As paredes brancas do quarto eram tão claras que me cegavam
Só uma coisa destoava da brancura excessiva;
Um calendário enorme pendurado atrás da minha cama
Com um círculo de caneta permanente marcado no dia 24
Sentada na cama, com minhas pernas juntas do corpo,
Me sinto mais sozinha do que nunca.
Mamãe me colocou aqui depois de me ver na neve
Ela não entende o que aconteceu
Faz um ano que estou trancada
Os médicos me dizem que não tinha neve
Que eu estava segurando uma lilás e não uma rosa branca
Que não tinha bilhete algum
Que eu tinha imaginado tudo
Faz um ano que estou perdida na brancura
Bobagem, não acha?
Mamãe não achou
Me trancou nesse hospital, disse que iriam me ajudar
Faz um ano hoje
Disseram que tinha sido o trauma da sua morte
Ridículo, eu sei que você ainda está aqui comigo
Não te vejo, mas sei que hoje você virá
Faz um ano afinal de contas
Lembra do nosso primeiro Natal juntos quando tínhamos 5 anos?
Eu tinha acabado de me mudar e você era meu único amigo
Você me deu uma boneca com cabelos cacheados que nem os meus
E eu te dei um pote que tinha feito com argila
Faz treze anos desde então
Sempre achei que o presente que te dei foi horroroso
Mas você sorriu,
Me abraçou
E disse que nunca tinha ganhado nada tão perfeito
Faz dois anos que não vejo seu sorriso
Meus cabelos hoje estão emaranhados,
Meus olhos sem vida e com círculos roxos embaixo,
Minha pele cheia de espinhas
Estou horrível, eu sei
Faz um ano que não sei onde você está
Meu coelhinho ainda está aqui, comigo
Não largo dele, nunca
E você, me largou?
Faz dois anos que não largo desse coelhinho
Ouço uma batida na porta,
A enfermeira entra e traz meu jantar
Eu não quero olhar mas meu estômago não me ajuda
Quando vejo a bandeja, lágrimas caem dos meus olhos
Faz dois anos que não vejo essa ceia
É a minha ceia de Natal
A que nós fazíamos juntos e comíamos com toda a nossa família
A que passávamos a tarde toda cozinhando
E que no fim era sempre você que salvava
Como pode?
Faz dois anos que como algo tão bom
O gostinho do seu amor está na comida
E eu choro mais a cada mordida
Quando termino, aperto seu coelho forte
Não querendo me esquecer do gosto
Faz dois anos que não ouço sua voz
“Sorria, flor. Eu estou sempre aqui com você”
Ouço, um sussurro apenas, e olho ao meu redor
A janela abriu e o vento faz as cortinas voarem
Olho pra fora e o vento me traz o som da sua risada
Fazia dois anos que não me lembrava da sua voz
Agora está tudo bem
Você está sempre aqui, comigo
Pra sempre

VOCÊ ESTÁ LENDO
Merry Christmas?
ParanormalOne-Shot Natalina (será?) ---- Isso lá é Natal? Eu me pergunto, abraçando meu coelhinho de pelúcia. Ele está sujo de sangue. Do seu sangue. O sangue que você derramou naquela hora, por minha causa.