2. entre cigarros e memórias

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Música Inspiração: Cigarette Daydreams - Cage the Elephant

Se passaram vinte anos, mas as memórias ainda continuam tão claras, intactas, como se tivessem acontecido ontem

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Se passaram vinte anos, mas as memórias ainda continuam tão claras, intactas, como se tivessem acontecido ontem.

Essa noite eu sonhei com você, com os seus cabelos vermelhos bem pigmentados e me lembrei das sardas espalhadas por todo o seu rosto. Eu conseguia te ver de pé do meu lado, estávamos dentro de casa e de repente estávamos lá fora, observando o tempo que passava lentamente ao nosso redor.

Eu acordei assustado, sem saber explicar o que estava acontecendo de errado. E então, as suas imagens tomaram conta da minha mente. Eu ainda me lembro daquele dia.

Estávamos sentados na mesa de jantar enquanto nosso pai falava sobre mais um dia estressante no escritório.

Com o garfo você remexia os brócolis que estavam no prato. Eu a ouvi suspirar e quando a observei, você desviou o olhar. Naquele dia eu soube que algo errado estava acontecendo porque eu podia ver a sua tristeza mesmo atrás daquela carinha de bebê.

A sua alma era doce, uma sonhadora nata, que por algum causa (desconhecida por mim) perdeu o motivo que te fazia sonhar. Em qualquer lugar você parecia deslocada, não parecia se encaixar por mais que tentasse. Nos seus olhos haviam um eterno vazio.

Apesar de toda a sua doçura, a sua tendência sombria e maliciosa a levou.

Era de madrugada e eu estava deitado na cama, com um livro nas mãos, quando a vi apanhar suas coisas e ir embora. Sem perder tempo eu a segui pelo corredor. A segurei pelos braços enquanto você se debatia, até começar a chorar. Eu a abracei até que se acalmasse. 

Se passaram horas.

Já era três horas da manhã, enquanto estávamos sentados na varanda, observando o céu nublado, fumando um cigarro e tendo vários devaneios e falando frases desconexas que nos faziam rir.

Até que você me deu boa noite, um beijo na bochecha e foi para o seu quarto, enquanto eu fui para o meu dormir.

Você tinha apenas dezessete anos quando resolveu tomar todos aqueles compridos em uma tentativa de encontrar a paz interior. Os seus olhos se fecharam tão receosos e nunca mais abriram. Naquela noite você se foi. 

Depois daquela noite eu nunca mais fui o mesmo.

E agora, mesmo após vinte anos, eu continuo dirigindo pelas ruas a noite toda, procurando por respostas enquanto a chuva cai. Se ao menos eu pudesse encontrar um motivo que explicasse porque você fez isso. Ou melhor, se eu pudesse achar uma razão para te fazer mudar de ideia naquela noite, um motivo para fazer você ficar.

E hoje, eu me encontro em pé na tempestade, enquanto observo o seu túmulo, lhe escrevendo essa carta, tentando procurar por uma resposta. Agora sou eu quem tenta encontrar a paz interior.

Eu espero que algum dia, em algum lugar, eu possa te encontrar e juntos possamos fumar mais cigarros enquanto rimos com tolices que dizemos.

Eu espero que um dia, eu tenha respostas para todas as perguntas que não me deixam dormir a noite.

Assinado: Charles. 

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