Música sugerida: Rise Up - Andra Day.
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Istambul, Turquia – Futuro.
Você se remexe levemente, enquanto seus olhos amendoados vão se abrindo devagar, ajustando-se aos poucos a escuridão que envolve o enorme quarto. Uma brisa fresca atravessa a cortina de tule – provocando um barulhinho suave capaz de fazer cócegas nos ouvidos mais sensíveis – e o acessório parece resmungar alegremente a cada golpe do fenômeno natural.
Shhh shhh
Shhh Shhh
Ainda de olhos semicerrados, seus lábios se abrem em um sorriso preguiçoso. E dedilhando o espaço ao seu lado, com toques lentos e suaves, sua mão busca pelo corpo grande e quente do marido, mas encontra o lugar vazio. Sua ausência, entretanto, não te surpreende, afinal, ele nunca foi um homem dado a cochilos vespertinos – diferente de você que, após o turbilhão advindo da maternidade, já não se importa nem um pouco em se entregar ás sestas.
(Talvez essa seja uma característica herdada de sua mãe, porque você se lembra nitidamente dos cochilos que tiravam juntas durante as tardes dominicais dos escaldantes verões turcos, após "almoçarem" dondurma de pistache e devorarem uma quantidade apavorante de lokum como sobremesa. Um costume extremamente incomum entre as famílias de meninas da vizinhança, mas que fazia todo o sentido para a pequena Eda)
Você abre os olhos, suspirando satisfatoriamente, e tudo o que ouve ao seu redor é o som de grilos cantando ao longe. Isso sim, algo absolutamente inusual. Porque seus filhos, como toda criança, são barulhentos e gostam de se fazer notar. Desde a gravidez, os pequenos já promoviam verdadeiras travessuras dentro do mar amniótico em que eram gestados e protegidos – como Castor e Pólux, os deuses gregos gêmeos, protetores dos navegantes, a dupla parecia gostar daquela água poderosa que os embalava durante as infindáveis semanas em que também se formavam.
Mas isso é assunto para outra história...
Você afasta os lençóis e se levanta. O corpo, como se tivesse vida própria, se estica e se contrai em uma mesura delicada e graciosa – e é quando todos os músculos e ossos parecem voltar ao lugar do qual saíram depois de algumas boas horas de sono em três dias. Dormir longe da família ainda lhe é um desafio especial, mesmo que isso signifique que o seu sonho de ser reconhecida como uma paisagista de renome mundial tenha se tornado realidade e que as viagens a trabalho por toda a Europa e Ásia seja algo relativamente corriqueiro em sua rotina profissional.
Ainda assim, nada parece tão reconfortante quanto voltar para casa e para os braços de seu marido.
Porque o abraço de Serkan Bolat continua sendo seu lugar favorito no mundo, Eda Yildiz.
(É difícil não ser, aliás, se no momento em que vocês se abraçaram pela primeira vez foi como se sua alma estivesse em casa – não no lar de sua tia em Istambul, mas empoleirada no terraço da residência de sua infância em Mardin, assistindo estrelas cadentes explodirem no céu, enquanto a lenda de Fílis e Demofonte era contada e recontada por seu pai, com a mesma habilidade e paixão de um contador de histórias profissional. A sensação de pertencimento que te dominou estava acima de qualquer contrato ou relação afetiva falsa. E foi ali, entre os braços dele, que você ouviu o destino rir de todos os planos feitos pela mulher que você já não era mais)
E enquanto suas longas pernas cruzam o corredor de uma ponta à outra até as escadas, os cômodos de sua casa parecem sorrir para você, como se também estivessem ansiosos pelo seu retorno. As paredes, em tons suaves, são atravessadas pela luz da lua que invade as enormes janelas que as circundam e morrem no chão de madeira envernizada, iluminando seus pés e te lembrando de todos os motivos pelos quais você ama esse lugar.
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Romance'Cause they say home is where your heart is set in stone Is where you go when you're alone Is where you go to rest your bones (...) As long as we're together, does it matter where go? Home, home. (Home - Gabrielle Aplin)