o que Elise supôs. Tentou acalmar o namorado e pediu que agisse naturalmente, além de não prolongar muito a conversa.

   O telefonema foi seguido de confirmações de cabeça, franzimentos de testa, encolhimento de sobrancelhas. Elise entendia que as expressões faciais sinalizavam notícias não muito boas, já estava preparada para o pior.

    —Quem é Mônica? —Indagou Teodoro. Viu-se uma reação de surpresa surgir. A parceira demonstrava os primeiros sinais de nervosismo.

    —Eu não a conheço.

    —Quem é Mônica? -Um grito estridente pulou da garganta. Estava completamente agitado.  —Por quê está mentindo pra mim?

    —Eu não sei do que está falando.

    —Messias me falou da Mônica. Ela estava aqui ontem, mas não voltou pra casa. Estão procurando por ela. Eu acho que você a conhece.

    —Teo, você está completamente fora de si, está alucinando. É comum em situações de muito estresse. -Tentava se aproximar, mas os gritos do namorado a repeliam instantaneamente.

    —Eu.. eu acho que é ela quem está na cozinha. E eu acho que você fez isso a ela.

    —Como você pode dizer isso, Teodoro? Depois de eu ter me sacrificado para limpar a bagunça que você mesmo fez é assim que você me retribui?

    —Você estava o tempo todo me manipulando. Não fui eu que escrevi todos esses recados, eu nunca faria algo como isso.

    —De onde você tira essas conclusões?

    —Eu sei disso por que Mônica era minha namorada, não você.

    —Nunca houve nenhuma Mônica, você está enganado. Eu te amo, você precisa acreditar em mim. Se o sentimento é recíproco, sabe que essa é a verdade. Apesar de não se lembrar, eu sei que você sente, que sabe o que aconteceu.

Peixes Artificiais Não Nadam no Escuro (Um conto)Onde histórias criam vida. Descubra agora