Capítulo 4

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Amelia

      Dois dias haviam se passado.
      Eu estava de volta à rotina de treinos com todos os soldados. E por algum motivo milagroso, não vi mais Linus por ali, nem tive outra interação com o Capitão Levi, o que presumi ser algo bom — magnífico, na verdade. O único momento em que via ele era na hora do café da manhã e às vezes no almoço, ocasionalmente passava para observar o treino da tarde. Sempre distante.

       Naquele dia, mais da metade do Quartel estava de folga, incluindo eu, mas como não estávamos na minha cidade natal, não tinha muito o que fazer por ali.
Eu dificilmente iria sair durante a noite, sozinha, em uma cidade que não conhecia.
Mas, fazia um tempo desde a última vez que tive tempo para banhar Price, então era isso que estava fazendo.

       Sasha havia convencido Jean e Connie a desistirem de ir se divertir na cidade, longe dos olhos dos superiores, e darem banho nos cavalos também.

        — Acha que eu consigo pegar alguma coisa na despensa? — Perguntou, parecendo esperançosa.

        — Não inventa, Sasha — Jean reclamou. — Da última vez todos nós ficamos ferrados por causa disso.

        — Eles nem vão perceber.

        — Tenho certeza que dá pra distrair os superiores — Apoiei. Jean me lançou um olhar de repreensão, eu dei de ombros, virando mais shampoo no pelo do cavalo (O animal, não o Jean)

        — Aí, aquela nuvem é igualzinha a você. — Connie indicou com a cabeça, trazendo um balde de água limpa.

       Poucas nuvens passavam pelo céu. Redondas ou apenas manchas brancas, sem formato, franzi a testa. Eu não sei o que esperava daquele idiota, mas certamente não me preparei.
Tinha uma nuvem perdida no meio das outras, que se olhasse com atenção, podia-se ver o perfil de um cavalo perfeitamente desenhado.

       Prendi a risada no meio do caminho da garganta, fingi cantarolar para Price.

       Não é engraçado, Amelia.

        — Se fode, cara. — Connie riu, satisfeito, e encostou no feno, observando as nuvens passarem. — Lia! Você está rindo disso?

       Virei na sua direção, com a minha melhor cara ofendida.

        — De jeito nenhum. — Jean estreitou os olhos. — Mas parece mesmo.

       Um balde, cheio pela metade, voou na minha direção. Me abaixei para sair da frente, rindo, Jean voltou-se para o animal, resmungando enquanto começava a tirar o sabão do bicho.

        Tessa e Lily estavam acordadas quando eu cheguei ao dormitório. Claramente bêbadas.
Resmunguei um cumprimento, que só foi respondido por uma delas, e me deitei.

       Os músculos das minhas costas e braços estavam doloridos pelo treino do dia anterior e provavelmente o esforço com o cavalo não havia me ajudado.

       As meninas estavam conversando, animadas, dando risadas e gritinhos empolgados. Havia passado do horário do toque de recolher e elas ainda estavam cheias de energia.

       Enquanto estava no esquadrão de Kennedy, dividia o quarto com quatro pessoas. Todos eles eram rapazes barulhentos e enérgicos. Mas nunca tive um único problema com os horários. Eles, geralmente, deitavam mais cedo que eu mesma e eram bastante organizados.
Quatro meninos. Era impressionante que duas garotas estivessem conseguindo ser inconvenientes.

       Ai.

       Desde a volta da expedição, eu não havia me permitido pensar neles. Nem uma única vez. Eles estavam mortos.
Mattheo, Denim, Eddie e Kane morreram. Sozinhos.

       De repente, minhas mãos estavam tremendo e pareciam embaçadas em minha visão.

       Olhei em volta. O quarto bagunçado; um dispositivo de manobra em um canto, o uniforme e outras peças penduradas em cadeiras, na cabeceira da cama ou até soltas pelo chão, uma peça íntima, um chinelo sem o outro par.

       Menos de meia-hora depois de ter entrado, eu já estava me preparando para sair do quarto mais uma vez.
Chutei toda a bagunça para o lado das meninas sonolentas, já que nenhuma das peças era minha.

       A luz no quarto era dada por uma brecha da cortina aberta e uma vela quase totalmente consumida, no corredor, apenas algumas tochas, muito distantes uma das outras, proporcionavam uma iluminação precária.

       A porta atrás de mim rangeu e fechou em um baque forte, empurrando-me de uma vez para fora do quarto.

       Os corredores até a cozinha estavam vazios, mas com certeza tinha oficiais fazendo ronda em algum lugar, e se algum deles me visse, isso certamente ia direto para o meu histórico.

       Depois de verificar algumas vezes, desci direto para o campo de treinamento, mais perto da floresta, onde poderia me esconder com mais facilidade caso alguém aparecesse.
Já tinha obstáculos espalhados pelo campo, provavelmente algum irresponsável deixou ali antes do toque de recolher.
Resmunguei pegando algumas coisas e começando a mudar de lugar, montando uma base para o próprio treino.

       Começaria me alongando, então.

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