No dia seguinte, pela manhã, minha vida parecia ter voltado ao normal.
Acordei-me com os brados incessantes de mamãe, recebi o habitual beijo na testa de meu pai e presenciei a mudança que ocorreu no ambiente quando Thomas entrou pela porta da frente trazendo consigo um odor insuportável de cerveja barata. Logo, o regozijo presente na face de meu genitor, decorrente do sobrenome de Leonardo exposto na primeira página do jornal daquele domingo, desapareceu como poeira. Para culminar, com olhos vermelhos e narinas dilatadas, meu irmão disparou contra o senhor LeBlanc o rancor que parecia acomodar em suas entranhas há muitos anos.
Após relatar que por toda a noite ouvira boatos ininterruptos seguidos de perguntas assíduas sobre a antecipação de meu casamento com o herdeiro dos DiCaprio, Thomas protestou aos berros sobre quão absurda era a pressão contínua que papai investia em meu noivado. Enquanto ele me alertava que, àquela altura, esse era o principal assunto que cobria as ruas da cidade, eu quase enxerguei a sua versão que ficou para trás. Esquecido, aprisionado no passado.
O Thomas daquela fatídica tarde em Coney Island. Desolado, aflito, tomado por uma sensação de impotência que parecia inundar seus pulmões assim como a água salgada tentara fazer com os meus. Aquele que, tendo sido o único que notara minha ausência e correra para alertar nossos genitores sobre meu sumiço, jamais deixou de se afogar num profundo remorso por não ter impedido meus passos a tempo.
Por meses, meu irmão suplicou para que eu o perdoasse. E, ainda que eu tenha o dito exaustivamente que não havia culpados envolvidos naquela fatalidade senão minha sede infantil de explorar o mar – e o estúpido torso dourado do suposto anjo que eu sequer acreditava ter sido real e, portanto, guardei a sete chaves apenas em minha memória –, desde então ele nunca foi o mesmo.
Depois de um longo e indômito período de rebeldia, Thomas foi coagido a seguir as vontades de papai e, a contragosto, formou-se como advogado. Contudo, o diploma respeitado que ele conquistou não o coibiu de buscar refúgio em bebidas e jogos de azar. Eu cogitava, entretanto, que o efeito temporário do álcool e os punhados de dólares que ganhava com apostas nada faziam para anestesiar suas mágoas.
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LUST
FanfictionO pecado mais agridoce que Daisy poderia consumar tinha um par de olhos verdes enigmáticos, um sobrenome recorrente nas manchetes dos jornais nova-iorquinos e era bastante elogiado pelas moças de seu ciclo social por supostamente dominar a arte de l...