5. Bússola (final)

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Chovia muito. As gotas geladas pesavam nos ombros de modo cansativo. Dois jovens vestidos inteiramente de preto caminhavam em um cemitério. Góticos? Não, eram xamãs que haviam acabado de exorcizar algumas maldições que estavam causando incidentes ultimamente. Não usavam guarda-chuva, pois ele iria atrapalhar, portanto os dois estavam mais que molhados. Os cabelos brancos de um deles formavam uma franjinha pálida em sua testa, os cílios espessos tinham gotinhas acumuladas, que se desprendiam e formavam novas. O outro, tinha suas longas mechas escuras presas em um coque, como de costume, porém estava bagunçado e ameaçava se soltar a qualquer momento. Tinha uma ruguinha preocupada em sua testa. Aquilo havia sido rápido demais. Chegaram e em poucos minutos haviam localizado e se livrado dos alvos naquele local. Fácil demais.

Mas, nesse momento, outra coisa o incomodava muito: estar perto de seu amigo, tendo a sensação estranha de rejeição e ao mesmo tempo ter que resistir ao impulso de desfazer aquela franja naquele rostinho perfeito, bagunçando aqueles fios e aquele rosto todo. Principalmente hoje que ele estava incrivelmente sensual molhado daquela forma. Droga. Talvez fosse mesmo sensato eles se afastarem e sentia-se extremamente irritado por isso fazer sentido. Sem falar nada, foi caminhando em direção a saída. De qualquer forma, haviam terminado seu trabalho ali.

Gojo estava nervoso. Tinha decidido ter uma conversa séria quando se encontrassem novamente e lá estava a oportunidade. Mas... em um lugar como esse? Além de tudo, o clima estava ainda mais estranho entre eles. Mais silenciosos que antes, sem piadinhas e seu amigo parecia de mau humor. Ele próprio se sentia irritado. Irritado com sua covardia, irritado com o olhar estranho do outro, irritado porque Geto, todo encharcado e com os cabelos molhados se soltando, era lindo demais para aguentar. Até aquela expressão irritada era linda. "Mas que droga, se controla! ".

– Suguru! – "Que saco! ". Estava tão ansioso que sua voz acabou saindo brusca demais. Pigarreou e ia prosseguir, quando o outro respondeu, igualmente irritado:

– O que? – O amigo nem se virou, só parou onde estava e inclinou levemente a cabeça.

– Ei, eu fiz alguma coisa? – A atitude do outro o incomodou tanto que fechou a cara e acabou mudando o que ia dizer. – Por que parece que eu estou fedendo pra você ficar longe assim?

– Ah, não é você quem está estranho? Que não consegue olhar na minha cara? – Disparou o moreno, virando-se.

– Eu...

– O que? Vai fingir que não? Você mesmo disse que não suporta mais ser meu amigo!

– Espera... o que??

– Não faz o sonso, não! Eu te escutei falando isso ontem. O que tá rolando? Ficou assustadinho depois de ter me confundido com seu ursinho de pelúcia aquele dia? Ficou com nojinho? – Droga, no fundo sabia que seu amigo jamais pensaria algo assim, mas não conseguia se segurar. Logo ele, que sempre mantinha a calma. As palavras simplesmente saíam e ficava ainda mais irritado por estar agindo de forma tão infantil.

– Só pode estar me zoando! Escutou minha conversa ontem, mas não escutou tudo né? Você entendeu tudo errado! Por acaso tem 5 anos? – Não estava gostando do rumo que essa conversa estava tomando, mas não conseguia parar, estava com os nervos à flor da pele.

Geto ficou vermelho. O que aquele cara, sempre tão infantil, estava falando? Quem ali era a criança? Como ele podia dizer algo assim?

– Não ouse... – Mas não se soube o que ele diria a seguir. Um par de garras escuras apareceu atrás dele antes que terminasse de falar e o atacou. Era mais uma maldição. Como não sentiram a presença dela?

Tudo aconteceu muito rápido. Eles eram treinados para reagir com velocidade a esse tipo de situação. O problema era que suas emoções atrapalharam seus sentidos e eles haviam se distraído, o que resultou em um atraso nos movimentos de ambos. A sorte daqueles garotos era a agilidade que aquele moreno possuía, pois ele ainda conseguiu desviar da maioria daquelas garras e, com a ajuda da técnica dos dois, conseguiram exorcizar. Ficaram mais um momento em alerta procurando por sinais de mais alguma coisa. Nada. Agora realmente não havia mais nenhuma. Respiraram aliviados e saíram rápido dali, agora que concluíram sua missão. Com a adrenalina, a briga quase esquecida, apenas como uma sensação incômoda.

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