O movimento cauteloso da mão do jovem estudante na maçaneta da grande porta não foi o suficiente para manter a sua presença despercebida no ambiente. Pôde-se ouvir o sistema de vedação contraindo-se tanto quanto o ruído das dobradiças à medida que suas digitais empurravam levemente a madeira e seus passos temerosos adentravam o escritório, o qual mantinha-se tão ausente de iluminação quanto a rua mais sombria de uma cidade deserta. Parecia uma prisão psicológica e claustrofóbica, mesmo que houvesse espaço suficiente para locomover-se.
O garoto esperou seus olhos se adequarem à escuridão para que pudesse visualizar minimamente onde estaria o interruptor, pois por mais que estivesse familiarizado com o lugar no qual estava, não tinha uma memória tão boa quanto gostaria. Suspirou com aborrecimento por ter de manter sempre o máximo de silêncio possível quando precisava ir naquela sala, uma vez que era exaustivo controlar até sua respiração para não ser repreendido por ser o responsável pela quebra da quietude.
Velho carrancudo. Balançou a cabeça para espantar seus pensamentos inoportunos, se não os controlasse poderia dizê-los em voz alta e as consequências não seriam algo que valeria a pena a satisfação de exteriorizar suas opiniões reprimidas.
— Senhor? — A voz permaneceu serena enquanto acendia a luz. Revirou os olhos ao testemunhar sua solidão, tanta cautela para absolutamente nada. Odiava quando isso acontecia, pois se sentia uma criança tola com medo da própria imaginação.
Segurava pesadas sacolas, as quais já marcavam sua palma e tornava-a avermelhada, infelizmente esse sofrimento era um de seus trabalhos como participante do grêmio estudantil. Entretanto, sem a presença antipática e dominadora do professor, se sentia mais à vontade para caminhar como alguém normalmente o faria e se livrou imediatamente dos materiais cansativos que sobrecarregavam suas mãos, colocando-os acima de um assento estofado na extremidade esquerda da sala, ao lado da larga estante.
Dedilhou entre os inúmeros exemplares perfeitamente organizados e higienizados que compunham as prateleiras. Aquele conjunto de livros representava anos de pesquisas, anos de leituras cansativas, porém, esclarecedoras.
Cada obra continha um assunto em específico: as Criaturas Obscuras, a matéria que o seu professor, no momento ausente, ministrava naquela escola. Os livros eram categorizados entre os de conhecimento público e os mais raros, totalizando a sua preciosa e gigantesca coleção. Havia demorado um ano inteiro para conquistar a confiança do mais velho ao ponto de ter a permissão para folheá-los, ainda que somente em sua companhia.
Por fim, em um ato repentino de destemor, sentou na cadeira central tão temida por todos os que frequentavam o colégio Oaken e olhou à sua volta. Talvez não devesse exceder-se nas ações, a sorte que estava usufruindo não era ilimitada. Sabia disso, mas... Era incrível.
A escolha dos componentes do escritório aparentavam ter sido previamente planejados para não somente dar a sensação de imponência como também provocar inquietação aos visitantes, desde os indesejados aos já aguardados. Quando não eram tingidos de preto, era de uma cor escura semelhante, até mesmo os detalhes em madeira de alguns móveis mantinham a pigmentação similar. As cortinas blackout tocavam o chão, estas sendo posicionadas por trás da larga escrivaninha, a qual estava repleta de caixas abertas com inúmeros papéis preenchendo-as, e sendo o exato local em que o jovem rodopiava inocentemente com a cadeira.
E então seus pés pararam de se mover. Seus olhos fixaram-se no objeto que tanto chamou a sua atenção: o armário metálico de duas portas. Sabia que em seu interior incluía os arquivos de cada expedição secreta que seu docente fora solicitado auxiliar devido aos seus conhecimentos, casos extraordinários e pouco comentados publicamente, os quais geralmente eram protegidos pelo cadeado que só poderia ser aberto com uma chave específica. Porém, com um brilho perigoso em seu olhar e a satisfação refletida em seu rosto por um meio sorriso presunçoso, percebeu a ausência da familiar proteção.
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Que o medo nos acuda
FanficLendas são meias-verdades. Dentre as histórias horripilantes que são contadas para os inúmeros jovens que povoam os mundos, há aquelas cujo detalhes são baseadas em fatos, não apenas em imaginação e, por isso, conseguem surpreender mais os ouvintes...