Teve ainda mais dúvidas quando, sem aviso, as bordas meio pendidas de sua tenda se abriram de súbito, e a voz do comandante do exército o despertou do mais doce sonho:— Senhor trovador, sua majestade deseja vê-lo!
— Agora? — Perguntou, inquieto. Lampejos daquela pelagem negra ainda transpassavam por seu olhar sonolento.
O comandante deu de ombros.
— Ele não consegue dormir.
Frustrado por ser tirado da cama àquelas horas, o trovador se levantou. Estava prestes a seguir o comandante quando este ergueu a mão, interrompendo-o a meio caminho.
— Melhor levar seu alaúde.
De fato, a recomendação do comandante fora certeira, pois, no momento em que o trovador entrou na tenda pertencente ao rei, este o encarou com satisfação. Diante dele e sobre o tampo da mesa, um mapa de largas proporções se estendia. Com uma espiadela, viu que os contornos mostravam as terras do Reino, as quais ocupavam o Norte. Todavia, havia também uma porção completamente verde: as terras ermas, cujo território desconhecido o rei trataria de tomar, em um feito inédito, no raiar da manhã seguinte.
— Senhor trovador, que bom que está aqui! — Exclamou o rei. — Como pode ver, a ansiedade pelo amanhã me retém desperto. Sei que está tarde, mas desejo aproveitar o momento em que ainda possuo o senhor para que cante uma balada ou duas para mim.
Mesmo incrédulo, reverenciou-o.
— Como desejar, majestade.
O trovador alcançou as cordas de seu instrumento com uma familiaridade tal que mesmo a sonolência não foi capaz de o impedir de cantar uma bela canção. O rei estava entretido enquanto tragava de seu cachimbo, os dedos trilhando a demarcação das terras ermas com uma expressão esfomeada na face envelhecida. Na verdade, os presentes encontravam-se tão distraídos que não perceberam quando, de repente, o vento recomeçou seu uivar ruidoso.
Assim que o distinguiu, o trovador ameaçou interromper o movimento das mãos sobre o alaúde; porém, uma voz lhe sussurrou que ele não deveria fazê-lo. Então, prosseguiu.
E cantou uma balada. A balada das três raposas.
Desde os prados até as colinas,
Passando pela relva e pelos bosques,
Escondem-se criaturas altivas:
São as três irmãs-raposas.De focinho arrebitado,
E um olhar matreiro,
Elas assim foram criadas
Para não viver em cativeiro.Não brinque ou delas zombeteie,
Mas, mais do que isso,
Não tome o ventre da terra em que semeiam.
A terra não deve sangrar.
Oh não.
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A Balada das Três Raposas
Short StoryO Rei está prestes a tomar as terras ermas, região ainda inexplorada e, ao que se sabe, extremamente fértil e produtiva, além de nunca ocupada por nenhum ser humano. Para isso, convocou o seu exército, bem como o famoso Trovador das Guerras, com o i...