Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.
O quarto de Morrigan Abaddon não era como o de uma criança comum. Em vez de cores suaves e bonecas dispostas em prateleiras, o aposento refletia o peso sombrio e a elegância austera da Mansão Abaddon, aninhada em um recanto isolado e nebuloso de Wiltshire, onde a luz do sol parecia ser sempre um convidado indesejado. As paredes eram forradas com tapeçarias de seda verde-escura, bordadas com o brasão da família — um corvo de obsidiana segurando um medalhão de prata antiga. A mobília, toda em mogno polido, parecia mais apropriada para um salão de reuniões do que para o refúgio de uma menina de seis anos; os móveis eram altos, imponentes, e refletiam a luz fraca que filtrava pelas janelas arqueadas. Não havia brinquedos coloridos espalhados; os únicos objetos que demonstravam um toque de infância eram um velho cavalinho de balanço de ébano e, no centro da cama dossel coberta de veludo, a figura minúscula e absorta da própria Morrigan.
Eram quase três horas da tarde, mas uma névoa espessa e fria pairava sobre a propriedade, transformando a atmosfera em uma penumbra perpétua. Morrigan estava sentada no meio de sua cama, os longos cabelos prateados, lisos e incrivelmente lustrosos, caindo em cascatas sobre os ombros magros. Seus olhos, de um tom cinza-claro e incomumente penetrantes para uma criança, estavam fixos em um pequeno álbum de fotografias de capa de couro desgastada, que repousava em seu colo.
Aquele era o seu objeto mais precioso, e o único que lhe permitia vislumbrar a presença fugaz da mulher que a tinha trazido ao mundo. Ela folheava as páginas com uma delicadeza quase reverente, passando o dedo miúdo sobre as imagens, tentando absorver o máximo possível da aura mágica e efémera de sua mãe, Gwineffer Abaddon.
Gwineffer havia morrido quando Morrigan tinha apenas três anos, e a memória física da mulher era para a menina uma névoa pálida, uma sensação de perfume de lírios e veludo que se esvaía rapidamente. As fotos, no entanto, eram mais generosas. Na foto que a prendia naquele momento, Gwineffer ria. Seus cabelos eram loiros-platinados, quase brancos, e caiam em cachos suntuosos, contrastando fortemente com a escuridão da família Abaddon. Ela estava vestida em vestes de festa, parecendo etérea e poderosíssima ao mesmo tempo, e segurava um cálice de cristal, fazendo um brinde invisível para a câmera. Ao lado, um jovem Corin Abaddon, pai de Morrigan, olhava para ela com uma intensidade que a criança não compreendia, mas sentia.
A foto era antiga, e as figuras se moviam com a graça das almas capturadas pela magia, mas o calor que emanava daquele sorriso de Gwineffer era o único sol que Morrigan conhecia dentro da frieza daquela mansão.
A quietude do quarto foi abruptamente interrompida pelo clique seco da maçaneta girando. Morrigan fechou o álbum num sobressalto, protegendo-o com os braços, como se o seu segredo mais íntimo pudesse ser roubado pela simples visão. A figura que adentrou o quarto era a única que exercia uma autoridade absoluta sobre ela e sobre todos os funcionários da casa: Corin Abaddon, seu pai.
Corin era um homem imponente, de altura considerável e compleição magra e tensa. Seus cabelos eram tão pretos quanto os do avô de Morrigan, e ele os usava penteados para trás com rigor militar. Seus olhos eram espelhados aos da filha, um cinza gelado que parecia pesar o valor de tudo o que encontrava. Ele vestia vestes de seda preta que pareciam sugar a luz, e carregava consigo o cheiro de pergaminho antigo e ferro frio — o perfume do poder e da determinação inabalável.