Ato 1

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一 Tchau, amor! - Em um movimento rápido, a ruiva dá um selinho no seu amado e caminha em direção à porta, acenando para o mesmo enquanto observava a tela do seu smartphone.

一 Você vai andando? - Andrew sorriu para a mesma enquanto repousava a sua colher sobre a tigela de leite com cereais para que pudesse acenar de volta.

一 Na verdade eu vou com Ártemis. Ela já chegou, inclusive! Não posso me atrasar mais. Até! - Ela falava enquanto abria a porta e seguia com passos firmes e organizados.

一 Certo! Até mais tarde, amor! - Após ela fechar a porta, o rapaz volta a sua atenção para o seu Notebook digitando “Youtube” na barra de pesquisa do Google, mas a internet havia caído e ele não havia percebido – De novo? Não sei por que eu ainda pago isso...

O relógio de gatinho estalou indicando que já eram 13:30, o horário do seu remédio. Andrew subiu as escadas vagarosamente, deslizando as pontas dos seus dedos no corrimão de madeira envernizada até chegar ao seu quarto. Sua porta estava aberta, assim como as persianas. Uma mesinha ao lado da cabeceira da sua cama de casal suportava a caixa de comprimidos roxos. Sua cabeça doeu, ele não entendeu o motivo, pensou em uma simples dor de cabeça comum em qualquer pessoa, mas essa acabara vindo com muita força e subitamente, latejando o canto superior esquerdo da sua testa, ele sente como se estivesse recebido um soco naquele exato ponto. A dor o vence e o faz  cambalear. Já tinha sentido dores fortes, mas essa acabou lhe fazendo pensar direito sobre o que ele já havia chamado de dor.

一 Esses remédios não funcionam? - Falou Andrew enquanto usou a sua mão esquerda para pegar a caixa de comprimidos, levando a sua mão livre até o ponto castigado pela dor em sua sua testa.

一 Não.

一 Hã? - A caixa do com os comprimidos acaba escapando da sua mão por conta do susto. Sua dor cessou, ele rapidamente percorreu com os olhos todas as dimensões do quarto, dando alguns passos para olhar por entre as cortinas, debaixo da cama, no banheiro e até mesmo no guarda-roupas, esperando que realmente aquilo fosse apenas coisa de sua cabeça. Mas ele podia garantir que alguém respondeu a sua pergunta. O problema é que ele era o único dentro da residência.

                                                                    …

一 Ai eu amei o seu vestido! - Expressou Artemis.
一 Obrigada! - Kaya passava usava o seu indicador para levar uma mecha do seu longo cabelo laranja para trás da orelha, esse foi  um dos raros momentos em que ela demonstrou timidez.

一 É aqui!
Ártemis falava enquanto estacionava o carro e logo saía do mesmo. Seus novos saltos ainda a faziam perder um pouco o equilíbrio, mas ela tinha uma profissional no assunto ao seu lado para lhe ajudar a não cair de cara no chão 一 Ei, Kal! - Apelido carinhoso que Ártemis dera para a sua amiga.

一 Quer ajuda, amiga? - Mesmo tentando esconder, ela não conseguiu conter o riso, sua amiga adorava usar saltos, mas sempre foi um pouco desengonçada com eles.

一 Eu? Não. Eu consigo me virar sozinha. Veja e aprenda!

Artemis estava vestindo uma saia de tamanho médio e cor bege. Uma blusa rosa bebê com mangas até os cotovelos cobria o seu tronco, mantendo uma elegância e ao mesmo tempo a visão de inocente que inconscientemente ela passava para praticamente todas as pessoas que a conhecia. Seus saltos de 15 centímetros tinham um tecido muito macio, e um pequeno laço preto como o calçado o enfeitava de forma discreta. O céu estava lindo, um azul bebê o pintava, enquanto algumas pequenas nuvens claras e com formatos engraçados o repousavam em locais que pareciam ter algum tipo de conexão. Ambas pararam para observá-lo, até ouvirem uma voz masculina.

一 Senhora Griffin.
                                                                              …

一 Amor? - Kaya entrou em casa abrindo a porta enquanto chamava pelo seu amado.

一 Ele deve estar dormindo. - Disse Ártemis.

一 Impossível. - Kaya exclamou com uma certa risadinha interna. Seu namorado normalmente não dorme antes dela estar em casa.
Ártemis se sentou no sofá e decidiu ligar a televisão, deixando-a no volume 6 enquanto mudava a programação entre os canais de receitas culinárias e até mesmo luta livre. Quando ela olha para o lado, Kaya está subindo a escada da sua casa, então a menina dos cabelos cacheados volta a engolir pequenas quantidades do seu sorvete de menta com gotas de chocolate. - Tem gosto de hospital. - Uma gargalhada baixa escapa, ela não pretendia acordar o seu irmão com a sua risada alta.

Kaya sobe até o quarto, e para a sua surpresa, Andrew está dormindo, abatido pelo efeito sonífero do remédio. 一 Aposto que o seu dia foi cansativo… - Sussurrando o mais baixo possível para que não o acordasse ela lhe beija na testa, demorando um pouco até afastar os seus lábios tingidos na cor vinho pelo seu mais novo batom. Após guardar a sua bolsa na escrivaninha, ela retorna para a sala e senta-se ao lado de Ártemis.

一 Como você acha que ele está? - Cochichou Ártemis.

一 Eu não sei. Até quando será que vamos remoer isso? Até hoje ele se culpa por algo que claramente ele não teve culpa? - Seu tom de voz representou muito bem a sua tristeza e decepção. Kaya se culpa por não saber como ajudar o seu namorado.

- Ei! Não fica assim…

Ártemis lhe abraça em forma de consolação. Seu irmão ficou diferente desde o acontecido. O triste dia em que eles estavam voltando de viagem dentro de uma van, quando um cervo dos ventos aparece saltitando por entre a pista e por reflexo, acabou tirando o veículo que Andrew dirigia do seu caminho, tudo foi muito rápido, mas para eles parecia uma eternidade todos lá dentro acabaram se machucando, mas por sorte, andrew conseguiu retirá-los antes que o fogo começasse a se espalhar e levasse tudo à cinzas. Em dois dias todos já estavam em suas devidas casas. Todos menos a mãe do casal de irmãos, Mary, uma senhora de 74 anos com cabelos grisalhos e um rosto fofo rodeado de pequenas e alinhadas sardas que iluminavam seus olhos azuis como a água. Infelizmente ela não aguentou o impacto das batidas que o capotamento da van proporcionou e acabou falecendo.一 Vamos dar um jeito, ok? E eu prometo que ele não vai mais precisar usar remédios para controlar a ansiedade.

一 Ok! - Ela responde enquanto começa a entrelaçar os seus dedos uns nos outros como se quisesse dar um nó em uma pequena corda.

一 Então coloca um sorriso nessa cara porque a sua maquiagem tá um escândalo!

Isso foi o suficiente para arrancar um sorriso do rosto de Kaya. Ártemis sempre soube como fazer a sua amiga rir.

Do lado de fora da casa, elas ouvem um som de passos pesados na grama do jardim. A curiosidade não é grande o suficiente para fazer alguma delas sair do sofá para olhar, mas o medo começa a invadir a mente e paralisar os seus músculos de forma que elas dão as mãos e Ártemis desliga a televisão. A luz da sala já estava apagada, agora ambas estavam envoltas nas trevas, ouvindo apenas os passos que rodeavam a casa, sempre evitando o contato com as janelas. Kaya abre a sua mão e as suas veias começam a bombear a sua magia para todo o seu corpo.

Invasões não eram nem um pouco comuns naquele lugar. A coisa mais comum que se podia imaginar seria um esquilo entrando pela sua porta e comendo as panquecas que você fez para um café da manhã maravilhoso. As pessoas são muito tranquilas com os moradores, eles não costumam ter medo de interações, ou até mesmo de deixar as portas destrancadas.

一 A cidade é muito pequena. Se for alguém, conseguiremos reconhecer. Se for um animal, nós podemos esperar ele sair, ou poderíamos enviar uma mensagem para os monges da clareira celeste e pedir para eles buscarem. O problema na verdade… - Ártemis estava sussurrando praticamente dentro do ouvido de Kaya, tinham várias possibilidades, mas ela preferia nem pensar em ser uma das criaturas demoníacas. Monstros deformados com asas e patas como um grande animal. Matar é o seu único instinto, seu único comando é acabar com vidas. Ártemis já ouviu centenas de relatos que afirmam que eles já popularizaram 60% do planeta, o mesmo está morrendo. A simples presença de algumas dessas bestas é o suficiente para tornar um solo infértil. 一 Tem muito tempo que um desses não aparece por aqui, não é? Acho que os monges estão cuidando muito bem do domo espiritual.

一 Ártemis! É melhor você se preparar pra correr lá em cima e acordar Andrew. Tenho força para cuidar de mais de um. - A garota silenciosamente sobe as escadas, mas quando chega no quarto do seu irmão ela fica paralisada com a visão.
                                                                            

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