Capítulo 4 - Alice

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Nunca tinha ficado tão agitada como naquele dia. Há cerca de um mês André me perseguia por todos os lugares da academia.
Minha insegurança me fazia perder a respiração cada vez que ele se aproximava e colocava as mãos suavemente nas minhas ou colocava meu cabelo atrás da orelha.
Estava aguardando do lado de fora até que a sala esvaziasse para que eu pudesse ensaiar, quando fui surpreendida por ele.
Quando foi cumprimentar-me, seus lábios tocaram o meu num leve esbarrão e senti minhas pernas amolecerem. Eu já tinha um amor platônico por ele, e toda aquela atenção me fizeram ficar ainda mais apaixonada.
Ele era lindo! Tão lindo que eu não conseguia pensar em mais nada.
- Alice, por favor, vamos sair?
- Não posso André! Tenho que ensaiar.
- Um dia só! Por favor!
Fiz um gesto negativo quando todo meu corpo queria gritar sim!
- Então me passa seu celular?
- Quebrou!
Era a pior das mentiras! Meu pai jamais me deixou ter um.
- Tudo bem! Então assim que acabar sua aula, me encontra lá nos fundos da academia que tenho um presente para você.
- Tudo bem!
- Plié! Plié! Alice, onde você está com a cabeça hoje? Preste atenção!
A professora ralhou comigo pela terceira vez, mas eu não conseguia concentrar-me.
Assim que a aula acabou, peguei minhas coisas no armário que ficava no corredor e fui até os fundos da academia onde André me esperava.
- Puxa, estava com receio que não viesse.
- Falei que vinha! Estava sem graça diante dele.
- Quero te dar uma coisa!
Aproximou-se de mim devagar e sem que eu esperasse, seus lábios encontraram os meus. Sentia minha boca sendo invadida e apesar do medo que estava sentindo, meu coração batia acelerado.
Foi um minuto que pareceram horas e ele me apertou entre seus braços.
– Minha linda Alice!
Beijou meus lábios rapidamente e abracei ele de volta. – Agora vá antes que alguém chegue para te buscar.
Quando estava saindo, André me chamou.
- Até amanhã Alice!
Quando cheguei na porta dei de cara com meu pai. – Onde estava?
- No banheiro pai!
- Vamos! Estou com pressa!
Eu não conseguia dormir, tamanha era minha felicidade. Nos meus sonhos, eu me via sendo amada e tendo todo o amor que nunca tinha experimentado naquela vida. Não fosse Tomaz, eu nem saberia o significado daquela palavra.
Queria muito poder falar com Tereza e arrumei um pretexto para chegar mais cedo no estúdio, pois sabia que estaria por lá naquele dia.
-  Pai, a professora pediu que eu chegue mais cedo hoje.
- Por que?
- Por que eu fui escolhida para ser a bailarina principal e terei que treinar com mais rigor que as demais meninas.
Não era uma mentira! Eu realmente tinha sido escolhida, mas eu já treinava em excesso.
- Você foi a escolhida? Exultou.
-  É claro que você pode ir! Minha filha será a melhor bailarina do Municipal!
Cheguei na academia a tempo de encontrar Tereza e contar para ela todas as novidades.
- Puxa como fico feliz por você Alice! Só quero que tome cuidado...você sabe, é muito inexperiente.
- Pode deixar Tere!  Serei cuidadosa!
- Deus o livre o tio saber disso! Ele te mata!
- Vou tomar cuidado, mas estou tão feliz! Nem podia imaginar que ele notasse minha existência.
- Isso é para você ver! Quando eu falo que a gente tem que confiar no nosso taco. Por falar em taco, menina, conheci um amigo do Tomaz que me deixou de queixo caído.
- É? Falei curiosa.
- Menina, o homem é um touro! Alto, forte, másculo! Lindo e simpático! Rafael. Vou sair novamente com ele amanhã.
- Boa sorte então! Não posso me atrasar, mas se puder, passa lá em casa Tere. Sinto sua falta!
- Vou sim Alice!
De tempos em tempos eu olhava para fora, estranhando a demora de André e por um momento senti como se meu chão fosse arrancado. Quando finalmente achei que ele não apareceria, encontrei um bilhete dentro do meu armário.
Assim que cheguei aos fundos da academia, novamente surpreendeu-me com um beijo na boca, mas dessa vez foi mais furioso. Ficamos num canto que parecia um local onde velhos equipamentos estavam amontoados.
Só que beijou-me tantas vezes que cheguei a perder o folego e sentia meus lábios dormentes.
O medo me dominava na mesma proporção que a aventura e comentei: André, alguém pode nos ver!
- Fique tranquila Alice! Eu conheço bem o zelador e aqui não vem ninguém.
Ficamos nos beijando por um bom tempo, até que nos despedimos. – Até amanhã minha linda Alice!
Ter a sensação de estar apaixonada e ser correspondida me animou. Eu simplesmente não conseguia parar de sorrir!
Os dias foram passando e nossos encontros tornaram-se cada vez mais longos. Eu não conseguia ser rápida e comecei a me atrasar para os ensaios.
Era noite quando encontrei o motorista me aguardando. Cheguei e fui direto pro banho. Estava me trocando quando fui surpreendida por papai completamente furioso invadindo meu quarto.
Estava só de calcinha e coloquei a toalha sobre meus seios envergonhada.
- Deixe ela terminar de se trocar!
Mamãe suplicou e senti o terror me varrer.
- Onde você tem ido? A pergunta foi feita de forma feroz e eu sabia que estava perdida.
- Nos ensaios pai!
A bofetada em meu rosto foi tão forte que senti tudo rodar.
- Mentirosa! Sua professora me telefonou por conta de seus atrasos.
Fiquei em silêncio esperando pelo que viria e meus olhos pediram socorro silenciosamente para minha mãe, que não fez nada.
Quando ele colocou as mãos na fivela e começou a abrir o cinto, eu sabia o que viria e enquanto o couro cortava minha pele nas costas, barriga e todos os lugares que cruzavam sua fúria, eu rezava para terminar.
Quando finalmente ele cansou de me espancar, saiu batendo a porta e mamãe chorava parada, sem fazer nada.
Eu não conseguia me mexer. Tudo doía tanto que eu desejava estar morta. Pensar em André era a única coisa que me fez sentir melhor.
Chorei a noite toda e no dia seguinte não tinha condições de dançar. Roguei à Deus que papai me deixasse em paz e fui atendida.
Passei o dia todo deitada, ainda sentindo meu corpo arder. Quando fui tomar banho, as marcas deixavam evidente o tamanho da fúria.
A cada surra eu abria mão de coisas que ele achava desnecessárias: TV, livros, escola e Tereza! De todas as perdas, ficar longe da minha prima foi a pior.
Estava disposta a não abrir mão de André, nem que custasse minha vida.
Depois de três dias retornei à academia e encontrei diversos bilhetes dele dentro do meu armário. Ele deixou endereço e o telefone para que pudesse encontra-lo.
Estava com receio de papai. Por cautela, guardei os bilhetes no fundo da minha mochila e esperei.
No horário que costumávamos nos encontrar, fui até lá e ele andava de um lado para outro.
- Alice! O que aconteceu? Estava preocupado.
- Meu pai descobriu que estou atrasando para os ensaios. Não posso ficar aqui! Só queria te avisar.
- Meu amor, você não imagina a falta que senti de você! Por favor, vamos conversar na hora do almoço?
Concordei com receio de minha demora.
- Não aqui! Vamos ao meu apartamento aqui perto, assim não corremos o risco de seu pai saber de algo.
- Tudo bem!
Voltei a tempo de não levantar suspeitas e na hora do almoço, me troquei rapidamente. Caminhei até a esquina, onde havíamos combinado.
Eu olhava para os lados sem parar, com receio. O apartamento dele era realmente muito perto e logo chegamos.
Assim que entramos, fechou a porta e me abraçou com carinho.
- Amor, senti tanto sua falta!
Os beijos amenos foram ganhando ritmo e logo André estava sobre mim no pequeno sofá. Eu sabia que era errado, mas eu já tinha dezoito anos e nunca tinha vivido nada parecido.
André estava afoito e acariciou meus seios sobre a blusa. Estava tão nervosa que não sabia ao certo o que senti e o medo que ele visse que eu havia apanhado de papai, me apavorou.
Tentou erguer meu vestido, mas impedi.
– Por favor, Alice! Estou com tanta saudade. Preciso de você!
Ver o quanto ele me correspondia era tão maravilhoso, que mesmo insegura, cedi. Rapidamente ele estava sobre mim.
Apesar de ter tirado a bermuda, como eu estava de saia,  fiquei completamente vestida.
Não conseguia sentir muita coisa, exceto a culpa por saber que estava fazendo algo errado demais. Em minutos, André caia sobre mim e tudo que eu conseguia pensar era na vontade enorme que estava de ir ao banheiro.
Sentia tudo arder! Não foi nada agradável.  Tereza sempre procurava me dar informações para que eu não fosse tão alheia a tudo e sabia que ela não tinha gostado de sua primeira experiência.
Quando sai do banheiro, André estava na porta e me beijou com carinho.
– Amor! Por que não me disse?
Estava sem entender direito e fiquei em silêncio. – Teria sido mais cuidadoso!
Abraçou-me e me agarrei a ele, sorvendo aquele carinho.
- Vem, vamos antes que alguém dê falta de você.
Cheguei em casa sentindo-me péssima. Apesar de amar André estava arrependida por aquilo. Não foi bem como eu imaginava.
Papai e mamãe estavam arrumados e me aguardavam.
– Vá se trocar! Vamos sair. Meu pai foi enfático.
Tudo que eu queria era deitar e me afundar em auto piedade.
Entrei no quarto e um vestido novo estava sobre a cama. Um verde esmeralda tão vibrante que encantou-me.
O tecido em seda caiu perfeitamente em meu corpo magro e graças ao bom senso de quem quer que tenha comprado, não havia decote nas costas para livrar-me do constrangimento das pessoas saberem que aos dezoito anos eu ainda apanhava do meu pai.
Desci e papai me auditou. – Ficou perfeito como eu imaginava.
- Aonde vamos?
- Logo você vai saber!

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