"Não pode deixar falarem assim com você". A campainha está tocando novamente. A Sra. Betta sai ás pressas da cozinha, com certeza estava esperando alguém. Os saltos faziam barulho enquanto ela tentava correr sem tombar no meio da sala. Olhou a janela e afastou as cortinas, viu várias senhoras muito bem vestidas do lado de fora. Todas com um coque alto na cabeça e tiaras brilhantes. Elas pareciam impacientes.
"Filhas da puta"
- Boa Tarde meninas! - Betta falou abrindo um sorriso para a meia dúzia de mulheres que não pareciam muito felizes - Entrem, entrem... E que caras são essas?
A Sra. Liz foi se adiantando:
- Betta, as vendas caíram à uma porcentagem consideravelmente grande! Perdemos muita clientela depois da implantação daquela miserável "base protetora".
- Tem certeza do que está falando? - Betta fechava a porta atônita. Estavam no auge das vendas e não poderiam simplesmente parar.
- É claro que tenho, mas se não acredita veja com os próprios olhos os lucros de toda uma semana!
As mulheres já estavam sentadas na mesa redonda do escritório de Betta. A máquina para contar dinheiro começou a trabalhar. O barulho das notas sendo contadas era como música para aquelas mulheres. Betta se manteve apreensiva depois de ter recebido a má notícia.
- Esse é o último bolo - Liz falou enquanto colocava a bolada de dinheiro na máquina.
Passados menos de 3 minutos o total estava a frente de todas. Betta não esperava um número tão baixo.
- Não falei? Os números estão abaixo do limite! Não chegaram nem em 20.000 reais!
- Com certeza foi culpa da tropa mandada pra essa região - Regina não hesitou - Várias vezes em que fui ao mercado vi clientes sendo enquadrados. Depois disso fui informada, por eles mesmos, que não queriam mais contato com a nossa mercadoria. "Deu ruim". Teve até alguns que disseram que estavam indo pra uma casa de recuperação! Aquela que foi construída alguns anos atrás pelo prefeito, aquele infeliz cabeça oca. Bom, sendo essa a questão principal ainda temos que lidar com as dívidas de longo prazo de alguns safados por aí.
- Mais cedo recebi a visita do Carlos, ele me pagou metade do que devia e aceitou os juros. - Betta tentava amenizar a tensão.
Após falar a Sra. Betta se concentrou no que ouviu e propôs bolarem uma estratégia para as vendas. "Morte?". O problema não era a entrega do produto e sim a disponibilidade dela entre os moradores dali. Muitos tinham acesso às "Damas de Vermelho" e era provável que a maioria dos grupos de rua possuíam sequer uma pedra. A probabilidade era de 2 em 5. Geralmente se reuniam em grupos de 5 a 7 pessoas pra poderem fumar, beber e falar sobre bobagens enquanto estão chapados.
- O mapa está aqui - Betta abriu o grande cartaz e o pôs sobre a mesa. Era o Mapa que continha toda a região sul do ponto das vendas. Era uma expansão. O ponto central era no norte, onde Betta tinha embaixadores que ela escolheu a dedo. - Pelo que eu ouvi de algumas de vocês o problema não está na nossa abordagem nas entregas e sim no mantimento delas pelo povo. Não deveria estar nos afetando, já que todos os compradores são confiá...
- Nem todos Bet - Christina falava olhando pro nada, parecia estar numa viagem astral - Ouvi o Douglas dizer que daqui a pouco dava com a língua entre os dentes, já não aguentava mais tanta dívida com a polícia e não queria se ferrar sozinho.
- Maldito... Bom, as vendas estão fechadas pra ele.
- Não sei como isso vai nos ajudar, só teremos uma grande dívida na lista. Está difícil conseguir a droga - Liz não se conteve.
"Quem essa velha pensa que é? A tesoura está na gaveta de baixo Bet, muito próxima a você... Mostre sua superioridade." Não!
- O que está insinuando Liz? Que não sou capaz de cobrar a um cliente? Ele vai pagar, não importa como nem de onde vai tirar a grana mas vai pagar. - Bet começou a esfregar os finos dedos da mão, parecia estar tramando algo. Em seu rosto se formaram marcas enquanto ela forçava os músculos a se mexerem. As sobrancelhas subiam e desciam, parecia estar triste. O silêncio foi total. As senhoras fixaram seus olhos no rosto de Betta que mais parecia um palhaço sem maquiagem.
"Você não age mais como eu quero. A rebeldia te tomou também."
Ainda esfregando os dedos pôs a mão esquerda na barriga e coçou com força. O barulho das unhas em atrito com o tecido grosso foi aumentando de acordo com a força que ela colocava. Uma das unhas quebrou de tanto forçar, voou pra cima da mesa e Christina soltou um suspiro de surpresa. Em sua cabeça Liz se perguntava se Bet estava chapada. Bet riu como se tivesse lido seus pensamentos. Sua garganta fez movimentos de subida e descida emitindo um som como se estivesse bebendo algo.
- Sede. - Ela sussurrou e deu as costas pra todas ali presentes. Caminhou lentamente em direção a porta. No andar exprimia barulhos com o salto alto. O lustre no teto começou a balançar e nas janelas se escutou o barulho do vento que entrava e deixou algumas com calafrios. As cortinas balançavam. O lustre dançava. Bet ao se aproximar da porta se abaixou e começou a cuspir. Fez a simulação de um vômito e tossiu forçadamente. Colocou um dos dedos na garganta e quase vomitou dessa vez.
- Oque está acontecendo Bet? - Falou Gizele de pé. - Você está me assustando. Precisa de ajuda?
- Então a magrela quer ajudar - Bet riu - Pode começar vendendo a merda daquela planta pro seu marido. - Foi se levantando lentamente com os dedos contorcidos. Parecia atormentada. Do teto ouviam-se barulhos pesados - Ainda tenho sede...
Betta de pé se manteve em silêncio por um bom tempo. Ninguém se atreveu a falar uma palavra. Ela cantarolava uma música, foi o único som presente ali. Com certeza era mais um de seus surtos. Estavam se tornando frequentes agora que tinha perdido o segundo marido. O abuso das drogas também aumentou, muitas vezes parece estar equilibrada mas a verdade é que está totalmente desestabilizada. Imprevisível.
A Sra. Betta levantou um dos dedos e devagar o deixou cair sobre o interfone:
- JENNIFER SUA VADIA IMUNDA QUEREMOS CAFÉ COM CONHAQUE AGORA OU FICARÁ SEM EMPREGO! - Betta ria com o dedo sobre o interfone. O grito desavisado assustou a todas atrás de si, ela percebeu e agora tinha mais um motivo para rir além da esnobagem á empregada.
Billie sabia que a mãe receberia visitas. Foi mais um motivo pra se trancar em seu quarto. Depois da discussão que teve com sua mãe ele quis esfriar a cabeça e ligou o som sem limitações pro volume. Sempre que ligava ou estava zangado ou só queria esquecer que tinha uma vida lá fora. Além de cantar e pular dentro do quarto plugava sua guitarra e não perdoava. A vibração pela casa não incomodava Bet que "deixava o menino se divertir". O quarto do menino é em cima do escritório da mãe, escritório onde ela se reúne pra discutir sobre a venda de drogas e ficar fora de si com o uso de entorpecentes.
Bil tinha acabado de descobrir sobre as vendas da mãe e a briga foi feia. Apesar de parecer um garoto rebelde ele era muito ligado à ordens e cumprimento das leis. Era considerado um burocráta. Mas para ele aquilo é só uma denominação vulgar de como todos deveriam ser já que sempre estão abaixo de um poder ou força maior, a não ser que você seja esse poder ou força. Em qualquer ponto de vista ou discussão levava em conta seus valores construídos sozinhos em seu descobrimento como civil. Seu papel na sociedade. Era fanático por operações policiais secretas e vez ou outra tinha contato com símbolos, leis, códigos e de tudo um pouco relacionado a área. Bil, mantinha forte vínculo com seu padrasto.
Arnold era o melhor amigo que Billie poderia ter. Sempre escutava o que o garoto tinha a dizer e nunca se contrapôs à suas visões de mundo. Eles dois já fizeram longos debates sobre como deveria ser a utilização de um cargo elevado na política. Madrugadas inteiras a base de energéticos e argumentos bem colocados sobre o tema. Billie queria ser juiz e o padrasto dava todo apoio possível, afinal o menino tinha uma mente brilhante.
O pai legítimo de Billie havia morrido atropelado após fugir de uma casa noturna em meio a um tiroteio. Foi encontrado pela manhã totalmente despido e com marcas de batom pelo peito, abdômen, barriga e virilha. Estava tendo uma noite e tanto disseram seus amigos. Nem Betta nem Billie se comoveram o suficiente pra sentir a falta do homem em suas vidas. Era um pai ausente e enquanto estava traindo a mulher, Bet conhecia Arnold.
Numa noite qualquer a notícia mais obscura que Bil recebeu em toda sua vida foi sobre a morte de Arnold. Era um mistério, porque mataram seu pai? A noite inteira ele ficou parado em frente a janela olhando pra rua, tendo sido essa a posição que ele estava quando recebeu a notícia. Esperava pelo pai incansavelmente, esperava vê-lo e soltar trocadilhos que só os dois entendiam.
- Que ao menos tivesse sido a mulher que me trouxe a esse mundo imundo - Billie sussurrou para os galhos das árvores que batiam na janela enquanto lágrimas saiam de seus olhos. Mas ele nem imaginava que se tivesse sido a mãe sofreria tão grande dor quanto.
Bett após dar a notícia abraçou o filho mas não ouviu oque foi dito. Sua cabeça estava uma bagunça. "Não é sua culpa. Às coisas só não saíram como planejado... Pra eles". A mulher estava totalmente pálida e o telefone estava fora do gancho balançando pra lá e pra cá chamando a atenção do gato que se colocou a brincar indignado por ouvir uma voz feminina dizer:
- Senhora? Você ainda está aí? Por favor, responda...
A Sra. Betta sabia de quem era a culpa daquela morte. A causa dela foi dada como assassinato. Não se sabe porque mataram Arnold, ele não mantinha vínculos com nenhum vizinho, era "ficha limpa" e não tinha apresentado comportamento estranho nos últimos dias de vida. Ia ao trabalho e vinha pra casa, cumprimentava a esposa e passava horas com o filho a quem amava. Talvez tivesse sido confundido.
Billie estava tocando alto e decidido a alcançar as notas mais difíceis que vinha treinando por semanas. Virado pra janela não viu a mãe entrar no quarto e desligar o som. Só o solo da guitarra permaneceu e ele não parou.
"Mostre a ele a moral que lhe foi dada por tê-lo carregado nove miseráveis meses na barriga."
- Billie, Estou aqui. - Ela cruzou os braços esperando o garoto olhar em seu rosto. Mas ele continuou tocando. - Billie, precisamos conversar agora! - Betta não era a melhor no quesito paciência mas como tinha acabado de sair de uma crise tentava se manter calma. Acendeu o cigarro e respirou fundo. - OK então.
Betta desplugou a guitarra do som e fixou os olhos no filho.
- Por que você fez isso? Eu estava quase conseguindo! Não tem o direito de colocar as mãos no que não é seu! - Billie gritou e pegou das mãos da mãe o fio que conectava a guitarra ao som.
- Olhe aqui, quem não tem o direito de falar assim comigo é você! E chega dessa barulheira Billie! Não é assim que se resolve os problemas! - A mãe também gritava. Terminando devolveu o cigarro a boca e deu uma sugada profunda sentindo a fumaça percorrer sua garganta.
- A única que tem problemas aqui é você! Não consegue ficar um dia longe desse maldito cigarro e ainda chama aquelas velhas pra encherem o rabo de fumaça também! - Ele agora virava pra mãe - E pra piorar vende essa merda de veneno! Porque não fica satisfeita em destruir sua própria vida? Tem que destruir a dos outros também?!
Betta lançou-lhe no rosto sua mão. A força o fez virar o rosto e cinco marcas vermelhas surgiram em sua buchecha que ardia.
- Eu não permito que fale assim comigo! Essa casa é minha! E eu sou sua mãe, não pode sair por aí dizendo oque vem a essa sua cabeça oca! - Bett endireitava a blusa torta. Não aguentava ser desacatada por ninguém, e a aqueles que ela tinha poder sobre, lidava do jeito que achava melhor.
- Sua... Sua... Eu te odeio!
Mais um tapa. Lágrimas escorreram do rosto do menino que buscava forças pra se manter em silêncio.
- Não é fácil pra mim está ouvindo? Eu perdi dois maridos! Perdi duas pessoas que eu dividi minha vida por vários momentos! Você é tão mesquinho e egoísta que não se importa com sua própria mãe!
"Agora já é tarde, você mostrou onde estão suas feridas. Não pode mais vencer."
- Se se importasse de verdade pararia de vender essas merdas aí - Bil se endireitou e enxugou as lágrimas com o punho fechado. Sua voz era fraca e trêmula. - Não é assim que se realiza sonhos, você tem que andar perante a lei.
"É o fim pra você, Betta."
- Ora seu pirralho fanático. Esse é o único jeito de não morrermos de fome! Seu pai nos sustentava, e agora está morto. Não pode mais colocar um prato de comida na droga daquela mesa. - Bet não mediu bem as palavras que atingiram em cheio o peito do garoto amargurado.
- Não me venha com essa mãe! Antes mesmo do papai morrer você já estava nesse esquema miserável de compra e revenda de drogas! Aposto que ele descobriu esse seu joguinho sujo! E como foi? Oque você fez? Com certeza colocou ele no meio, é isso que você faz pra despistar a verdade. Você mente. Persuadiu meu pai pra lhe ajudar, se vitimizou! - O garoto voltou a gritar, não conseguia colocar os pensamentos em ordem - Meu pai não era a favor disso, nunca seria! Não posso acreditar que se rebaixaria tanto... Ele não é como você!
"Não deixe transp..."
"Cala a boca e sai da merda da minha cabeça!"
- E porque você acha que ele morreu? - Bet olhava fixa nos olhos do menino. Billie estava desnorteado, que informação era aquela? - Seu querido pai - Bet riu e levou a mão direita a boca, roia as unhas ansiosamente - seu herói. O homem "puro" que você tanto venera morreu entregando uma das minhas merdas! - Billie caiu na cama. Estava pálido.
- Não... Não é verda... - engoliu em seco.
- Ingênuo. - Bet foi chegando perto do garoto. Deitou a seu lado na cama e acariciou seus cabelos. Começou a falar em um de seus ouvidos.
- Era a verdade que você queria? A qual eu ando despistando? Pois bem, insisti pro Arnold fazer a entrega. Estava desconfiando de uma emboscada já que os compradores queriam a presença da chefe - a Sra. Betta riu baixo, uma risada rouca. Seus olhos estavam vazios e a culpa desapareu de sua cabeça, Arnold que foi o tolo. Por mais que o amasse, a verdade tinha que ser dita. - e meu bem a chefe não faz entregas, ela só diz como tudo vai ser os inimigos que se cuidem. Pense comigo, eu devia a eles... Porque será que achavam que eu apareceria para uma entrega? Não acho que não receberiam outra coisa além de dinheiro. E depois me matariam. Eu não poderia te deixar aqui sozinho meu bem... Pensei em nóis dois - Betta se jogou pro lado e riu repetindo essas palavras: "Foi por nois dois!" "Por nois dois!"
Billie levantou num momento de fúria. Com o braço da guitarra nas mãos atirou o instrumento no chão soltando um grito de dor e ódio. Queria que nada daquilo fosse verdade, já era difícil demais aceitar a morte do Arnold e as vendas de drogas e ainda descobrir que a mãe simplesmente sacrificou a vida dele, era demais.
- Meu bem - ela ria - ele era um usurpador - parecia bêbada - você não vai julgá-lo? Tentou se passar por mim.
- Você é uma assassina! Eu não acredito nisso! Você está possuída por algo! É incrível ver como se sente depois de ter acabado com a vida do meu pai! - Essa última frase foi dita em alto e bom som - Assassina! Assassina! - Billie queria soca-la - Eu te odeio! - Ele gritava enquanto a mãe parecia se divertir com as palavras. Com o dedo indicador ela maestrava os ares. Toda situação havia destruído o raciocínio e saúde mental da mulher. Passou dias, semanas se culpando pela morte do marido e agora era praticamente uma louca abusiva.
Alguns segundos após os gritos Bil fechou os olhos com força e pôs as mãos na cabeça. A respiração estava forte e o coração batia descompassadamente. Queria matar a mãe. Os risos e palavras inaudíveis que ela exprimia o deixava mais irritado. Procurou continuar racional. Respirou fundo e pensou na melhor atitude para aquele momento. Estava com raiva, é claro, mas não queria abandonar tudo oque havia aprendido sobre valores humanos. Talvez fosse considerado tão louco quanto a mãe, obsessivo por esses assuntos. Acreditava mesmo que alguém monitorava todas as suas ações e não podia se deixar vencer pela emoção.
- Eu vou á polícia - abriu os olhos e a visão estava embaçada - Você é uma assassina e contrabandista de dogras, além de abusar delas. Precisa de ajuda.
"Eu te avisei. Ele agora é uma ameaça maior do que pensávamos. Mas já era previsível tal ação."
Betta levanta com uma expressão de surpresa. E solta uma risada.
- Como? Você vai me denunciar? Não faça isso com sua mãe... Filho...
- Não me chama de filho! Eu vou fazer de tudo pra que passe o resto de sua vida no chão frio de uma prisão!
- Querido... Calma, precisamos ser racionais agora - Bet se assustou com a proposta dada e em meio a crise que estava não ia deixar isso passar. - Venha comigo - Se aproximou lentamente do garoto e com um rápido movimento lançou-lhe um soco no rosto deixando-o imóvel no chão. - Agora vamos...
"Eu sempre venço"
A Sra. Betta estava fora de si. Carregava o filhos nos ombros, estava prestes a jogá-lo no porão. Tudo aquilo era demais para ela, sem o marido não tinham renda suficiente para se manter e manter a casa. Precisou aumentar suas vendas e daí conheceu Arnold. Não esperava tamanha proximidade com o filho e também não esperava revelar seus segredos mais ocultos. Ia contra a lei. A lei que era repetida por aquele garotinho cheio de remorso. Muita carga pra ombros tão pequenos e frágeis carregar. Mas o garoto tinha um espírito forte, se igualava ao da mãe em vários quesitos. Não podia colocar seu trabalho a perder numa luta de igual pra igual como aquela.
Estava tranquila por não haver testemunhas. Jennifer tinha sido mandada embora. Amanhã outra empregada já viria em seu lugar. Abriu a porta do porão e ficou olhando as escadas sumirem na escuridão.
- Vou mostrar-lhe que não pode se colocar de pé na mesma arena que eu. - não poupou nem seu próprio filho, fruto de seu relacionamento. Saído de seu ventre. Estava totalmente louca. Via o menino como uma ameaça, e ele realmente o era, mas não cedeu. Era autoritária e competitiva, nada se colocaria em seu caminho.
Ponderando na entrada do porão foi desperta pela maldita campainha. Tocou uma, duas, três vezes. Ainda com o jovem nos ombros olhou pela janela e viu dois homens fardados. Era a polícia! O medo se instalou em Bet que correu de volta pra entrada do porão. Não se atreveria a descer e amarrar o filho numa cadeira e simplesmente o jogou escada abaixo. Billie tinha um pouco dos sentidos retomados e na queda soltou pequenos e fracos, quase in audíveis, gritos mas continuou desmaiado. Fechado o porão Bet arrumou sua roupa e correu pra abrir a porta.
- Boa tarde, senhores. Em que posso servi-los? - Sempre sorridente. Não deixou transparecer a guerra que ocorria em sua cabeça.
- Boa tarde senhora. Somos da "base protetora" e estamos fazendo apenas uma ronda de costume. Muitos moradores andam comprando, revendendo e até usando drogas pela região. Drogas caras e de difícil acesso em outros lugares. - O policial forte e moreno se explicou.
- Desde quando essa ronda é costume? Pelo que me lembro é a primeira vez que os vejo.
- Bom, de agora em diante vai ser assim. Os números estão oscilando e recebemos denúncias de elevadas vendas por aqui.
Sem mais delongas Bet fingiu desentendimento e os convidou para entrar. Os policiais procuravam por possíveis plantações internas e laboratórios independentes. Se esperava de tudo daquele povo, até mesmo das senhoras. Passaram pela sala e adentraram a casa. Betta os encaminhou pro escritório, varanda, quintal, quarto, banheiro e todos os cômodos visíveis para os visitantes. O sótão era coberto por grandes lonas que se camuflavam no telhado da varanda e se estendiam pelo resto da casa, impossíveis de serem descobertas por qualquer um.
Passados alguns minutos nada de estranho encontraram e quando iam embora notaram uma estranha manifestação. As luzes da sala piscavam rapidamente, pareciam que iam queimar.
- Oque está acontecendo? - Perguntou um dos policiais.
Betta se fazia a mesma pergunta em sua cabeça.
- Ah nossa, parece que vou ter que chamar um eletricista. Bem, essas luzes são velhas mesmo. A fiação nem se fale. Mas depois vou dar uma olhada nos controles e caixa de força.
- Consegue fazer isso sozinha? Onde fica a caixa de força?
Era no porão. Bet gelou.
Nesse momento as luzes começaram a piscar novamente mas agora seguiam uma ordem, talvez fosse programado. Betta estava ficando enjoada e adiantou-se:
- Ah, não precisa se preocupar comigo estarei bem! Não preciso de ajuda. Meu marido trabalhava com isso e sempre acompanhei, consigo desenrolar. - Com um sorriso no rosto despediu os policiais e foi informada que na outra semana haveria uma nova ronda. Concordou aflita.
Bet estava assustada com a situação. Tudo poderia ir por água a baixo com essa merda de "ronda de costume"!. Correu até a porta do porão e sem abrir falou:
- Ouviu isso? Vão fazer ronda toda semana e não posso deixar que tenha contato com eles! Por isso como castigo vai ficar aí e pensar no que fez seu vermezinho! - Ela riu e logo após batidas fortes foram dadas na porta do porão. Gemidos também foram ouvidos. - Nem pense que sairá tão rápido, não caio mais nesse seu jogo. E não volte a mexer na caixa de força! Quase me fez perder tudo. - Mais batidas e Bet impaciente deu um chute na porta e gritando o mandou permanecer calado se quisesse continuar vivo.
- E eu sei que tentou mandar um sinal pros policiais, mas te garanto que é melhor ficar quieto e não mexer em mais nada! Não vai ser legal me ver aí dentro. - Um gemido foi entoado de dentro do porão parecia rastejar pelas escadas, mas isso não afetou Bet que não considerava a ideia de ceder pro moleque. "Você não é louca Bet, está sendo uma verdadeira mãe. Teve mesmo que o colocar no lugar de filho, já que ele não entende isso quando ouve que saiu de seu ventre, castigos são necessários. Não se preocupe você não perderá o controle das coisas, é tudo uma questão de tempo."
Betta quis matar o filho com as próprias mãos, não teve coragem o suficiente e passou a se embriagar. Ele teria de morrer de fome. Não dava tregua, estava amargurada. Na porta que levava ao porão sons de socos e chutes eram ouvidos acompanhados de gemidos de dor. A voz em sua cabeça não permitia que ela visse seu filho. Mostrava lhe o orgulho que ela mesma construiu em condições pequenas e bobas. Em pequenos detalhes alimentou esse mal e agora não tinha controle sobre ele. Cancelou a reunião de início de semana com as "Damas de Vermelho". Mandou continuarem a venda com cuidado e mesmo que descobrissem, foda-se, ela já estava rica mesmo. Tinha uma poupança pra emergências e isso lhe bastava.
Só tinha um detalhe o qual esqueceu, era dia da ronda policial pela região. Bet riu da situação. Estava deitada no sofá com as roupas lambuzadas de álcool. A cabeça estava explodindo. A casa estava silenciosa. Dispensou a segunda empregada, não queria desconhecidos rondando por ali. Do filho só lembrava quando via as luzes piscarem na mesma ordem da semana passada. E aí dizia com uma garrafa pra cima:
- Saúde meu pequeno! Só não deixe ninguém perceber onde está escondido. Isso traria problemas à mamãe.
A campainha tocou e Bet estremeceu. Seriam eles? Não acreditava que viriam mesmo. Onde estão com a cabeça? Ninguém precisa da presença deles ali. Escondeu umas garrafas atrás do raque da TV e se arrastou até a porta. Abriu e lembrou de ser sempre sorridente:
- Boa tarde se... Senhores - soluçou e sorriu. O cheiro da bebida pairou nas narinas dos policiais.
- Está tudo bem Sra. Betta?! - O policial forte e moreno perguntou preocupado - Parece que andou afagando alguns problemas. - Falou quase num tom de ironia.
Para respondê-lo Betta levantou os olhos e só aí percebeu algo de errado. Haviam três policiais. Os dois da semana passada e mais um. Óculos redondos, bigode, baixo, paletó marrom claro. Reuniu forças e com expressão séria perguntou:
- Quem é o pequeno? Porque está querendo entrar em minha casa? - A voz estava embargada e o bafo era terrível.
- Bom Sra., esse é o detetive James. Ele exerce vários papéis e é conhecedor de muitas áreas de investigação e até mesmo ao que não está relacionado com a policial. Mas não se preocupe é a primeira e última vez que ele vem aqui. Houveram algumas mudanças nos documentos.
Após algumas perguntas não muito bem respondidas os três policiais entraram. Em sua cabeça o policial forte e moreno, Brandom, se perguntava se estaria sendo neurótico demais. Sabia que tinha algo de errado naquela casa e trouxe um especialista em detalhes. Um dos gênios das investigações. O policial James tinha uma memória fotográfica incrível e conhecia diversos sinais, códigos e etc. Além de falar mais de 8 línguas e possuir na maioria das vezes a melhor das deduções.
Entraram e Betta cambaleou. Viu que Brandom vinha preparado com uma arma. Talvez esperasse por algo. Fechou a porta e torceu pra não notarem nada de estranho. "Pegue... Você precisa se defender"
- Cala a merda da boca! - Todos olharam pra mulher que sorrio disfarçadamente tentando distraí-los do que tinham acabado de ouvir.
- Está tudo bem Sra.? - James se aproximou.
- Tudo... Só estou meio estressada. Vamos, onde desejam ir?
- Se estivesse escondendo algo onde colocaria? - James começa a analisar a mulher. A pergunta foi um choque pra Betta que pensou no porão.
- Porque isso agora? - Ela olhava pra baixo, por dentro estava desesperada.
- Bom, só quero começar pelos lugares onde eu não pensaria ir - Mentira. James pretendia subir até ao teto da casa, se fosse possível.
- Eu... Eu... - Suava frio e estava tonta. Com a mão na cabeça ela deu passos para trás. Ameaçava cair. Bran adiantou-se.
- Sra. Betta? Precisa de um médico? Não parece muito saudável.
Betta olhou pro policial com os olhos arregalados. Os cabelos estavam uma bagunça e estava toda suja com o álcool. No carpete uma grande mancha se destacava e estava seca. Não começou a beber a pouco tempo. Quando ia falar as luzes do corredor onde estavam piscaram. Seguiram a mesma ordem e o policial James e seu parceiro notaram a semelhança. Betta correu pro interruptor e as desligou.
- Porquê fez isso?
- Ora Sr. James, é um problema na casa. Nada relevante.
- Achei que arrumaria semana passada - Brandom estranhou.
- Ah, não tive tempo desde então - Sempre sorrindo.
"Oque está esperando? Eles vão descobrir"
- Acenda as luzes - James era autoritário.
- Em que isso vai...
- Acenda essas luzes Sra.!
Betta não tinha escolha. Já era muito suspeita toda a situação. Acabou acendendo e elas estabilizaram. Um alívio percorreu o coração de Bet. E dizem que sorte não existe. Sorria dentro de si mesmo. Era incrível como sempre tentava sorrir até quando estava totalmente na merda. De repente um gemido alto foi ouvido. Betta engoliu em seco. Todos foram tomados por um silêncio cheio de suspense. Não tiravam os olhos do fundo do corredor. Havia ali uma portinha, na lateral das escadas que levariam pro primeiro andar.
Havia no corredor dois quartos que estavam sempre de portas abertas. Após o gemido as luzes deles começaram a piscar em paralelo. Piscavam da mesma forma e respeitando as mesmas pausas. Um barulho alto de ouviu. Alguém chutou a porta. Bran sobresaltou-se. Oque estava acontecendo? Betta estava paralisada e as luzes dos quartos continuavam a piscar. James não tirou os olhos daqueles flashs que passavam pelas portas.
- Sra. oque está acontecendo?! Tem mais alguém aqui?
- É só...
- Eu quero ver oque tem atrás da porta.
As luzes pararam. Betta não estava acreditando no que James acabara de lhe pedir. Todos olhavam pra mulher descabelada e com olheiras que emanava um odor forte de bebida.
- Vamos Betta. Abra a porta. - James já sabia oque estava acontecendo e procurou ser o mais racional possível. Precisava pensar.
Sem dizer uma única palavra Betta se encaminhou até a portinha, seguida pelos demais ali presentes. Não sabia oque fazer, estava tudo acabado.
"Vai mesmo deixá-los vencer?"
"Você é fraca mesmo!"
"Nunca deveria ter começado oque não consegue terminar!"
"Acabe com essa droga agora!"
A cabeça de Betta girou, seu estômago estava vazio e ela desmaiou. O som forte do corpo em encontro com o chão assustou a todos. Bran correu e verificou a respiração da mulher. Estava fraca.
- E agora Detetive?
- Antes de socorrermos vamos ver oque Betta escondia atrás da porta.
- Mas Sr. James, ela está muito fraca! Talvez tenha sido um animal qualquer! Não podemos deixá-la morrer! - Bran estava nervoso, não era muito forte por dentro e sentia pena por qualquer criatura. Desde uma formiga até a maior das girafas.
- Não discuta Brandom. Aprenda a ser forte! Aprenda a ser homem. - As palavras foram frias e diretas. James não era do tipo que provocava mas precisava tirar aquele brutamonte do chão. Brandom só tinha um porte forte, mas era como uma criança medrosa.
Se entrolharam e voltaram a andar. Betta foi deixada no chão, seria a última tarefa deles. Perto o suficiente para abrir a porta tremeu. Um som como uma voz humana foi ouvido dos fundos do porão. James olhou pros parceiros e abriu a porta. Nesse exato momento um odor de podre fugiu do pequeno espaço em que estava retido. Entrando diretamente nas narinas dos três policiais que recuaram e taparam rapidamente seus narizes. Josh o companheiro de Brandom ficou enjoado e passou a ter ânsias de vômito.
A única coisa visível eram os degraus que levavam ao chão do porão. Tudo era escuro. James os aconselhou a manter narizes e bocas tampadas para descerem. Betta os olhava do chão. Com o celular em mãos James liderou a descida. Começaram a descer os degraus e o cheiro era mais intenso. Quiseram parar quando da escuridão ouviram um gemido, mas James sabia que alguém precisava de ajuda. Pediu socorro através das luzes. Descendo devagar chegaram ao térreo. Todos ansiosos e Bran quase desmaiando.
James mirou o celular em todas as direções e oque encontrou o fez vomitar. O corpo de um menino estava jogado ali num canto qualquer. O pescoço estava virado violentamente um dos ossos pulava para fora e deixava exposto órgãos de sua garganta. De seu nariz formigas saiam e moscas sobrevoavam seu corpo mole que apodrecia. Vermes saiam das cavidades. Estava sendo comido por dentro. Em decomposição. Josh se virou rapidamente e cuspiu todo o almoço e quando não havia mais nada em seu estômago lançou líquido. Estava quase vomitando seus órgãos.
James pensou por um momento e na conclusão que chegou estremeceu dos pés ao mais alto fio de cabelo em sua cabeça. "Como esse jovem poderia estar pedindo ajuda e emitindo sons, como também chutou a porta, se está claramente se decompondo. Não está aqui a pouco tempo. E isso explica o cheiro de podre." Foi aí que a única luz que iluminava as escadas se apagou. Betta havia fechado a porta e trancou todos ali dentro com o cadáver.
Na escuridão um barulho alertou a todos que deviam sair dali. Parecia ser de ossos se quebrando depois de algo pesado cair. E um grito foi entoado, mas não saiu de nenhum dos policiais. Josh continuou vomitando enquanto James e Brandom correram pra abrir a porta. Betta tentava fazer uma barricada com uma cômoda que estava ao lado. Era muito pesada. A cômoda estava com inúmeras garrafas vazias que caíam enquanto o móvel balançava pra lá e pra cá. Brandom chegou á porta e empurrou. A cômoda foi arrastada e Betta jogada pra trás.
Correndo de volta Bet empurrou a cômoda com todas as forças.
- Miserável! Não vai sair daí nunca! - Ela gritava enquanto empurrava. James conseguiu colocar um braço e a cabeça pra fora. Atingiu Bet com um soco que a deixou atordoada. Sacou a arma que trazia na lateral de sua calça e descarregou todo o cartucho na porta. O primeiro tiro passou raspando a barriga de Bet que se abaixou e se arrastou pra um dos lados da cômoda onde gritava de dor. "Agora sua vadia desprezível!". Sem pensar muito pegou uma das garrafas e atirou sobre a cabeça de Bran que gritou quando cacos de vidro penetraram sua carne.
Brandom recuou da entrada gritando, escorregou e caiu escada abaixo. O detetive James ficou imóvel vendo aquele homem corpulento rachar seus ossos numa queda de alguns degraus. A porta se fechou totalmente e Betta empurrou a cômoda contra ela. Não poderiam mais sair dali. Bran estava praticamente morto. Josh estava sem forças para se mover e James não tinha porte físico pra arrombar a porta. Se quisessem sobreviver por mais tempo teriam que se alimentar dos corpos uns dos outros, mas sem conseguir se hidratar morreriam logo.
Betta caiu com o nariz sangrando, não tinha mais forças. Desmaiou. Passou horas dormindo e quando acordou seus olhos ardiam. A cabeça explodia. Tocou no nariz e sentiu o sangue seco. Viu a cômoda e recordou de tudo. Levantou tonta e foi ao banheiro. Tomou um banho. Arrumou o cabelo e vestiu roupas limpas. Estava na hora de arrumar aquela maldita casa. Ouviu socos na porta do porão mas não ligou. Desceu limpa e se hidratou com água. Morria de fome. Se alimentou e tirou todas as garrafas de bebidas que estavam espalhadas pela casa. Limpou cacos e olhou pro carpete. "Vou ter que tirar e comprar um novo".
Tudo limpo. Ouviu gritos e se chegou perto da porta que começou a tremer. Empurrou pra mais perto a cômoda pra garantir que ninguém saísse. Depois de algumas horas se preparou pra dormir a casa toda estava escura. De repente as luzes voltaram a piscar naquela mesma ordem. Deitada na cama Bet lia um livro. E com as luzes piscando perdeu a concentração. A luz do abajur iluminava seu rosto e apagava novamente. Ela sorriu. Pegou a taça com vinho na cabeceira levantou e disse:
- Saúde meninos! - Das escadas vieram gritos e gemidos de dor - Ah, só não façam muito barulho estou tentando dormir. - Tomou uma grande quantidade do vinho e finalizou - E quero pedir que se comportem pela manhã, remarquei a reunião com aquelas putas das "Damas de Vermelho".
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Socorro
TerrorA vida de Betta começa a desmoronar depois de planos e mais planos não saírem como planejado. Suas finanças não subiam e ela corria grande perigo. O filho descobre ações que não lhe agradam e em meio a crises a Sra. Betta toma uma das piores atitude...