Comatose

ACT03: INFERNUM

C A P Í T U L O T R Ê S ― C O M A T O S E

"Com pernas listradas açucaradas, o Homem-Aranha vem sorrateiramente pelas sombras do sol do entardecer, roubando o passado das janelas dos abençoadamente mortos, procurando pela vítima, tremendo na cama, buscando pelo medo na penumbra do recolhimento. E de repente um movimento no canto do quarto. E não há nada que eu possa fazer quando percebo com pavor que o Homem-Aranha vai fazer de mim o seu jantar desta noite."― The Cure.

I N F E R N U M

Konoha, Japão ― 17 de Dezembro de 2019, 05:24

Quando abriu os olhos durante aquela madrugada, sentindo o vento gelado agredindo seu rosto, Sakura não lembrava-se ao certo de como havia perdido a consciência. Antes do cheiro de terra molhada invadir seu olfato, ela sentiu uma dor indescritivelmente aguda em sua cabeça. Seus olhos lacrimejavam com a velocidade em que se movimentava, e sua perna, a mesma atingida pelo estilhaço do espelho, estava dormente ao ponto de não senti-la mais.

Ela remexeu-se, mas algo a apertava com firmeza, como cordas grossas envolvendo seu corpo. Sakura moveu o rosto com dificuldades, e viu através de sua visão embaçada, vultos esverdeados passarem rapidamente a sua volta. O som do farfalhar das folhas molhadas, o cheiro de chuva recém-encerrada, e o frio alarmante penetrando sua espinha. Tudo isso trouxe a ela uma confusão momentânea, que aos poucos se auto explicou em sua mente ainda conturbada. Demorou algum tempo para perceber que saltavam sobre galhos, no alto de um arvoredo de pinheiros. Não ela, exatamente. Seu corpo estava mole, fraco e dolorido, mas alguém a carregava. Sentiu então abaixo de si o tecido gélido de algodão, úmido e macio.

Ergueu os olhos ainda mal acostumados, e viu primeiro a pele branca e macia transluzir em meio a escuridão, depois os lábios delicados e impecáveis, e por fim, os cabelos vermelhos sacudirem ao vento, como as chamas de uma fogueira. Gaara era inconfundível, mesmo que estivesse em meio a uma multidão.

Sakura sentiu-se como um fantasma, enquanto disparavam através do labirinto de árvores e da neblina densa. Um frio aloprou-se na boca de seu estômago, e seu coração pulsou como nunca. Ela podia sentir os troncos passando a centímetros de distância de seu rosto, mas jamais os tocava, como se mesmo naquela velocidade inumana, a condução de seus movimentos fosse mais do que precisa.

O céu escuro através das copas das árvores fez com que concluísse que não muito tempo havia se passado desde que tudo aquilo ocorrera. Ela estava tão apavorada, que com a pouca força que lhe restava, apertou o tecido do sobretudo dele entre os dedos. Gaara abaixou os olhos em sua direção, diminuindo a velocidade aos poucos.

― Espere! ― ele gritou, mas não para ela. Os dois pousaram em cima de um galho grosso, e permaneceram parados até que aos poucos, tudo em sua volta parasse de girar. Gaara tentou colocá-la de pé à sua frente, mas os músculos de Sakura não reagiram. O enjôo se fez presente em seu corpo, e com as pernas bambas, ela quase tombou, apoiando-se no tronco da árvore.

Seu coração batia forte, assustado. E sua visão ainda estava meio turva. A sola de seus pés descalços entraram em atrito quando se chocaram com o frio e úmido da madeira, correndo sua pele fina com toda a aspereza.

Gaara permaneceu de pé ao seu lado, pronto para segurá-la caso perdesse o equilíbrio. Mas Sakura aos poucos conseguiu conseguiu se equilibrar, ainda sentindo sua cabeça girar.

― Lei sta bene? ― ouviu uma segunda voz dizer, um pouco mais distante de si. Ela reconheceu a voz, mas no momento, o zumbido em seus ouvidos lhe deixou incapaz de raciocinar.