Pequenos Covardes

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  A fúria dos mortos devastou tudo que encontrava em seu caminho e com passos rápidos tomaram o corredor, cujas tochas se apagavam com seu avanço mortífero. Corvinal usava toda sua força para se manter de pé e ser guiado por sua aliada, mas ele sabia que isto não seria o bastante para saírem dali vivos. Se a situação chegasse a um estado crítico, como esperado, ele lançaria seu corpo aos Undeads para que assim sua morte não fosse em vão.

  No entanto, Little Forest partilhava da mesma determinação que o cavaleiro. Seu medo era agora uma mera melodia, perto do rugido estridente de bravura por aquele que lhe arrancara dos braços frios da morte.

  A menina retirou de seus inúmeros bolsos mais um frasco e o deixou cair aos seus pés, sem que seus movimentos cessassem por um único segundo. Aquele era o último de suas bombas para debilitar a movimentação inimiga, sua carta final, que se usada errada determinaria suas sentenças de morte. A fumaça verde então engoliu o local, enquanto a criança se forçava em aguentar parte do peso da armadura em direção a saída.

  Com os mortos presos ao chão pela substância,a dupla por fim conseguiu atravessar o portão para a escuridão. Por algum resquício de sorte, não havia mais inimigos por ali, apesar do caminho ser totalmente negro, fazendo a menina escolher a dedo por onde deveriam seguir.

  Ainda que não houvesse monstros a dúvida pairava no coração de Little Forest, seguindo calmamente a direção do ar, por mais complexo que fosse naquela situação. No entanto, seus instintos talvez houvessem falhado. Corvinal pisou em um local sem chão, seu corpo despencou sem resistência, arrastando o corpo da menina com o peso da armadura. Talvez por mero reflexo, o Corvo envolveu a criança em seus braços e recebeu o maior dano da queda contra o piso de pedra.

  O cavaleiro cuspiu sangue no interior de sua armadura, enquanto seus braços ainda tentavam proteger Little Forest. Os dois rolaram no chão, confusos e com dor.

- Vocês! Vocês também caíram aqui! - Exclamou alguém.

  A garota se levantou, com as pernas bambas, e apesar da visão turva pôde ver a figura de um velho homem em cota de malha surrada com um grande escudo nas mãos. Suas memórias enfraquecidas então trouxeram o nome de seu companheiro, Old Wall.

  O velho escudeiro não parava de comemorar aos deuses pela chegada dos dois, o suficiente para Little Forest esquecer por um minuto o estado do cavaleiro ferido ao seu lado.

- Corvinal!

  O homem já mal respondia, com o corpo quase imóvel. A menina então removeu seu capuz e sua capa, espalhando seus grandes cabelos brancos e revelando suas longas orelhas. Esconder-se já não lhe era uma preocupação, ela buscava freneticamente entre seus frascos e ervas algo que pudesse reanimar seu aliado caído.

  Enquanto Little Forest misturava de forma ágil alguns líquidos e folhas, Old Wall apenas observava de longe, ele se encontrava surpreso por ver um elfo de perto ao mesmo tempo que não sabia como olhar nos olhos da garota que ele havia abandonado a pouco. Por mais covarde que fosse, ele ainda encontrou piedade em seu coração para lamentar o estado de Corvinal.

  Depois de alguns preparos herbalísticos, a menina terminou uma grosseira mistura. Não era a melhor de suas obras, mas seria o suficiente com o pouco de material que restara.

- Old me ajude a tirar isso! - Clamou Little Forest, com as mãos no elmo do Corvo.

  Com certo temor, o velho seguiu o pedido da menina e os dois começaram a retirar o elmo do cavaleiro negro. O rosto de Corvinal foi contemplado pela luz das tochas, sua aparência não deixava tão claro sua idade apesar de indicar estar na casa dos vinte e possuir uma leve barba negra, assim como seus cabelos. Certamente, o que se mais notava eram seus ferimentos, tendo pequenos cortes e uma boa quantidade de sangue escorrendo de seus lábios. O olhar do homem estava perdido, como se já não aguentasse permanecer neste mundo.

Corvinal - A Maldição do CorvoOnde histórias criam vida. Descubra agora