Visita inesperada

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Dezembro de 2016

Às vezes pensamos que nada de bom vai acontecer. Principalmente quando estamos vivendo uma maré de má sorte desde o começo do ano, na escola, na vida familiar e pra variar, na vida amorosa. Por que seria diferente no natal e no ano novo? Meus poucos amigos dizem pra eu acreditar que tudo vai certo e que algo muito melhor do que eu espero, pode estar reservado no futuro, mas é difícil pensar assim quando se sente que as pessoas pelas quais você mais queria por perto, querem distância de você.

Minha mãe foi embora, e meu pai também. Dois problemáticos que decidiram por seguir uma vida vadia me deixando nos cuidados da minha avó sem o menor aviso. A vida com eles era completamente disfuncional. No fundo aqueles dois se mereciam. Tinha dúvidas até se eles realmente me amavam. Hoje sei a resposta.

Na escola, minhas notas não estavam assim tão exemplares, com tudo que estava passando, minha cabeça não funcionava pra quase nada, até começei a ficar cada vez mais antisocial, sempre trancada no quarto, sem vontade de falar com ninguém, apenas perdida nos meus hobbies e pensamentos, era uma forma de escapar daquela realidade, e na questão de relacionamento, isso passava bem longe.

Minha avó é que ultimamente vem sido o meu motivo de alegria. Ela é muito boa pra mim, me apoia em tudo e nunca fala dos meus pais. Ela também sofreu bastante com o tratamento deles comigo. No fim, só o que queríamos era um pouco de paz. Fora isso, ainda tenho a companhia de uma cadelinha chamada Princess, presente da minha avó já na primeira semana em que estava morando com ela.

Meu nome é Alice, tenho 17 anos. Sou uma garota cheia de sonhos, embora não consiga expressá-los com tanta facilidade quanto gostaria, já que tenho uma personalidade um tanto introspectiva. Não tenho muitos amigos, e desde a partida dos meus pais tóxicos, tenho conseguido viver tranquilamente com minha nova família. As férias de fim de ano andam bem monótonas, e tudo que eu posso fazer é ficar imaginando aventuras em meu mundinho particular, porém eu desejava algo que fosse real.

Eu estava deitada na cama, olhado pela janela, com a Princess no meu peito. Aquele dia estava um tédio, ainda mais porque eu teria que ficar esses últimos dias do ano em casa, fazendo praticamente nada, exceto ter que estudar pras provas de recuperação que ocorreriam mais pra frente, então eu teria que ir à escola de qualquer jeito. A cidade em que moramos é muito pequena, quase nunca tem evento, e minha avó não tinha planos para viajar, então o que me restava era ficar olhando dramaticamente pela janela. Já havia lido todos os livros da minha meta, concluído todas as minhas séries favoritas, eu só queria algo diferente que eu pudesse me encaixar e aproveitar.

Percebi que o tempo começou a fechar, e fiquei bastante animada, pois quando o céu está nublado me faz sentir mais leve e calma. Estranho, não é? Geralmente as pessoas sentem o oposto. Chegou a chuviscar um pouco, mas não choveu. O que me fez voltar a deprê outra vez... Como eu poderia sentir que algo espetacular poderia acontecer comigo nesse dia tão monótono? Só um milagre poderia melhorar o meu Natal.

Assim que parei de pensar nisso, a campainha tocou...

Levantei, caminhando até a porta.

- Oi. - Falei um tanto surpresa.

- Oi, Alice! Boa tarde! Tudo bem? Vim aqui te entregar um convite.

Era a Deize. Sempre muito sorridente, ela tinha cabelos longos ruivos e cacheados. Era a garota mais popular da escola, conhecia quase todo mundo. Até no nosso bairro. Além disso, era super falante. Às vezes, as habilidades sociais dela me assustavam. Mas o que ela queria comigo?

- Que tipo de convite? - Perguntei meio desconcertada, porque nunca nos falamos mais que um "oi", mesmo sendo da mesma classe. Que bizarro!

- Vai haver uma confraternização na cidade. A galera toda da turma marcou presença e só faltou você para entregar o convite. Gostaria que viesse com a gente. - Me entregou um panfleto. - Os demais moradores do bairro também receberam o convite, então vai ser bem movimentado.

- Que legal... Ir com a turma... - Disse com as palavras arrastadas. Eu já via aquele povo todo dia!

- Qual é. Vai ser divertido! Sei que você não é muito de interagir. Sei disso porque sempre observei você na classe. Mas dá uma chance. Sei que você vai curtir.

- Tudo bem...

- Okay, preciso ir agora. Te vejo amanhã, certo? - Ela se despediu acenando.

Fiquei parada na porta, olhando pro papél, quando minha vó perguntou atrás de mim:

- Quem era?

- Uma garota lá da escola. - Respondi fechando a porta.

- O que ela queria?

- Me entregar um convite pra uma confraternização que vai ter na cidade.

- Nossa! Até que enfim um evento nesse fim de mundo. O que será que vai ter lá? Acho que eu deveria ir também.

- Quê??

Mesmo já sendo uma senhorinha de idade, minha avó se comportava de maneira bem jovem até, sempre alegre e disposta.

- Por quê? - Ela me olhou com um ar zombeteiro. - Estou velha, não morta.

- Ai, que legal! Aparecer amanhã sem amigos, sem namorado e sem... Ah não, espera! Eu vou com a minha vó! - Disse, voltando pro meu quarto, dando continuidade a zueira.

- De fato, ninguém quer ser visto com uma senhorinha nada descolada, né?. - Brincou. - Então quer dizer que vai amanhã.

- Eu não... Disse... - Tentei terminar entortando os lábios. Ela sempre colocava palavras na minha boca.

- Tô brincando! - Ela riu. - Por mais que eu goste de festas, são muito lotadas, e isso me deixa enjoada.

- Nisso nós combinamos perfeitamente, vó. Multidão não é minha praia.

- Pense direitinho, tá? Vai ser uma chance de você fazer alguma coisa e sair desse tédio. - Ela acariciou meus cabelos.

- Obrigada, vó. Vou pensar nisso. - Sorri.

Já era madrugada, todos dormiam, mas eu permanecia acordada, sem conseguir dormir direito por conta da ansiedade, meu humor não tava legal. Pensei bastante em ir para essa confraternização, mas como eu poderia ir se não falo direito com ninguém? E não conheço ninguém de verdade? Definitivamente eu não me encaixaria lá. Respirei fundo e quando finalmente tomei minha decisão, caí no sono.

Alice - Um história com a Cover's NightOnde histórias criam vida. Descubra agora