Rosana Martins estava se sentindo muito receosa, ela tinha visto algumas conversas de seu filho com outros garotos pelo Facebook, seria seu filho gay? Ela nunca foi uma mulher homofóbica e preconceituosa, as coisas que passou em sua vida fizeram ela perceber que não importa quem a pessoa ama e sim o amor em si. Embora ela tivesse medo por seu filho, devido às outras pessoas e ao mundo, o que mais a indignava na verdade, não era o fato de seu filho talvez ser gay e sim que ele nem sequer conversou com ela sobre o assunto, será que ela estava se descobrindo ainda? Será que ele não confiava nela? Eram tantas coisas que se passavam pela cabeça de Rosana que ela nem parou para pensar em como seu filho podia estar se sentindo.
Apesar dela amá-lo muito e sempre ter feito tudo que podia para ele, ela tinha medo de como sua família reagiria, sua mãe e seu irmão eram importantes para ela, o que eles pensariam se soubessem que Gabriel estava conversando com um menino de forma romântica? Eles mudariam com ele por ele ser diferente? Ela o amava, exatamente do jeito que ele era, os dois sempre estiveram juntos, nos momentos tristes, nos difíceis e também nos leves e felizes, além de mãe e filho, eles eram amigos e conversavam sobre muitas coisas. Porque ele não disse nada? O que as outras pessoas diriam sobre ele?
Sua mente estava muito confusa e um pouco apreensiva, ela tinha medo de imaginar seu filho sofrendo preconceito ou apanhando na rua. E se ele saísse de casa um dia e não voltasse vivo? Ela já tinha visto muitas notícias de homens gays que apanharam ou até que foram mortos por simplesmente serem gays, inclusive Rosana teve alguns amigos que sofreram homofobia com piadas ou que apanharam na rua.
Pensando sobre tudo isso, Rosana achou que o melhor seria conversar com alguém que pudesse entender. Nada melhor do que um amigo gay. Rosana foi até a casa de um amigo de anos para poder conversar com ele. Seu nome era Vitor Sales, mas todos o chamavam de Sales. Um homem de trinta e poucos anos que morava com seu gato em um apartamento, ele era solteiro, tinha cabelos ruivos e curtos e a barba também ruiva, usava um óculos arredondado, pois achava que esse tipo de óculos combinava melhor com seu rosto e ele não recusava um bom vinho, ele cheirava a perfume Malbec do boticário que aliás era também o nome da uva do seu vinho preferido.
- Sales - Chamou Rosana enquanto batia na porta do apartamento de seu amigo. Rosana sempre conseguia entrar no prédio em que ele morava sem interfonar porque Dona Maria, a senhorinha que trabalhava no condomínio como zeladora sempre abria para ela.
- Estou indo Ro - Respondeu ele gritando de longe.
Sales foi de encontro com a porta, abriu e pediu para que Rosana entrasse, ela se sentou no sofá, ela nem sequer tentou conversar sobre outro assunto e resolver ir direto ao ponto.
- Como é ser gay? - Perguntou Rosana meio sem jeito.
- Bem, é normal, porque você quer saber? - Sales estava achando meio estranho, porque apesar dele falar com Rosana muitas coisas sobre a vida dele, como relacionamentos, paqueras, trabalho e amigos, eles nunca tinham conversado sobre ser homossexual.
- Eu acho que o Gabriel é gay, eu vi uma conversa dele com um menino e me pareceu que eles se gostam. - Disse ela um pouco nervosa, enquanto esfregava uma unha na outra.
- E se ele for, tem algum problema? - Indagou Sales, querendo entender onde a amiga queria chegar.
- Bem, eu acho que não, você sabe que eu te adoro, que eu nunca fui preconceituosa, mas o que eu poderia fazer se ele for? O que minha mãe ia dizer? - Perguntou Rosana.
- Rosana, ele é seu filho, se você o ama, nada vai mudar, só se você fizer mudar, ele precisa do seu amor e sentir que você o ama e o respeita, talvez seja um pouco difícil ou estranho no começo, mas você pode tentar deixar um pouco mais fácil, se até agora você sempre o tratou com amor e carinho, porque mudaria algo? Se ele realmente for gay como você acha que é, isso significa que ele sempre foi, você apenas descobriu agora, então não tem porque fazer algo diferente do que já está fazendo, porque não é como se ele fosse deixar de ser gay. E sobre sua mãe, ela não tem nada a ver com isso, só resta ela respeitar.
As palavras de Sales caíram como uma luva, toda a confusão que estava na cabeça de Rosana havia sumido e apesar de não ter muita experiência com esse assunto, entendeu exatamente o que seu amigo queria dizer. Ela percebeu que realmente nada iria mudar se seu filho fosse gay. E porque deveria mudar? Ela agradeceu e foi até sua casa de volta, assim poderia conversar com seu filho a hora que ele chegasse da escola, antes que ela fosse para o trabalho. Rosana começou a fazer o almoço e ficou pensando no que diria para seu filho enquanto descascava o alho para fazer o arroz.
Gabriel abriu a porta, tinha acabado de chegar da escola, e foi direto para o computador, como sempre, todos os dias ele chegava da escola, gritava um oi mãe e corria para seu quarto para que pudesse jogar um pouco antes que o almoço ficasse pronto. Rosana queria muito conversar com ele sobre este assunto, mas ainda não sabia como e nem de que forma. Nunca havia tido esse tipo de conversa com seu filho e não sabia como chegar nesse assunto, se deveria ser direta ou se deveria jogar verde para colher maduro. Antes que ele pudesse entrar na partida de seu jogo, ela o chamou.
- Gabriel Henrique Martins, venha já aqui! – Ela o chamou de forma incisiva, estava ansiosa e acabou chamando como se fosse brigar com ele, mesmo que não fosse.
Ele veio andando como se tivesse feito algo errado, toda vez que sua mãe o chamava pelo nome completo era porque ele tinha feito alguma coisa, mas dessa vez ele não sabia o que poderia ter feito de errado, será que ele tinha se esquecido do que fez? Gabriel ficou parado na frente de sua mãe, olhando para baixo, como se tivesse cometido um erro. Toda vez que Gabriel fazia qualquer coisa errada ou toda vez que ele tentava mentir para sua mãe ele simplesmente não conseguia olhar no olho dela, então sempre olhava para o chão ou para sua mão, mas dessa vez ela sabia que ele não tinha feito nada, ela sempre sabia e mesmo que ele tivesse feito algo, agora nada mais importava. Rosana tomou coragem e finalmente perguntou a Gabriel.
- Você gosta de meninos? perguntou Rosana, achando melhor ir direto ao assunto.
Gabriel corou, mudou de cores muitas vezes, do rosa, para o vermelho, para o roxo e para o rosa novamente. Deu para ver que ele ficou muito envergonhado, parecia até que estava sem ar. Ele nunca havia ficado tão sem jeito em sua vida, principalmente em frente da mãe. Fez-se um silêncio por vários minutos, ele abria a boca várias vezes para tentar dizer algo, mas sempre tornava a fechar e acabava mudo, o silêncio estava ensurdecedor para os dois. Um não conseguia nem se quer entender o que podia estar se passando na cabeça do outro, os dois se amavam muito, mas tinham muito medo de se magoar e por esse motivo Gabriel não sabia se respondia que gostava de meninos ou se negava. Gabriel tinha muito medo, mas ao mesmo tempo não queria mentir para sua mãe, ele suspirou fundo e resolveu finalmente dizer a verdade.
- S-sim mãe - Ele respondeu tremendo. Seu corpo inteiro parecia estar em um terremoto de tão nervoso que estava. Gabriel não sabia se gostaria de ouvir a resposta de sua mãe, mas ao mesmo tempo queria que aquele momento acabasse. Para sua surpresa o que sua mãe falou foi muito melhor do que todas as vezes que ele imaginou se assumindo para ela, mas não tinha como ser de outra maneira, as coisas tem que ser exatamente do jeito que são.
- Filho, tudo bem se você for, eu vou te amar de qualquer maneira. Você vai continuar sendo meu filho sempre, isso não muda nada, a mãe te ama, você sabe... – Sua mãe não precisou nem terminar as palavras que estava dizendo, Gabriel se emocionou, os olhos encheram de lágrimas e ele abraçou sua mãe mais forte do que nunca, ele não podia estar mais feliz e mais aliviado.
Os dois passaram um tempo conversando sobre o assunto e apesar de Rosana ainda estar com algumas dúvidas ela ficou ouvindo seu filho, ela não sabia explicar como, mas sentia que não era uma situação diferente apenas para ela, mas também para Gabriel, algo que ele ainda estava aprendendo. Rosana o amava incondicionalmente e mesmo que fosse uma jornada difícil, ela estava disposta a lutar por seu filho e apoiá-lo.
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Cartas Para Um Suicídio
Non-FictionNão nos damos conta de como podemos deixar alguém mal ou como podemos tirar a vontade de alguém de viver, apenas com ações e palavras. Gabriel Martins é um menino que cresceu com vários problemas que aos poucos foram tirando sua vontade de viver. O...