CATARSE - Uma canção para um serial killer

Capítulo 1

DENTRO DO CARRO DE GABRIEL – NOITE

Gabriel

"Quando você for se embora,

Moça branca como a neve, me leve.

Se acaso você não possa me carregar

pela mão, menina branca de neve,

me leve no coração.

Se no coração não possa por acaso

me levar,

moça de sonho e de neve,

me leve no seu lembrar.

E se aí também não possa

por tanta coisa que leve

já viva em seu pensamento,

menina branca de neve,

me leve..."

Prostituta

- É lindo. Como se chama?

Gabriel

- "Cantiga para não morrer".

Prostituta

- Que poeta...

Gabriel

- Ferreira Gullar? Sim. Um dos maiores.

E os dois dão um leve sorriso.

Prostituta

- Que estranho. Um verso tão lindo. Costuma seduzir suas vítimas com versos lindos?

Gabriel

- Vítimas? Adoro esta palavra.

Prostituta

- Você é lindo.

Gabriel

- Como você encara esse mundo, esta tua vida, sendo mulher de tantos homens?

Prostituta

- É igual comer brigadeiro de colher, sem colher. Horrível e bom, difícil mas necessário. Tudo passageiro. Todos os meus sonhos se foram quando optei por esta vida. Drogas, álcool. Fumo feito uma louca, bebo e vou me prostituindo, me destruindo, algo que já me corroeu bastante por dentro. Assim eu vou levando a vida e deixando a vida me levar.

Gabriel

- Como foi comigo, Rose?

Prostituta

- Muito bom. Mas quando chego em casa e me deito, me vem uma angústia sombria. Algo que me sufoca, tira minha respiração. Sem sonhos, sem nada.

Gabriel

- Gosto do seu nome, Rose. Quem escolheu?

Prostituta

- Rose Mary.

Gabriel

- Rose Mary. Mais bonito ainda. É um nome, bem, como posso dizer...

Prostituta

- Um nome que não condiz com a minha realidade? Depende do ponto de vista. Lê a Bíblia?

Gabriel ignora sua pergunta.

A fria e majestosa garoa cai suavemente na cidade de Portland, criando um cenário perfeito para encontros românticos e secretos. Um ambiente calmo e silencioso num local afastado e pouco iluminado perto de uma lagoa torna qualquer intenção, obviamente, oportuna.