De volta ao horizonte

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Pryia relutou, e desejou que sua sabedoria e bom senso não dessem lugar a sua curiosidade. 

Ela conseguiu se enganar por poucos segundos. Pryia assentiu, mas antes que pudesse fazer alguma pergunta ao pirata, ele se virou e partiu, alegando que estaria de volta quando o sol estivesse no meio do céu.

Pryia calculou suas chances. Ela não tinha interesse em partilhar o seu desejo de vingança com um desconhecido. Ela não sabia quais eram os seus motivos, e principalmente não deixaria alguém roubar sua glória: Ver a vida de Leonardo se apagando dos seus malditos e lindos olhos cor de avelã.

Contudo, ela adorava a possibilidade de pegar uma carona e manter consigo as moedas que juntou todos esses anos. Pela primeira vez em muito tempo, ela sentiu uma ponta de esperança diferente no seu peito.

Ela não precisava mais pensar em sair dali. Ela podia começar a cogitar como seria sua vida de verdade.

Chegando na estalagem, Pryia abraçou o velho John que sempre foi gentil com ela, mesmo que fosse uma casca grossa por fora. Juntou em uma bolsa os seus pertences: um bloco de folhas de papel, um kit de desenho, algumas poucas roupas que ainda estavam em boa condição, e suas facas de cozinha.

Pryia não se incomodou em roubar do velho bondoso. Ele já enxergava muito mal, e ela temia pela integridade dos seus dedos. Seria melhor para ele ficar longe de lâminas afiadas.

E nem por todo o tesouro naufragado ela entraria em uma embarcação desconhecida desarmada.


***

O sol já havia passado do topo do céu, agora caminhando em direção ao horizonte. Logo escureceria e ela não via nenhum pirata muito menos algum tipo de embarcação por perto. Olive repousava no seu ombro, certamente questionando as decisões de sua amiga humana.

Os velhos marujos, já com seus navios devidamente abastecidos partiam de volta ao horizonte.

Levaria semanas para outro aparecer. E ela não havia vendido nenhum mapa hoje. Estaria presa nessa ilha por sabe-lá-Deus quanto tempo mais.

Ela começou a se xingar por ser tão idiota.

A xingar o pirata por não cumprir a sua palavra.

A xingar ainda mais alto ainda por ter sido estúpida o suficiente ao acreditar na palavra de um pirata.

Ela o amaldiçoou.

Amaldiçoou o próprio naufrágio que tirou o seu nome. Pode jurar que o mar se revoltou em resposta.

Amaldiçoou Leonardo, simplesmente porque ela não perdia uma oportunidade para fazer isso.

E amaldiçoou sua inocência, que mesmo depois de tudo que passou e que foi forçada a sobreviver, insistia em se manifestar nos momentos mais inoportunos.

- Eu juro que algum dia ainda hei-de me vingar de você! Está agora na minha lista negra junto do maldito Leonardo!

- E como você vai escrever o nome de alguém nessa lista, se você não sabe o que anotar? - Ela não queria ter dado um pulo para trás de susto, mas já era tarde para isso. Então aproveitando o movimento brusco, Pryia agarrou na camisa perfeitamente branca e limpa do pirata e deu a sua raiva um destino certo.

- Escuta aqui seu patife, quem é você pensa que é...

- Oh meu amor, cuidado. Vai acabar descompensando o figurino. - Ele retirou seus dedos um a um com tanta delicadeza, que só a deixou mais irritada.

- Eu não sou seu amor. E você está atrasado.

- Isso é inteiramente culpa sua.

- Como eu poderia ser culpada do seu atraso?

A falsificadora de mapasOnde histórias criam vida. Descubra agora