Benjamin
Despeço-me da Mayana com um beijo longo e demorado em sua testa. O gesto é carregado de um carinho que eu queria poder demonstrar de outras formas, mas sei que ela jamais trairia alguém, mesmo que esse "alguém" não a tratasse como ela merece. O jeito como ela olha para o chão, envergonhada, enquanto entra em casa, só reforça o quanto ela é diferente.
Assim que a porta se fecha atrás dela, respiro fundo e volto para minha casa. No caminho até a cozinha, percebo minha irmã, Sophia, encostada na janela com uma postura furtiva e um brilho curioso nos olhos. Ela está espiando alguma coisa no quintal.
Caminho em silêncio até ela e sussurro, com um sorriso brincalhão:
— O que você tá espiando aí, Maria Fifi?Ela dá um pequeno pulo de susto, colocando a mão no peito, antes de apontar discretamente para o quintal.
— Olha isso, Ben.Sigo a direção do dedo dela e vejo algo que me faz congelar por um momento: minha mãe e o pai da Maya, seu Francisco, dançando coladinhos ao som de uma música romântica que vinha baixinho do rádio. Eles sorriem um para o outro de forma terna, e o jeito como meu pai a segura faz parecer que o tempo parou para eles.
— Será que estão apaixonados? — Sophia pergunta, com os olhos brilhando de emoção.
Dou de ombros, mas um pequeno sorriso surge em meu rosto.
— Acho que sim. E tudo bem também. Nosso pai nos abandonou quando éramos pequenos, e o Francisco é viúvo. Eles merecem ser felizes.Sophia suspira, com um sorriso ainda maior.
— Eu faria gosto dos dois juntos. Eles formam um casal lindo.Rio levemente enquanto me afasto da janela.
— Alguns amigos são destinados a ficarem juntos.— Assim como você e a Maya. — A voz de Sophia me para no meio do caminho.
Suspiro e me viro para ela, apoiando a mão no batente da porta.
— Acho que não. Já tivemos muitas chances nessa vida. Quem sabe numa próxima?Sophia me lança um olhar desafiador, cruzando os braços.
— Vai ser nessa vida, e não vai demorar. Vocês dois se amam, isso tá escrito na testa de vocês. Só precisam parar de fugir disso.Não consigo segurar o sorriso cansado. Caminho até ela, puxando-a para um abraço apertado.
— Se você diz. — Beijo sua testa com carinho. — Nem acredito que minha irmãzinha vai se casar. E com o puto do meu melhor amigo.Sophia ri e me empurra de leve pelo peito.
— Como você mesmo disse, alguns amigos são feitos para ficarem juntos. E, por ser melhor amigo dele, sabe melhor que ninguém que o Igor é o homem certo pra mim.Sorrio de lado, a sinceridade em sua voz me tranquilizando.
— Igor é um cara bacana. Você também é incrível, Sophi. Vocês se merecem.Depois dessa conversa, subo para o meu quarto. Preciso de um banho e de um tempo para relaxar. Coloco meu videogame para rodar enquanto tento distrair minha mente do que acabei de ouvir e ver. Não demora muito para que Igor se junte a mim para jogarmos juntos, enquanto Sophia sai para passar o resto da tarde na casa da Maya.
Por mais que tente, não consigo tirar da cabeça a cena no quintal. Talvez Sophia tenha razão. Talvez alguns amigos realmente sejam feitos para ficarem juntos... em mais de uma geração.
Mayana
— Por que sua irmã tinha que marcar esse ensaio tão cedo? — resmungo enquanto entro no carro do Ben, ainda lutando contra o sono.
Ben ri, dando partida no carro e lançando um olhar divertido para mim.
— Porque a Sophi é perfeccionista, você conhece a amiga que tem.Não consigo conter um sorriso de concordância. Ele estava certo, Sophia era assim desde sempre. Chegando à igreja, não foi surpresa encontrar todo mundo com cara de sono, exceto as crianças que pareciam ter energia para dar e vender. Elas corriam pelo corredor da igreja, como se aquele fosse um grande playground.
Sophia, claro, não demorou a tomar o controle da situação. Ela se aproximou com aquele brilho determinado nos olhos.
— Bom dia, amiga! Pronta para o ensaio?— Bom dia. Me explica como vai ser, porque você sabe que sou desorientada de manhã. — brinco, mas realmente queria entender.
Sophia sorriu paciente e começou a detalhar.
— Primeiro, as duas floristas vão ficar no final do corredor entregando flores para os padrinhos, que serão os segundos a entrar. As mulheres ficam do lado direito, o lado da noiva, e os homens do lado esquerdo. Depois, o Igor vai entrar com a avó dele. A priminha dele entra logo depois, jogando as pétalas, e, por fim, eu entro com seu pai.— Certo, entendi tudo. E onde eu entro nisso? — pergunto, embora já tivesse uma ideia.
— Você e o Ben vão ser o primeiro casal a entrar. Entrem naquela fila ali. — aponta para o canto onde já havia outros dois casais se organizando.
Concordei e fui com Ben até o local indicado. Ele sorriu para mim enquanto entrávamos na fila, e eu senti aquele calor confortável que só ele conseguia provocar.
Depois de muito ensaio...
Parece que ensaiamos umas cem vezes. Sophia, no comando, não deixou ninguém sair sem ter cada passo decorado. Felizmente, tudo acabou fluindo bem, até mesmo as crianças, que precisariam de mais ensaios nos próximos dias para pegar o ritmo.
Sophia suspirou satisfeita, organizando os papéis com o cronograma.
— Bom, acabamos por hoje. Igor vai com meu irmão para provar o terno, e nós vamos ajustar o seu vestido e depois almoçar.— Sim, senhora sargenta. — brinco, arrancando risadas de todos.
Fomos até a loja onde os vestidos das madrinhas estavam. Sophia tinha escolhido modelos iguais para todas, em um tom de rosa clarinho, o que facilitou bastante. Depois de experimentar e ajustar o meu, seguimos para um restaurante. Pedimos lanches e, assim que dei a primeira mordida, suspirei de alívio.
— Hmmm, isso é uma delícia. Nem me lembrava mais do gosto. — murmuro, apreciando o sabor.
Sophia me olhou com a sobrancelha arqueada.
— Ah, fala sério, Maya. Não é possível que você não comia um lanche.Nego com a cabeça, rindo sem graça.
— Na casa do Marco, temos uma dieta balanceada. Nada de porcarias ou doces.— Credo! Por isso vocês vivem com aquela cara de quem chupou limão. — diz, fazendo uma careta exagerada que me arrancou uma gargalhada. — Quanto mais você fala dele, mais ranço eu tenho, amiga.
— Sophi! — repreendo, mas ela apenas dá de ombros, como se não se importasse.
— É sério, Maya. Quando você cair em si, vai ter um puta ranço dele. Você vai ver.
Resolvo não discutir. Talvez porque, no fundo, algo nela fazia sentido. Mas prefiro mudar o foco e aproveitar o lanche que tanto me fazia falta.
Depois do almoço, demos mais algumas voltas. Passamos por lojas de lingerie, maquiagem e acessórios. Sophia parecia mais animada do que eu, mas deixei-me levar por sua energia contagiante. Voltar para casa com sacolas de coisas que escolhemos juntas fez eu me sentir um pouco mais leve, um pouco mais como eu mesma.
Talvez ela estivesse certa. Talvez eu só precisasse me lembrar de quem eu era.

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Salva-me
RomansaMayana sempre teve o sonho de fazer uma faculdade, que de preferência fosse em outra cidade. Ela queria ser independente e viver uma bela aventura, o sonho universitário completo.⠀ ⠀ Mas ela não esperava que tudo fosse acontecer ao contrário. Suas e...