Vermelho e Branco

Romance e Biblioteca

   Existem pessoas no mundo que são muito únicas, tão únicas que mais parecem personagens de histórias. Pessoas retiradas dos livros, personagens de histórias na vida real, se é que isso sequer faz sentido. Linda era uma dessas pessoas. Ela era, bem, ela era linda, como o seu próprio nome dizia e inteligente. Deuses, ela era completamente brilhante. Um génio criativo e dinâmico, que devorava bibliotecas inteiras e tinha uma fome incessante de conhecimento. Um ser divino e maravilhoso, uma fonte de sabedoria e beleza, que espalhava a sua própria luz pelo mundo. Única, realmente única, numa palavra.

   Eu fui uma das poucas meras mortais, ainda o sou, que teve a honra de a conhecer. Conhecê-la mesmo, todas as suas diversas facetas. Encontramo-nos pela primeira vez numa biblioteca, na biblioteca municipal, o melhor e pior sitio para o início de um romance. Eu estava à procura de livros, não se pode viver apenas à base de fanfics de Harry Potter, no caso principalmente de Drarry. Acreditem eu tentei durante o confinamento. Agora o confinamento já acabou, está na altura de voltar à literatura, foi quando a vi.

   Maravilhosa, com uns cabelos pretos afros lindos, pele escura e olhos pretos. Era muito alta e incrivelmente elegante. Vestida com cores vibrantes: uma camisa laranja fina, bastante transparente, calções de ganga branca e sandálias também brancas. Numa mesa a ler e, esperem, aquilo era um exemplar de “Carry On” da Rainbow Rowell?! "Carry On a História de Simon Snow"?! Eu adorava aquele livro! Como poderia eu resistir à vontade de falar com alguém com um gosto literário tão bom?!

   Olhei para mim própria. O ser pequeno, com cabelos castanhos claros, muito curtos, olhos esverdeados, óculos pretos acinzentados e pele clara. Eu usava, como se fosse predestinado pelo destino, se eu sequer acreditasse no destino, ou seja era por mera coincidência, uma t-shirt branca com a capa de "Carry On". Por baixo uns simples calções de ganga azul escura até aos joelhos e umas sapatilhas pretas. A minha roupa era nada mais nada menos que o meu "look" tradicional de verão, esta era melhor do que  a que customava usar no inverno, essa podia ser resumida numa única cor: azul escuro. Por outro lado a minha beleza também não se equiparava a dela, que eu acabava de reparar, tinha uma prótese metálica em vez da parte inferior da perna direita. Eu podia não ser espetacularmente linda (eu sempre achei que era bonita) mas esperava que a minha mente afiada de devoradora compulsiva de livros, fanfics e bibliotecas a pudesse impressionar.

   -Olá, desculpa estar a interromper, sei que estás a ler e eu pessoalmente odeio quando me interrompem enquanto estou a ler, mas isso é Carry On? Eu adoro esse livro...

   -Acho que se nota!

   -Sim, a t-shirt denunciou-me, não foi?

   -É, foi... Queres sentar-te? Eu sei que não é recomendado por causa da Covid-19, mas as mesas até são grandes, estamos de máscara e se eu não começar a falar com pessoas cara a cara vou enlouquecer!

   Ela riu-se, deu uma risadinha. O riso dela era completamente encantador. O seu sorriso era daqueles que iluminam todo o rosto. O tipo de sorriso que se vê, mesmo com uma máscara a tapar a boca.

   -Sim, adoraria! Sou a Sara, já agora.

   -Prazer, Sara! Eu sou a Linda.

   -Combina contigo...

   -O que?

   -O teu nome. Combina contigo, és realmente linda...

   -Obrigada! Estou a ver que és uma pessoa desconstruída.

   -Porquê?

   -Não há muita gente que ache uma rapariga negra com deficiência linda.

   -Bem, as pessoas são parvas, então.