Capítulo Um

101 11 10
                                    

A carta de despejo ainda continuava em sua mão, mas Bill já não a notava mais. Encarava a porta de madeira, incrédulo com o descaso de seu colega de apartamento de simplesmente decidir que ele não era mais bem vindo. Oras, e daí que o apartamento era de fato daquele idiota engomadinho? Bill tinha pago mês a mês seu aluguel e não havia quebrado nada nas duas últimas semanas!

Agora, de mochila nas costas e uma caixa velha nos braços, Bill transitava em pensamentos de raiva pela injustiça, formas de vingança com ovos e tinta spray, e um possível desespero ao constatar que, pela primeira vez, não tinha mais uma casa para voltar.

Tudo porque era impulsivo e criativo demais para o senhor "faço curso de direito".

Não que as outras pessoas enxergassem sua bagunça como algo criativo, mas Bill não dava a mínima. Ele era um artista, e artistas precisavam de um espaço para produzir. O que, infelizmente, foi tirado de Bill pela merda de um aviso de despejo.

Puta que pariu, estava fodido.

Antes que enfim deixasse o prédio para morar nas ruas – oh, o drama nativo de seu sangue fervente – seu celular tocou, impedindo que fizesse um belo buraco na porta com a bota pesada. Atrapalhou-se para tirar o aparelho do bolso da calça, e animou-se ao ver o nome de Stanley Uris brilhar na tela.

— Oi, estava p-pensando em você — Bill começou assim que atendeu, e conseguiu captar o som de um riso curto do outro lado da linha. — Sobre aquele n-nosso encontro...

— Era por isso que liguei — havia vozes atrás de Stanley, e Bill conseguiu distinguir algumas palavras como "injusto" e "canalhas". — Vou precisar fazer hora extra hoje na escola, por causa de uma reunião de última hora. Mas podemos remarcar para amanhã ou depois.

Bill por muito pouco não soltou um suspiro de alívio, achando que poderia ofender Stan. Já estavam marcando cafés e pequenos encontros há um mês, e finalmente a intimidade se tornava mais confortável entre eles.

— T-Tudo b-b-bem — tentou soar indiferente, mas a voz o traiu num tom claramente ansioso. — Daqui d-dois dias, no domingo.

Bill conseguiu ouvir mais um xingamento e depois uma risada escandalosa. Stanley soltou um som de quem estava controlando a irritação, e Bill se pegou sorrindo ao imaginar o rosto bonito do rapaz retorcido em raiva.

— Domingo está ótimo — Stanley concordou, tentando não transmitir a raiva para Bill. — Boa tarde, Bill. Eu preciso ir.

Bill continuou encarando a tela do celular mesmo quando a voz de Stan já parecia distante. Fazia dois meses que se conheciam, e quase um mês que começaram a sair. Já tinha a certeza de seu nítido interesse romântico pelo jovem professor, e quanto mais o tempo passava, mais desejava ter uma relação além dos encontros casuais e das trocas de mensagens.

A caixa pesou em seu braço, e Bill soltou o ar. Antes de pensar na sua bela futura relação com Stan, precisava primeiro garantir que teriam uma cama para rolar no sexo apaixonado que fariam.



A risada de Beverly foi bem inesperada, o que fez o sangue de Bill voltar a ferver. Sempre descreveu a amiga como alguém extremamente gentil e acolhedora, o que de fato ela estava sendo ao lhe deixar ficar temporariamente no sofá de seu apartamento compartilhado. Mas ao final da sua triste narrativa (onde fez questão de ressaltar a personalidade asquerosa do colega de apartamento), ao invés de ganhar os braços de Bev e carinho na cabeça, tudo o que recebeu foi a gargalhada gostosa de quem assistia a um filme de comédia besteirol.

— Não vou dizer que aprovo a ação dele, mas eu cansei de avisar você para se comportar, Bill. — Beverly respirou fundo quando a crise de risos finalmente passou, e encarou o amigo com aquela doçura típica de suas ações. — Sabe que não me importo que fique aqui, mas Eddie vai exigir que você pague o dobro por conta da sua zona.

DespejadoOnde histórias criam vida. Descubra agora