Ato VI - A realidade se tornou dolorosa e pesada

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Lá estava àquela praia.

Anne e Tom foram caminhando, primeiro sobre a areia úmida e mole, depois sobre a areia grossa que se agarrava aos dedos dos pés. Queriam seguir descalços e deixar os sapatos ali, mas uma voz advertiu-os de que isso não seria bom:

— Você pode não os encontrar depois, e talvez precise deles se ainda estiver aqui ao anoitecer, quando começar a esfriar. Acredite em mim, não vai querer estar descalço quando esse belo sol for embora.

Anne e Tom viraram o rosto para verem um velho de cabelo desgrenhado e branco, que lhe encobria a maior parte do rosto, além da cabeça. Ao ver a figura estranha, Tom se ajoelhou perante a água (não conseguindo mais suportar as dores fortes que latejavam no seu braço, que estava rasgado do cotovelo até as costas da sua mão. Eram cortes profundos e o sangue avermelhado já tinha enodoado a água e as roupas de Tom) e ergueu sua mão esquerda, insegura e pusilânime, para o senhor de cabelos estranhos. Que a segurou com um olhar de clemência.

— Ora, ai está uma coisa que não se vê todos os dias — tornou o velho homem a falar — Que precisa ser considerada: e com muitíssima atenção. Por exemplo, se me desculpe à curiosidade, o que aconteceu com você, meu jovem rapaz?

(“Ah, senhor é uma longa história. Na verdade, nem deveríamos estar aqui nessa ilha deserta. Quer dizer, deveríamos estar inconscientes ou, no máximo, acordar em uma cama de hospital. Aconteceu algo terrível com os pais do Tom”) — respondeu Anne, maquinalmente. Mas o velho homem continuava a olhar e esperar pela resposta de Tom, como se Anne não tivesse perguntado nada. Foi então, que de modo repentino, a menina se lembrou de que estava ali apenas como uma plateia invisível e que sua voz não era nada além de um simples vento que trafegava por aquelas redondezas.

Ainda ajoelhado e sentindo fortes dores, Tom ergueu uma sobrancelha, com um sorriso froixo no rosto, e disse: — Neste momento, quero mais beber água que explicar alguma coisa.

— Mas que indelicadeza essa minha. Mas é claro que sim, meu jovem. Moro naquela cabana ali, além daquela floresta, em cima do bosque. Posso te ajudar a ir caminhando até lá. Precisamos cuidar desses ferimentos...

Aposto como não o seguiriam, certo? Mas o garoto estava com tanta sede que decidiu confiar, cegamente, naquele velho senhor simpático.

Com o braço de Tom envolvido ao seu pescoço, o homem começou a caminhar ao longo da praia, com o mar à esquerda e a mata à direita. Fora uma ou outra gaivota, era um lugar de todo tranquilo. A mata era densa e emaranhada que quase não se podia olhar para dentro dela, e nada lá dentro dava sinal de vida, nem um pássaro, nem se quer um inseto.

Conchas, algas e anêmonas, ou pequenos caranguejos nas poças das rochas, tudo isso é muito bonito; mas, quando se está com sede e com o corpo todo machucado e cortado, fica-se logo cansado de tudo. E Tom desmaiou, desabando no chão, juntamente com Anne.

Quando se acordou, depois de muitas horas, ergueu a cabeça e procurou pela luz do sol, mas a única coisa que via era uma bela lareira acesa. O velho homem tirou do fogo um tição e acendeu um fogareiro.

— Não sei se gosta de chá, meu jovem, mas colhi erva cidreira para preparar alguma coisa para aliviar nossos nervos — dizia o senhor, pondo a chaleira no fogo — Não vai demorar nada. Você dormiu muito desde que o trouxe para cá, está se sentindo bem? O braço ainda está doendo?

Ao invés de respondê-lo, Tom começou a olhar ao redor da cama para ver, realmente, aonde estava. E nunca estivera em um lugar tão agradável. Era uma cabana quentinha e limpa, aberta numa rocha de tons avermelhados, com um tapete no chão e três cadeirinhas. Havia ainda uma mesa, uma prateleira e uma chaminé por cima da lareira.

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⏰ Última atualização: Feb 18, 2015 ⏰

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