Através de desbotado esquecimento
os túneis sórdidos vagueiam,
manchados com pesadelos,
Acercados no tato de milenar escuridão.
Salões e corredores intercalam-se,
vertentes infindáveis, esticadoras
de obscuro domínio.
Jaz, em silenciosa e irretocável majestade,
aquela que detém o comando das dunas,
das poeiras e dos pilares atemporais;
aquela que em cega liderança mantém-se firme,
saciada ante meditativa e escura paz.
Jaz, sobre as ossadas dos adversários finais,
sobre o assento pálido e empoeirado,
Alkahena, que nada governa.
A Tecelã das Entranhas, Arbella de Arsagna
Desgastado e ruidoso era Jhuud. Um ermo selvagem, com cheiro de solidão e velharia. Um pedaço do mundo que ansiava pelo toque erosivo da mácula irrefreável do tempo. Como um lembrete de origem imemorial, seus alicerces de idade indizível permaneciam intactos, estátuas arenosas contorcidas como vermes anelados que se ergueram em almejo à lucidez do firmamento, mas que se interromperam, para sempre, numa comunhão labiríntica de anéis sobre anéis.
Em densa vigilância, a decadência pairava sobre Jhuud, mas sem jamais intervir. Assim, imutáveis mantinham-se as Entranhas de Jhuud, cujo contemplo dos céus fora cortado pelas estruturas titânicas de pilares curvados, os arquitetos de sombras quilométricas sobre empoeirada vastidão.
Através dos largos arcos formados pela interseção dos pilares, sob os sopros quentes e cortantes do deserto, aventurava-se um grupo de itinerantes. O cansaço provindo do árduo vagar sobre o mar de areia cerrava-se sobre os ossos e músculos como uma mão invisível, elevando os desejos compartilhados de imediato descanso. A sede, saciada fazia um punhado de horas, reiniciava sua costumeira intrusão no bem-estar dos viajantes, desmoralizados debaixo de córregos de suor.
Os passos pesados, embora determinados, do responsável pela dianteira do grupo, Abbád Lyth, esmagaram as areias sombreadas por uma das enormes estruturas vermelhas. Denotando aprofundamento e maciez elevados em relação ao terreno anterior, ergueu o grande cajado que empunhava e o bateu contra o solo. Quando a base de madeira mergulhou debaixo dos grãos com relativa facilidade, ele girou sobre os calcanhares e sua grave voz ergueu-se num grito contra o sopro incessante de Jhuud:
— Enfim, camaradas, as areias abrandam-se! — Ele acenou com a mão enluvada. Seus três companheiros, até então tomados pelo desânimo, sobressaltaram-se surpreendidos diante das palavras de esperança, desfazendo a postura curvada e apertando o passo. Enquanto aguardava a iminente aproximação do grupo, Lyth ajeitou o cachecol cinzento que lhe ocultava o rosto e ajoelhou-se, apertando com força os nós dos revestimentos improvisados do cano das botas.
Em poucos segundos, a silhueta miúda e esvoaçante de Arbella ocupou sua visão. Pontas de fios de cabelos morenos, colados à testa pelo suor que se renovava, despendiam sob o capuz que delineava seus amendoados olhos castanhos. A severidade do clima era realçada pelo aspecto que seu rosto moreno revelava: a pele fora queimada pela constante exposição ao sol, e os lábios, castigados pela secura, estavam rachados e descascavam. Na cintura, amarrado a um cinto de couro, soluçava um odre reabastecido há algumas horas através das habilidades de Abbád Lyth. A capa negra, de lã, possuía as laterais unidas por um botão na altura da gola, e rastros de areia aderiam-se à superfície gasta do tecido, matizando-a sob os tons da agressiva aridez.
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A Imperatriz das Dunas
FantasíaHá anos os povos do mundo contam sobre o sumiço repentino de Alkahena, a Última Imperatriz de Jhuud, e de seus domínios de majestades insonháveis. Da noite para o dia, as cidades, os baluartes e as maravilhas arquitetônicas do Império de Alkahena de...