Eu ainda não havia me acostumando ao clima de Londres, para mim o outono conseguia ser mais duro que o inverno aquela sensação de friagem que te congela aos poucos e o vento incessante que deixava as minhas bochechas vermelhas e doloridas ao final do dia. Meus pensamentos se perdiam em outonos e se partiam nos invernos de Londres, os invernos solitários que a dois anos enfrento desde que deixei a ensolarada Fortaleza para chegar na nublada Londres vivendo num apartamento minúsculo, me vejo como Harry Potter quando vivia debaixo da escada dos tios na rua dos alfeneiros número 4, inclusive este é o número do meu apartamento, coincidência talvez, mas no fundo torço para que algo mágico mude a minha existência que de fato não é muito importante pelo menos ao meu ver. Quando enfim, o metrô para na Camdew Town Station e me vejo no exterior multicolorido de um bairro cult, para jovens ricos de diversas partes do mundo tudo que me vem a cabeça é o Maldito vento que deixa minhas bochechas vermelhas. Caminhando pelas ruas de pedras apinhadas de lojas, turistas ricos dos países do leste europeu e claro americanos com seus bonés de baseball e camisas de times de basquete que eu jamais vi um jogo sequer, eu continuava minha caminhada dez minutos até avistar a placa que dizia "Eldon Grove" a rua era ladeada por lojas e casas em estilo Vitoriano o número 12 era um sobrado com a fachada coberta por uma planta que eu desconhecia, as folhas estavam amareladas e caiam na frente da porta de madeira branca onde o número 12 em dourado ficava em evidência.
- Senhor Hugh disse eu batendo na porta.
Não ouve nenhum retorno, meu inglês ainda não era o dos melhores , confesso, mas ainda assim me fazia compreender.
- Senhor Hugh é da empresa de faxina, abra por favor, seu carro está aqui fora, abra logo.
Depois de um instante de silêncio ouço o som pesado de passos vindo em direção a porta que se abriu rápido. A minha frente estava Ted Hugh um homem alto e forte de olhos azuis pálidos e um cabelo ruivo cacheado que o fazia parecer estranhamente esquisito mesmo sua aparência sendo de um ator Hollywoodiano de filmes da Marvel ou da DC.
- Bom dia senhor Hugh disse eu.
- Me chame de Ted, senhor Hugh é meu pai.
- Ok Ted, vim para a faxina.
- Você? Ele falou me encarando de cima a baixo.
- Já estava acostumado com os olhares dos Londrinos, certo que sou um cara de vinte e poucos anos de um país distante que ganha pouco em uma cafeteira do outro lado da cidade e complementa a renda fazendo faxinas em um bairro chique. Mas acredito que o choque maior seja o fato de ser um homem que ganha a vida limpando a casa dos outros.
- A senhora Davis, faleceu então a June me mandou no lugar dela, Algum problema Ted?
- Não nenhum, disse o senhor Hugh.
- Então, pode me deixar entrar?
- Claro disse o inglês ou escocês seu sotaque era ligeiramente diferente. Uma dica os ingleses falam um pouco mais pausadamente o que torna mais fácil entender o que eles dizem, foi o que me salvou ao chegar aqui, e não acreditem em nenhum cursinho de inglês ai no Brasil, se tiver a oportunidade de sair daí e aprender com os nativos.
Pois muito bem, o apartamento de Ted Hugh era uma zona de guerra com garrafas de cerveja excêntrica e roupas espalhadas por toda parte como se ele não tivesse a menor noção de higiene e organização básica.
- Senhor Ted, a quanto tempo ninguém limpa este apartamento?
- A última foi a senhora Davis disse ele sentando-se frente a um notebook.
- Ela faleceu a dois meses.
- Então dois meses ele olhou para mim com aqueles olhos azuis pálidos.
- Ok, apenas me diga aonde estão os materiais de limpeza.
- Eu não tenho essa foi sua resposta.
-Senhor Ted, eu não sou Jesus ou um Gênio da Lâmpada que em um estalar de dedos vou limpar este lugar que cheira a sexo, meias sujas e cerveja artesanal.
- Estão vamos comprar disse o homem procurando nos bolsos a chave do carro que estava parado a frente da casa.
- Nós?
- Sim, não vou deixar um estranho sozinho dentro da minha casa disse ele.
- E eu entraria no carro de um estranho por qual motivo.
- Se eu fosse lhe atacar já teria feito isso não acha?. Você tem o que 1.64 e uns 70 quilos, eu tenho 1.90 e 97 quilos eu te apagaria assim ele estalou os dedos.
- Você fala isso a todos? Pergunto.
- Apenas aos jovens que querem comprar produtos de limpeza disse ele caminhando em direção a porta.
- Helen Lovegood havia me falado para evitar os esquisitos por mais charmosos e ingleses que fossem, mas Ted Hugh parecia demais com o Superman para recusar a ida ao Mercado comprar sabão, alvejante e desengordurante.
O maldito vento do Outono ainda estava do lado de fora Ted Hugh caminhava a minha frente com aqueles ombros largos escondidos em um suéter verde escuro que deixava as labaredas de seus cabelos ruivos ainda mais vermelhos.
- Senhor disse ele abrindo a porta do carro para mim, me questionei naquele momento se as manchetes do dia seguinte seriam corpo de jovem é encontrado nas proximidades do riu Tâmisa.
- Mesmo vivendo na imundice consegue ser um cavalheiro.
-Está no meu DNA disse ele, não posso sujar a imagem do príncipe inglês, não é mesmo?
-Acho que a imagem de príncipe inglês foi suja quando vi suas cuecas penduradas no abajur.
Ted Hugh apenas rio e deu partida no carro, que eu julgo ser in tesla ou um Ford não tenho noção alguma de carros, motos ou qualquer meio de transporte que sejam ônibus ou trem, e ainda assim não vejo muita necessidade de saber as marcas, o que ne interessa é que ele que ele me leve do ponto A ao ponto B.
- Então qual seu nome? Perguntou Ted após ligar o rádio aonde a canção que um dia representaria algo a minha vida começava a tocar " My, my, At Waterloo Napoleon did surrender"
- Hélio disse eu!
-Ilio? Falou ele.
- Não Ted, H-É-L-I-O.
-Acho que irei demorar a aprender seu nome ele disse. Enquanto o carro virava levemente a esquerda e estacionava em frente a um mercado.
- Então vamos disse eu descendo do carro o maldito vento outonal me incomodava de uma maneira incrível.
- Ainda não se adaptou ao clima Ilio?
- Primeiro é Hélio senhor Ted, e segundo, não consigo me adaptar a este vento diabólico que congela minhas bochechas.
- Na Rússia é bem pior essa foi sua resposta ao entrarmos na agradável loja aquecida.
- Vá buscar o que precisa enquanto eu compro umas coisinhas.
Camisinhas e cerveja de procedência duvidosa pensei eu me dirigindo a seção de material de limpeza, o que me deixou muito chocado o preço de um limpador de janelas em um bairro chique consegue ser o triplo do preço do que o do bairro em que moro, mas como não sou que irei pagar acabei por escolher o mais caro para por na cestinha de plástico azul do mercado.
- Eu ainda quero permanecer rico Ilio disse Ted ao ver os diferentes itens em minha cesta, e você deve maneirar no álcool senhor Ted, quero continuar a receber pagamento advindo de sua fortuna.
Ted Hugh riu com aqueles dentes quase perfeitos o incisivo direito era ligeiramente torto não entendo muito de dentes, mas acredito que uns dois anos de aparelho ortodôntico resolveriam o problema, mesmo que fosse um problema tolo, o que é um dente para quem é um cosplay de Superman com sotaque escocês.
O senhor Ted Hugh e eu deixamos a loja, ele não havia pegado camisinhas como pensei ou álcool, mas carne e alguns legumes que eu torcia para que eu não fosse designado a preparar, uma vez que eu apenas sei apertar o botão descongelar em meu micro-ondas, quando chegamos a Eldon Grove o carro parou silenciosamente diante do apartamento número 12 onde seguimos as nossas funções. Confesso que a pior parte foi retirar as manchas de Deus sabe o que do carpete seguindo pelo banheiro que parecia ter sido o local de um assassinato, mas ao menos o limpador três vezes mais caro se mostrou eficiente para retirar a crosta de sujeira de quase tudo exceto do box, pois era apenas um limpador de vidro não um removedor de cracas quer era o que aquilo mais parecia. Enquanto ao senhor Ted Hugh permaneceu quieto em frente ao computador durante boa parte do tempo.
Por volta das 16 horas o apartamento número 12 as Eldon Grove estava limpo e sem odores de origens mistas.
Quando desci ao térreo lá estava ele Ted Hugh a cozinhar algo como um chef com direito a chapeuzinho e tudo.
- Bem senhor, eu já terminei nos vemos na próxima semana.
Ted Hugh olhou para mim desviando a atenção da carne que assava sob uma frigideiras antiaderente.
- Pensei que fosse ficar para jantar disse ele.
- Eu não acho que seja adequado senhor Ted.
- A June vai me encher na empresa, e eu não quero ter de ofender a mãe dela.
- Bem, eu não irei contar a ela.
- Deixamos para um outra ocasião senhor, até mais.
- Como vai para casa ?
-De metrô senhor Ted.
- Eu posso lhe deixar em casa se você quiser.
- É um pouco esquisito não acha?
- De fato Ilio, mas Londres é uma cidade muito perigosa disse Ted.
- Eu sei me cuidar, mas obrigado pelo convite e pela carona senhor Ted, até semana que vem senhor Hugh.
- Eu não sou o senhor Hugh já disse ele riu, até mais e desculpa se estou sendo meio estranho.
Deixei a casa do senhor Ted Hugh sem entender meio o que estava acontecendo, enquanto voltava para a minha longa jornada até meu apartamento em Hoxton.
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TED e HÉLIO
RomanceRecém chegado a Londres o jovem Hélio trabalha meio período fazendo faxinas em um dos bairros mais chiques da cidade enquanto trabalha alguns dias na semana em uma cafeteria no outro lado da cidade. No entanto, sua vida muda quando ele começa a...