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Olhei as horas no celular. Dez e cinquenta. Faltava pouco. Só uma hora e dez minutos. Eu iria dormir na casa de Lana. Não conseguiria passar o restante da noite, naquele tumulto.

Olhei ao redor e Lauane e duas das minhas primas encaravam Diego, que conversava com tio Olavo. Ele era delegado e só falava sobre seu combate à criminalidade. Vi-me na obrigação de ajudar Diego. Era traumatizante, ouvir aquelas histórias.

- Oi. – disse a Diego assim que meu tio nos deixou a sós, após eu alegar que seus filhos estavam fazendo bagunça na cozinha. Não estava acontecendo nada de fato, mas os conhecendo, com certeza apontariam algo. – meu tio as vezes exagerava nessas histórias.

Ao contrário do que eu imaginava, Diego não parecia nem um pouco entediado. Ele parecia bem à vontade. O que eu achei muito estranho.

- Sua família é muito divertida. São todos incríveis.

-Jura? – eu quase gritei tamanho era meu espanto. - Você está falando sério?

- Você é uma garota de sorte, Luna! – não sei se meu atordoamento ocorreu pelo fato dele achar minha família legal, ou por ouvir meu nome em sua voz pela primeira vez. Eu fiquei por um tempo encarando-o enquanto ele olhava ao redor. Seus olhos brilhavam, e um sorriso torto brincava em seu rosto:

- Eu vim para cá, há alguns meses, à trabalho. Minha família é pequena, apenas eu e meus pais. Eu sempre quis ter tios e primos, uma família grande e barulhenta.- Eu realmente não entendi.  O cara, com certeza, nunca teve que dividir nada com ninguém. Nem quarto, nem banheiro, nem a atenção dos pais. Será que ele estava se ouvindo? Continuei calada, para não estragar sua empolgação com minha triste e dura realidade.

- É interessante passar uma data como essa com todas essas pessoas reunidas. É como se eu estivesse  em casa, e não com pessoas estranhas.

Minha primeira reação foi prender o riso. Diego não poderia estar falar serio. Ele não conhecia minha família para tirar uma conclusão tão precipitada. Tentei falar dos problemas e confusões que essa multidão causava, misturadas em um único espaço, mas ele apenas disse que isso fazia parte e que era bom ter com quem brigar as vezes, só pelo prazer de fazer as pazes. Diego era estranho. Estranhamente envolvente. Passamos algum tempo conversando. Ele me contou sobre sua vida no sul ao lado dos pais. Ele estava trabalhando com Ricardo a poucos meses, mas já fazia planos para trazer seus pais, em breve. Diego era diferente de todos os caras que eu conheci. Ele era especial.

Mamãe chamou a todos para reunir no jardim. Eu e Diego caminhamos lado a lado, e ignorei o olhar mordaz de Lauane em minha direção. Era só o que me faltava, ela dar um chilique de quem viu o gatinho primeiro!

Vovó estava sentada em sua cadeira. Todos os seus filhos, genros, noras, netos e bisnetos se acomodaram ao seu redor. Sua presença era tão acolhedora,que exalava amor e ternura. Seus olhos doces e gentis repousavam sobre cada um de nós. Sua feição era de orgulho e admiração . Lana se aproximou de mim e me abraçou, enquanto Ricardo carregava a pequena Isa, adormecida em seu colo. Nossa mãe estava ao lado de vovó, que a olhou por um breve instante antes de dirigir a nós suas palavras sábias.

- Estou muito feliz de ter todos vocês aqui. O maior presente que Deus me deu foi ter conhecido meu saudoso Aurélio, com quem formei essa linda e grande família. Embora ele, e meu filho Luis não estejam mais entre nós... – vovó fez uma pausa e eu me contive para não me desmanchar com a saudade que ainda me doía. Meu pai também adorava a casa cheia. – Sinto-me orgulhosa pelo caráter que ambos tiveram. Agradeço a Deus pelo tempo que tive com eles, e pelo legado que eles nos deixaram. Agradeço a Deus por cada vida que aqui se encontra. Voces me fazem muito feliz. Cada um desses olhares, enche meu coração de contentamento.Eu amo muito todos vocês! – Vovó sorriu e seus olhos brilhavam marejados. Eu nem percebi que as lagrimas corriam pelo meu rosto. Olhei em volta e todos estavam emocionados. Todos se abraçavam e limpavam os olhos. Vovó prosseguiu, e a força que emanava de sua voz me inspiravam a ser tão forte quanto ela. – Quero fazer uma oração. – todos fecharam os olhos e deram as mãos, olhei para Diego que sorriu antes de segurar a minha mão – Senhor, te agradeço pela família que me deste. Te agradeço por tudo que tens feito e por tudo o que ainda vais fazer. Neste momento nos reunimos para agradecer pelo ano que se passou, pois até aqui o Senhor nos ajudou. Que neste ano que se inicia, o Senhor esteja conosco, com tua provisão  divina. Te agradecemos. Amém!

Todos bateram palmas e sorrindo se abraçavam. Uma atmosfera agradável pairou pelo ar. Me senti estranhamente bem. Lauane caminhou até mim. Será que depois que tudo o que vovó falou, Lauane ainda me provocaria? Não poderia esperar o ano acabar? Respirei fundo, me preparando para me defender de mais uma de suas provocações.

- Posso te dar um abraço? – seus rosto estava borrado pelas lagrimas mas ela não parecia se importar. Eu não esperava por essa reação. Olhei no fundo de seus olhos, à procura de algo que contrariasse suas palavras,  mas apenas encontrei sinceridade. Simplesmente a abracei e juntas choramos. Eu precisava daquele abraço. Precisava reconciliar com minha prima e deixar nossas desavenças de lado. Lembraças de nossa amizade de quando, ainda crianças me vieram à mente, e não sei como ou quando eu esqueci do quanto éramos felizes.

Lauane sorriu e olhamos ao redor, onde todos se preparavam para a contagem regressiva. Ela segurou minha mão e juntas começamos a contar. 10, 9, 8.. olhei ao redor e Diego se aproximou ,segurei em sua mão e continuamos a contagem 7, 6,... Todos juntos, em uma só voz, no meio do quintal, reunidos em agradecimento pela família que era loucamente admirável. Olhando em volta me dei conta do quanto minha família era especial. Tinha suas peculiaridades, é óbvio, mas não a trocaria por nada. Eu não poderia ter nascido em outro lar. Eu não seria eu. Não seria a Luna sem a família Silveira. 5,4,... Olhei para o céu e pedi perdão por ter sido ingrata com um dádiva tão importante  e agradeci por sermos uma família imperfeita e feliz. 

- 3,2,1...Feliz ano novo! – todos gritaram de uma só vez, enquanto o céu era colorido pelos fogos de artificio. Muito barulho, muita alegria e eu me vi sorrindo não contendo-me de alegria. Uma alegria que eu não sentia há muito tempo.

- Feliz ano novo! – disse a Diego que sorria. O sorriso mais lindo que eu já vi na vida.

- Feliz  primeiro ano de nossas vidas juntos!

Eu não tive tempo de responder. Apenas senti meus pés saírem do chão enquanto Diego me abraçava. O meu primeiro abraço do ano. E eu tive a certeza que seria o primeiro de muitos que ainda viriam.

Definitivamente eu poderia conviver com mais um membro na minha grande e enorme família!

Fim!!



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