Depois de três comprimidos para enxaqueca, a cabeça de Hope ainda latejava de dor. Um galo enorme doía na parte de trás de sua cabeça, e o cotovelo ralado ainda ardia. E apesar de cada um desses itens serem grandes incômodos, Hope agradecia por eles. Eles eram a prova de que o que aconteceu na noite anterior era real, que não havia sido um sonho, de que ela não estava ficando louca.
Além dos machucados e escoriações, ela também estava com horríveis olheiras, decorrente da noite de insônia. Ela nem havia tentado dormir, ela sabia que não conseguiria. Sua mente estava desperta demais, e os acontecimentos da noite a deixavam inquieta. Hope repassou cada cena da noite em sua cabeça, e cada vez que ela relembrava cada acontecimento, tudo parecia ainda mais um sonho. Muito surreal, para poder ser verdade.
Ela não conseguia acreditar no que havia feito, dito ou visto. E cada vez ela lembrava mais e mais do que o homem havia dito a ela antes de desaparecer no meio da escuridão.
— Eu vou deixar você viver. — Ele havia dito. — Apenas por você ser a única pessoa corajosa, ou burra, o suficiente para não me temer. Mas tome cuidado com toda essa coragem, meu anjo, você pode não ter tanta sorte na próxima vez...
Era verdade que Hope nunca havia sido uma menina medrosa, ela nunca teve medo de nada. — Além de cobras. — Ela sempre era a criança que caia e não chorava, que enfrentava valentões na escola, que não se sentia intimidada em andar a noite sozinha, ou não hesitava em repreender algum cara estúpido.
Como Hope havia crescido sem pai, e a mãe estando constantemente ausente por causa dos turnos que ela sempre pegava a mais no hospital para poder sustentar sozinha a família, Hope foi obrigada, desde muito cedo, a aprender a se virar sozinha, a não depender de ninguém, a se tornar completamente autossuficiente. E depois de perder a mãe em um acidente de carro aos 16 anos, Hope ficou sozinha no mundo. Sem praticamente ninguém com quem contar, ela teve que arrumar um emprego, e aprender a morar e se sustentar sozinha. Ela foi obrigada a se tornar aquela garota corajosa, que não temia nada e que está sempre preparada para qual fosse a barreira que a vida lhe impusesse.
Sempre foi isso que ela fez. Encarar de cabeça erguida cada dificuldade em seu caminho, sempre enfrentando tudo e seguindo em frente. Foi assim que ela superou a ausência de uma figura paterna e como ela sobreviveu a morte da pessoa que ela mais amava no mundo. Essa era ela. A garota corajosa. A garota sem medo.
Hope ouviu certa vez uma frase que dizia que o medo era o melhor amigo de um homem. Ela sabia que isso era verdade, uma pessoa que sabe o que temer é inteligente, isso faz ela saber até onde deve ir antes que tenha a cabeça arrancada do corpo. Hope sabia o que devia ou não ser temido, mas ela simplesmente não se desviava de seu caminho, ou desistia do que queria por causa de algo tão subjetivo e psicológico como o medo.
Quando estava perto do perigo o coração dela também disparava, ela sentia o frio na espinha e todos os sinais que demostram que você estava em maus lençóis, só que diferente dos outros, isso não a fazia querer correr. — Bom, a fazia querer correr sim, mas em direção ao perigo, e não dele.
O perigo sempre a atraiu.
O fato de que a garota que ela tentou ajudar ter desaparecido em uma explosão de luz, e de o estranho de olhos azuis também ter desaparecido, em uma névoa negra, também havia contribuindo para a sua insônia. Porque não havia nada que Hope odiasse mais do que ter perguntas e não saber as respostas.
Era domingo, e como todo domingo, Hope se encaminhou em direção ao QuickFood para tomar café da manhã com Emanuelle e Peter. Era uma tradição dos três, todo fim de semana sempre tomavam o café da manhã juntos, para recompensar a correria da semana, que geralmente os impediam de se ver com frequência.
Ao atravessar a porta da lanchonete, Hope avistou seus amigos sentados em um canto, e foi em direção a eles. Emanuelle que geralmente estaria esbanjando estilo, estava com uma blusa de moletom e o cabelo preso em um rabo de cavalo, Peter estava como sempre; jeans e camiseta e o cabelo desgrenhado caindo sobre o rosto.
— Parece que a noite de vocês foi ótima. — Disse Hope sarcasticamente quando se sentou em frente aos dois.
Emanuelle apenas soltou um gemido em reposta e continuou na mesma posição que estava, com a cabeça apoiada na mesa, e Peter apenas lançou um olhar que lhe dizia que ele estava tão exausto quanto.
— Ok, parece que vocês estão com um pouco de ressaca. — Disse rindo.
— Você também parece. — Disse Emanuelle a olhando pela primeira vez desde que chegara.
Hope franziu o cenho e suspirou.
Sabia que também estava com a aparência horrível, só que no seu caso a culpa não era do álcool.
— Não dormir muito bem. — Explicou dando de ombros.
— Há algo errado? — perguntou Peter a olhando. — Você está estranha.
Hope conteve um xingamento. Ela deveria saber que logo que Peter a olhasse saberia que algo estava errado, ela já havia decidido não mencionar aos amigos o incidente no beco, porque só serviria para preocupa-los desnecessariamente.
— Não. Nada errado. Estou bem. — Mentiu ela.
— Ainda está chateada por causa do Maicon? — perguntou Emanuelle com o cenho franzindo de preocupação.
— Não — soltou uma risada seca. — Acredite, eu nem lembrava mais que Maicon existia até você falar nele.
E era verdade. Depois de tudo que havia acontecido na noite anterior, ela não havia pensado nem por um segundo em Maicon, nem no que a estava incomodando tanto na noite anterior.
Todos seus problemas pareciam ter desbotado em comparação ao que ocorrera no beco.
— É isso aí garota — gritou Emanuelle recuperando um pouco da sua energia, mas franziu o cenho logo depois por causa da dor que o próprio grito a causou. — Esqueça de vez aquele babaca escroto.
— Eu não acho que eu vá ter problema com isso. — Disse Hope com o olhar preso do lado de fora da janela, aonde ela podia jurar ter visto um cara de cabelos negros com olhos azuis a observando.***
Depois de ter passado o dia na casa de Emanuelle assistindo filmes com pipoca e brigadeiro — que de acordo com Emanuelle é uma tradição obrigatória a ser feita com a melhor amiga depois de um término. — Hope voltou para casa se sentindo bem melhor. Ela não havia passado todo o dia pensando no incidente, porque era praticamente impossível ouvir seus próprios pensamento quando tinha Emanuelle ao seu lado tagarelando o tempo todo.
Apesar disso ferir um pouco seu orgulho, Hope havia decidido esquecer o que aconteceu naquele beco, e parar de tentar achar explicações para as coisas surreais que havia visto. Ela não gostava de desistir, mas depois de ter pensado em todas explicações plausíveis; que ia desde ela ter sido drogada e ter uma alucinação, até a hipótese de que aquela mulher e homem terem sido abduzidos por alienígenas, ela decidiu que para o bem de sua sanidade, era melhor simplesmente esquecer e aceitar que havia muitas coisas entre o céu e a terra que não podiam ser explicadas.
Ela já havia se convencido de que aquela era realmente a melhor opção enquanto destrancava a porta de seu apartamento, e enquanto colocava a bolsa na mesinha ao lado da porta da entrada, ela já tinha direcionado seus pensamentos para o que ela iria fazer para o jantar. Espaguete, ela havia decidido.
Hope já estava indo para a cozinha, para conferir se tinha todos os ingredientes necessários, quando uma voz masculina rouca a fez estacar no chão.
— Olá de novo. — Ronronou a voz.
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O Anjo Infernal (Trilogia Infernal 1)
FantasyVocê acredita no céu e no inferno? No bem e no mal? Em anjos e demônios? Hope também não acreditava, não até tentar intervir em uma briga, e então conhecer o misterioso Adam. Ao descobrir um lado oculto do mundo e que forças obscuras querem usa-la c...