A Menina Branca (Degustação)

Prólogo

O dia do Expurgo...

A cidade ardia. O Vhray voava enlouquecido no céu. No chão, as pessoas corriam feito uma manada desgovernada. Havia gritos desesperados, olhos arregalados e sem foco e mentes despedaçadas pelo terror que presenciavam.

A garota parada no meio da multidão teve os ombros esmurrados várias vezes pelas pessoas fugindo e, mesmo sentindo o suor frio descendo pelo rosto e o coração acelerado, não conseguia se mexer. Seu corpo não respondia aos seus comandos. Tudo o que podia fazer era observar o seu mundo desmoronando diante de si.

Um ruído alto e terrível tirou-a daquele torpor. Cerrou os dentes e tapou os ouvidos. O chão tremeu sob seus pés e uma pedra acertou seu rosto com a força da explosão que acabara de acontecer. Sentiu em seus dedos o calor do sangue escorrendo pela pele sem realmente sentir. Havia coisas mais importantes para focar agora do que aquela pequena ferida.

Porque o que acabara de explodir era o hospital improvisado no porto, a última esperança dos afetados pela praga que consumia a cidade. Ele se tornara uma chuva de cinzas e um monte de entulhos em questão de segundos. Ainda tinha pessoas lá dentro... O mundo começou a rodopiar e ela quase foi ao chão quando entendeu o que aquilo significava.

Não havia como escapar. Sabia disso agora.

Pensou em sua mãe, que perdera um filho para aquela praga maldita, e que agora perderia a única filha. Sequer teria a chance de se despedir dela, de ver seu rosto uma última vez...

Pensou em Val.

Ela ainda lhe incitava tantas contradições, mesmo em meio àquela loucura. Não sabia se a odiava ou a amava. Se sentia remorso e pena... ou se acreditava que tudo o que aconteceu até ali foi apenas a justiça divina.

Mas quando viu o Vhray lá no alto, sobrevoando a cidade feito um pesadelo, a própria imagem monstruosa da dor e do ódio, ela teve certeza de duas coisas.

A primeira era que a destruição da cidade foi culpa sua.

A segunda era que, se pudesse, trocaria sua vida pela de Val naquele exato momento.