Oii, desculpa a demora
Faltava alguma coisa. Calça camuflada, blusa preta e uma bota de salto. Eu costumava olhar para essas roupas nas prateleiras das lojas de departamento e ficar encarando-as, gostava delas, mas havia ouvido que eram demais para mim. No final das contas, eu havia gostado, mas faltava alguma coisa. Infelizmente o espelho não iria me dar a resposta.
-Não falta nada, Camila-nem a Normani.
-Eu sei lá-murmurei- Acho que é porque não estou acostumada a me vestir assim.
-Devia tentar mais vezes, dá um ar ousado.
Ousado. Essa era a ideia.
Normani caminhou até a janela e abriu discretamente as cortinas. Vi pela luz fraca do fim de tarde ela acenar para alguém lá fora.
-Ele acenou de volta?-questionei, terminando de trançar o lado esquerdo do cabelo.
A garota balançou a cabeça em negação.
-Só me lançou um olhar irritado-ela se virou para me encarar-E estou começando a entendê-lo.
-Você passou mais tempo se arrumando do que eu-falei na defensiva.
-Eu não fiquei meia hora tentando descobrir o que faltava na minha roupa.
Dei um último nó com o elástico de cabelo e estendi as mãos em redenção.
-Pronto-eu disse, virando-me e indo para fora do quarto.
Normani me seguiu, ouvi ela bater a porta atrás de mim. Minha casa estava vazia, atravessamos as escadas até a porta da frente. Ao abri-lo dávamos de cara com um Jardim repleto de arbustos bem podados e árvores que formavam sombras acolhedoras. Era como um Jardim de verão em um filme clichê adolescente. Mais à frente, parado ao lado do portão estava um carro prateado, com um garoto de cabelos escuros e rebeldes tilintando os dedos contra o volante.
-Ei!-gritei para Shaw, enquanto íamos em direção ao carro. Ele nos encarou e deu um suspiro.
-Finalmente!-exclamou.
-Estávamos testando sua fé-disse Normani.
-Só estar aqui já é um grande sinal de fé-retrucou Shaw
Eu ri.
-Só admite logo que você quer ir.
-Eu quero-ele disse-Para evitar que vocês se metam em algum problema. Inclusive, que roupa é essa?
Dei de ombros.
-Estou tentando coisas diferentes.
Ele juntou as sobrancelhas. Dava para ver a pergunta pairando no ar: o que você está armando?
-Vamos-pressionou Normani.
Shaw girou a chave na ignição e deu partida. Observei-me através do vidro escuro do carro, ainda faltava alguma coisa.
As pessoas estavam amontoadas de pé, havíamos chegado bem em cima da hora. Luzes piscantes pareciam acompanhar o ritmo da música gravada que saía dos alto falantes presos ao teto. Os instrumentos estavam dispostos no palco, a bateria de Louis no centro, o baixo marrom claro de Harry à esquerda e a guitarra vermelha de Lauren à direita, a cor era irregular como se tintas tivessem sido jogas ao acaso. Ao fundo, um telão projetava um pôster da banda.
Senti um toque suave no ombro.
-Tem mais gente do que eu esperava-comentou Shaw.
Tirei os olhos do palco.
-Acho que eu estava imaginando algo assim.
-É-concordou Dinah, tínhamos encontrado ela em meio a multidão-Tem muito a cara da Lauren.
E tinha mesmo. Do chão ao teto, tudo emitia um ar rebelde, como uma música de rock: era um mundo muito muito grande mas pensávamos que éramos maiores. Ao mesmo tempo, era aconchegante, as notas das músicas giravam em torno de nós e criavam uma proteção. Feroz e acolher, boas palavras para definir aquele lugar e também boas palavras para definir Lauren.
Lauren, lá estava ela, de calça jeans rasgada, blusa folgado, casaco preto e toca sobre os cabelos. A garota subiu ao palco e pegou sua guitarra vermelha em mãos. Segurou o microfone e encarou profundamente o público. Em situações assim é normal que se ouça um pronunciamento, um discurso longo de agradecimento, mas aquela era a Lauren e eu não esperava que algo habitual. E não foi, ela simplesmente sorriu e disse:
-Aproveitem o show.
Depois pudemos ouvir a contagem de Louis, seguida da música. Junto a ela, algo no fundo me chamou atenção. A imagem do telão havia mudado e agora transmita um vídeo. Um vídeo clipe caseiro. No primeiro take Lauren aparecia apertando aos mãos dos garotos: fechando um acordo, o início da banda. Em seguida, a imagem mudava para cenas deles na garagem, ensaiando. Os três riam e se provocavam, enquanto tentavam acertar o ritmo, estavam tentando se tornar um time. O ato seguinte, mostrava Lauren pendurando um cartaz da banda em frente ao salão onde estávamos, o dono da boate ao seu lado, outro aperto de mão, contrato selado.
Senti uma pontada forte na cabeça. Fechei os olhos e quando voltei a abri-los tudo ao meu redor tinha se tornado uma grande mancha colorida, exceto pelo telão. Mais apertos de mãos, a imagem pareceu flutuar para fora da tela e se aproximar, um filme em 3d. Cada vez mais perto, agora eu só podia ver flashes: Lauren apertado a mão de Harry, Lauren apertando a mão do dono do clube. Outras duas mãos, uma luminosa e a outra ardente em chamas que não a queimavam. Voltei a fechar os olhos e segurei o braço de Shaw, minha cabeça parecia pesar 2kg a mais.
-Camila?-ele sussurrou-o que foi?
Não respondi, apenas curvei o pescoço para frente e tentei abrir os olhos de novo. As coisas estavam entrando em foco. Quando levantei a cabeça, não olhei direto para Shaw, olhei para o palco. A música acabara há instantes, as pessoas estavam aplaudindo, mas Lauren estavam me observando, com os olhos estreitos e as sobrancelhas unidas.
Shaw puxou meu braço com leveza.
-Vamos-sussurrou.
Deixei ele me conduzir para fora do salão, ao lado da porta havia um banco de madeira onde nos sentamos. Estava frio e o vento se chocava contra as folhas das árvores com intensidade.
-O que aconteceu?-perguntou ele.
-Não sei-murmurei-tudo ficou embasado.
-Está com dor?.
Assenti.
-de cabeça.
As duas últimas mãos ainda estavam vivas em minha memória. Não eram parte do clipe, apenas apareceram para mim. Por que?
-Ei!-o grito veio da porta da boate. Lauren caminhava até nós, seguida por Dinah e Normani.
-Você está bem?-questionou
-Estou-respondi-Só com um pouco de dor e frio.
O vento estava cada vez mais forte.
-Sua pressão caiu?-indagou Dinah
-deve ter sido-concordei.
Estendi as mãos a Shaw para que ele me ajudasse a levantar.
-Onde vocês deixaram o carro?-perguntou Lauren
-Estacionamento, no final da rua-respondeu o garoto.
-É uma caminhada meio longa-observou a herdeira e então estendeu seu casaco para mim-Veste isso, vai ajudar com o frio.
Agradeci e peguei o casaco. Eu, Dinah, Normani e Shaw andamos pela calçada até chegarmos ao carro. A primeira coisa que fiz ao entrar foi observar meu reflexo no vidro escuro. Duas tranças no cabelo, blusa preta e agora um casaco de couro, não faltava mais nada.
Foi isso :)
VOCÊ ESTÁ LENDO
O céu no inferno
FanficEm uma escola onde o céu e o inferno se chocam, uma paixão cria um vínculo entre as próximas grandes herdeiras. Mas até que ponto esse amor é seguro?