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Todos conversavam e riam alto pela nossa conquista. Parecia um sonho se tornando realidade, mas Luke estava sentado um pouco longe dos outros, bem no cantinho de uma mesa, onde mal dava para vê-lo naquele ângulo. Todos comemoravam a notícia de que finalmente faríamos nossa turnê pelo país. Meu pai, nossos amigos e colegas de trabalho cantavam e brindavam pelo salão.

Porém me distanciei de toda aquela alegria por alguns minutinhos. Me levantei com duas taças na mão e fui em direção ao vocalista. Estendi a mão com uma taça de champagne para ele, que ergueu a cabeça e aceitou a bebida com um sorriso meio triste.

— Você deveria estar mais feliz que qualquer um aqui — disse me sentando seu lado e apoiando meu queixo em seu ombro, fazendo ele soltar um suspiro pesado e longo.

— Eu estou, mesmo — o olhei curiosa e ele dá um beijo no meu nariz — Mas é que o sentimento de ir embora de Los Angeles... Deixar tudo... — e todos. Eu sabia bem o que ele falava.

O fato de que eu teria que ir embora por meses, sem parar em um lugar fixo, longe do meu pai e do meu irmão ainda me assustava, mas a adrenalina e o sentimento de sucesso de anos de luta para fazer a banda dar certo era ainda maior e mais prazeroso. Luke teria que ir embora, sem ter ninguém pra dar adeus. E isso doía demais em mim imaginando como seria isso para ele.

— Mas estou feliz. Por nós — ele levantou-se de repente, me fazendo o olhar curiosa. Ele me estendeu a mão com um sorriso. Não era o sorriso mais sincero, mas ainda sim aceitei o acompanhar daquela maneira.

Ele me guiou até o centro do salão. Pude várias pessoas dançando, conversando, bebendo... A cena era incrível. Todos juntos reunidos para comemorar.

Luke, ainda de mãos dadas comigo, ergueu a taça.

— À Julie and the Phantoms — ele disse. Willie, nosso empresário deu um gritinho, fazendo todos rirem e repetirem a frase de Luke, em alto e bom som. Levantamos nossas taças entre risadas, mas eu não tirava os olhos de Patterson, que continuava com aquele sorrisinho triste.

Então pela noite, eu tive a ideia mais louca e imprudente de todas. E olha que eu já tive ideias péssimas.

Eram exatamente nove e dezesseis da noite, meu pai estava caído - quase hibernando - na cama por terem bebido um pouquinho demais pela tarde, o que me deu a oportunidade perfeita de escapar.

Eu vesti meu casaco e coloquei um tênis surrado qualquer. Sai pela porta dos fundos de casa, para ninguém me ver, mas todo aquele disfarce quase foi por água abaixo quando tropecei nos tênis de Carlos ou bati o dedinho na quina da mesa, o que me fez ter crises de raiva e dor silenciosamente.

Por isso só acontecia quando menos queremos?

Mesmo assim, havia conseguido, depois de tanto sufoco. Sentei na calçada de casa e pedi um Uber, colocando a localização de uma velha rua que eu conhecia bem.

Enquanto observava a rua iluminada pelos postes, o carro estacionou na penúltima casa da rua; a pintada de amarela. Paguei ao motorista gentil e respirando fundo, sai do carro meio nervosa.

Observei bem o quintal enquanto caminhava em direção a porta de entrada: o balanço velho que Alex, Reggie e Luke se balançavam pelas tardes depois da escola, me esperando para o ensaio. A velha casinha na árvore de Luke e Alex quando pequenos, antes deles conhecerem Reggie e passar ser a casinha dos três. E claro, a velha porta de tom meio avermelhado.

Depois de anos, eu estava ali novamente. Na frente da casa número 61, batendo na porta... mas dessa vez não foi para chamar Luke para ensaiar na minha casa, como eu fazia quando tínhamos 16 anos. Porém minha expressão de felicidade era a mesma em ver o senhor Patterson sorridente do outro lado, me convidando para entrar.

A sala não havia mudado nada. Estava enfeitada com fotos antigas de Luke mais novo, algumas fotos de Natais e outros feriados em família, porém elas finalizaram no ano de 2017. Foi o último Natal em família dos Patterson, quando Luke tinha 17 anos.

Dias depois, ele havia fugido de casa e passado a morar com Alex, mas depois ambos passaram a morar com Reggie após os Mercer descobrirem a sexualidade do filho. Logo depois, os três passaram a morar num apartamento pequenininho no centro da cidade, assim que os Peters se divorciaram e Reggie ficou em pedaços emocionalmente.

— Julie — ouvi a voz da senhora Patterson me acordar do transe enquanto olhava as fotos antigas. Ela me ofereceu um copo de água e eu aceitei, enquanto me sentava no sofá — Você cresceu e está linda — disse sorrindo.

— Obrigada — dei um sorriso tímido.

— O que a traz aqui, Julie? — perguntou o senhor Patterson, desligando a TV para me ouvir melhor.

— Eu queria dizer que nós estamos indo embora.

Mitch e Emily se entreolharam e me deram um sorriso. A mulher tocou minha bochecha, o que me fez ter um arrepio. A última vez que aquilo aconteceu foi quando ela me disse que Luke tinha fugido de casa a dias e ninguém tinha notícias dele.

Aquilo me lembrou dos péssimos momentos. A briga que eu e Emily tivemos após descobrir que Luke havia fugido por causa da banda e em como Mitch havia pegado o resto das coisas que sobrou de Luke na casa e jogou porta afora.

Decidi balançar a cabeça para afastar os pensamentos e tomei mais um gole de água. Deixei o copo de lado, enquanto observava o casal em minha frente.

— Ray deve ter um motivo, certo? — Mitch disse baixo, enquanto juntava as mãos, olhando a esposa.

—Não. "Nós" quer dizer a banda. Eu, Luke, Reggie e Alex... — disse devagar. Senti a mão de Emily se distanciar do meu rosto, enquanto eles me olhavam assustados — Vamos sair de Los Angeles para fazer uma turnê.

Eles ficaram alguns segundos se encarando e olhando de volta para mim. Então tirei alguns ingressos da bolsa e os entreguei. Lá estava escrito horário e local do show. Escrito com clareza que era o último em Los Angeles e que passaríamos meses fora.

— Dia 4 será nosso último show aqui. E seria muito bom ver vocês dois lá. O Luke gostaria muito — disse me levantando e arrumando a bolsa do lado do meu corpo. Mitch pegou os ingressos e Emily me deu um abraço apertado.

— Boa viagem, Julie — ela me disse antes que eu fosse embora. Eu sorri, torcendo para que eles fossem ao show. Acho que Luke merece vê-los mais uma vez. Pelo menos, uma última vez.

UNSAID EMILY | luke patterson Onde histórias criam vida. Descubra agora