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Any Gabrielly.

Acordei no dia seguinte um pouco mais cedo do que o normal. Tanto é que Josh ainda dormia em meu peito, e ele sempre acordava mais cedo que eu.

Acariciei seus cabelos loiros enquanto observava seus olhos marcados pelas enormes olheiras roxas. Eu sabia que ele não tinha dormido noite passada, e me senti culpada por isso.

Josh se preocupava comigo, e eu achava isso lindo. Mas não queria o envolver em uma coisa tão complexa assim. Ele queria descobrir o que eu estava sentindo. Mas nem eu sabia disso.

Dói a todo instante em lugares
diferentes onde eu nem imaginava que poderia doer. Não são dores no meu corpo, mas mesmo assim... dói.

Eu queria poder esquecer tudo o que aconteceu, mas tudo ao redor não deixava. Tinha a droga de uma cicatriz no meu braço que me fazia lembrar de cada detalhe. E eu nem conseguia se quer entrar na cozinha.

Queria poder dizer à Josh tudo o que eu achava que estava sentindo. Queria contar sobre toda a minha confusão. Mas as palavras estavam todas entaladas, e não saiam nem por escrito.

Eu fico em silêncio, mas minha alma grita. E eu queria gritar tudo isso com Joshua. Meu peito chora eu tento ter ânimo, mas sinto todo esse cansaço. É tudo tão estranho. Eu nunca senti algo assim.

Eu perdi minha confiança, minhas esperanças, meus sonhos, minha vontade, minha felicidade, tudo o que pode imaginar. Eu sinto que aquela Any de antes simplismente desapareceu.

E, agora por mais que tente me reerguer, eu não consigo. Porque eu nem sei mais quem eu sou. Eu nem sei direito o que eu estou sentindo. E isso dói demais.

No tempo que fiquei trancada no banheiro no dia anterior, peguei meu celular e pesquisei sobre traumas. Talvez seja isso. Talvez eu estivesse traumatizada ou algo do tipo.

Eu quase morri, e quase deixei Fred morrer. Isso era um bom motivo para ficar traumatizada... eu acho.

Eu só sei que estou morrendo de medo de entrar em uma cozinha. Porque, talvez, eu seja um ímã de coisas ruins. Sinto que se eu chegar perto de qualquer coisa, ela vai explodir a qualquer momento.

Os piores medos sempre estão abaixo de nós, escondidos, abalando as estruturas que queríamos que fossem fortes e seguras.

Me assustei com Josh beijando um dos meus seios por cima do tecido fino do pijama.

- Bom dia - Sussurrei, sorrindo.

- Bom dia - Voltou a fechar os olhos - Por que acordou cedo? Está tudo bem?

- Sim, eu só fui dormir muito cedo ontem - Suspirei - Já que você não fez nada para mudar isso.

- Minha irmãs ainda não foram embora - Ele riu - Não queira quebrar sua própria regra.

- Eu já disse que mudei de idéia. Não quero mais seguir essa regra boba - Fez um biquinho.

- Eles vão embora logo logo. E teremos a casa só para nós - Deslizou sua mão sobre minha coxa - Além disso, Krystian vai voltar para Los Angeles e...

- O quê?! - Interrompi - Krys vai embora?

- Sim. Não tem mais motivo para ele continuar aqui. Acabamos o projeto meses adiantado.

- Ah... que pena - Suspirei - Era legal morar com ele.

- Minha mãe disse para nós irmos passar o Natal e Ano Novo lá - Mudou de assunto - Pode ser?

- Claro. Uma semana é muito pouco. Mas eu sei que Úrsula e Ron não podem ficar mais tempo por causa do trabalho.

Depois disso, ficamos conversando sobre várias outras coisas por longos minutos. No meio de uma das nossas conversas, Josh levantou da cama e foi até o banheiro. Eu achei que ele iria voltar para cama, mas quando saiu do banheiro, já estava vestido com outra roupa mais social.

- Vai sair? - Perguntei ainda deitada.

- Vou. Não demoro muito.

- Aonde vai? - Fiquei confusa.

- Você vai saber depois - Me beijou - Nem precisa sair da cama, eu volto rápido.

- Está bem... - Franzi as sombrancelha, desconfiada - Cuidado com a estrada!

- Eu sei - Disse impaciente, pois essa frase já tinha virado meu bordão do dia a dia.

Quando Josh saiu do quarto, fiquei esperando ele por poucos minutos. Mas como eu tinha acordado muito cedo, acabei pegando no sono rápido de mais.

Fui acordada, não sei quanto tempo depois, pela mão do mesmo. Demorei um pouco para me sentar na cama e ficar de frente para Josh.

- Vai me contar aonde foi? - Abracei meus joelhos cobertos pelo edredom.

- Vou - Jogou um papel em minha direção - Leia.

- O que é isso? - Peguei o papel em minhas mãos e comecei a lê-lo.

- Seu novo psicólogo - Ele disse no mesmo instante que eu li a palavra "traumas" no panfleto.

- O quê?! - Larguei o panfleto - Eu não quero um psicólogo!

- Mas você precisa.

- Não. Eu não preciso de nada!

- Olhe só para si mesma, Any. Eu quero você de volta.

- Olha só, Josh... - Respirei fundo, para manter a calma - Tem coisa que não volta, por mais que a gente queira.

- Você pode, por favor, tentar? Não tem nada a perder com isso.

- Eu não preciso de um estranho se metendo nos meus problemas - Avisei - Tudo bem você não querer fazer parte disso, eu entendo. Mas eu posso cuidar de tudo isso sozinha, não preciso de mais ninguém.

- Não é como se eu estivesse desistindo de você, entenda isso - Aumentou a voz - Eu tentei e tento mais e mais a cada dia te entender. Mas você não se abre comigo, Gabrielly. Assim fica difícil.

- Ninguém mais pode sentir a minha dor. Ninguém pode se colocar no meu lugar, porque o meu lugar está cheio de cacos de vidros, e, toda vez que eu tento me mexer, os cacos me dilaceram um pouco - Senti uma lágrima escorrendo.

- Ele não é um estranho. É um cara treinado para isso.

- Eu sei disso, mas eu continuo não querendo!

- Eu já marquei a primeira consulta. Então não adianta mais reclamar - Deu de ombros.

- Como é que é?! - Minhas sobrancelhas quase foram parar no topo da minha testa - Como você faz um negócio desses sem ao menos me consultar? Eu vou começar a trabalhar em poucos dias! Não tenho tempo para isso!

- Pode gritar comigo o quanto quiser - Deu de ombros novamente - Mas eu estou fazendo isso para o seu bem. Irá me agradecer no futuro, acredite.

O amor, às vezes, pode ser rigoroso. Isso porque quem nos ama tende a tomar decisões difíceis para o nosso bem maior. E, muitas vezes, nós não conseguimos enxergar o nosso "bem maior" com os próprios olhos.

E era isso que Josh estava tentando fazer. Ele queria o meu bem, e eu mesma não estava deixando isso acontecer.

- Tudo bem - Suspirei - Eu vou tentar.

A Babá || Beauany {2° Temporada}Onde histórias criam vida. Descubra agora