Capítulo II- Ciclos

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Existe um momento na vida no qual tudo aquilo que te representa, sua essência, é questionado por alguém. Um momento no qual suas maiores convicções serão testadas ao limite. Suas crenças, suas opiniões, seu caráter, sua sanidade mental, todos estando à prova. Para alguns isso ocorre uma vez na vida de forma memorável, para outros serão migalhas de acontecimentos que vão gerando dúvidas profundas. Geralmente alguém te fará uma pergunta, ou te colocará numa situação extrema para que isso ocorra.

E no meu caso, essa pessoa fui eu

Naquele segundo em que vi o copo vazio, um turbilhão de pensamentos passou em minha mente mais rápido do que um piscar de olhos. Aliás, foi quando pisquei que consegui externar alguma coisa:

-QUE DIABOS ESTÁ ACONTECENDO?

Quando dei esse grito, um fluxo de ideias se organizou em mim: Estou enlouquecendo.

Eu enchi o copo, ele caiu e quebrou. Eu sei que fiz isso, eu ouvi, eu senti a água umedecendo a pantufa, a qual não estava onde eu havia deixado antes de ir pra fora.

Eu sei que posso não ser a pessoa mais sã do mundo, mas eu tenho senso de realidade o suficiente pra saber quando algo acontece ou não.

Enquanto pensava isso, ficava olhando para o copo com uma expressão que misturava indignação, confusão e medo. Não fazia o menor sentido o que eu estava olhando.

Nesse meio tempo, fui puxado de volta à realidade com o vento frio que batia em minhas costas proveniente da porta de entrada que, agora, havia sido aberta. Não só isso, mas o casaco não estava ali, nem a bota. E foi nessa hora que o pânico se espalhou pelo meu corpo e eu comecei a tremer. Havia alguém lá fora.

Minha estupidez pode até ser considerável, mas eu não perguntaria “Tem alguém aí?” como nos  filmes de terror. Muito menos iria até lá sem saber qual a intenção daquela pessoa.

Corri para o quarto. Com o som dos meus passos, meus gatos que dormiam ao lado da cama, levantaram assustados. Fechei e tranquei a porta atrás de mim enquanto recostava-me nela, Tentando respirar e não pirar de vez. Mas hoje era um péssimo dia pra tentar manter a sanidade.

Ao lado da cama, o relógio digital marcava 03:33 da manhã, Sua luz vermelha dos números dava um ar estranho aos gatos. A luz era intensa, eu deixara assim justamente para não manter um abajur ligado. O relógio iluminava a beirada da cama, de modo a clarear o local onde eu costumo deixar a pantufa para facilitar encontrá-la caso acorde no meio da noite, tal como hoje. Mas o horário eu poderia apenas ter me enganado, no entanto o susto veio quando, me acostumando à escuridão do quarto, pude perceber a silhueta na cama.

As cobertas estavam sobre alguém, pior, estavam sobre alguém que deixou meus gatos confortáveis o suficiente para se aconchegarem ao lado da pessoa. Quando vi o vulto dos dois gatos subindo na cama. Dei um grito.

Os gatos deram um pulo para o outro lado. Eu me contrai ainda mais contra a porta, como se ela fosse me abraçar e proteger do que quer que fosse acontecer dali pra frente. A silhueta na cama se mexeu com o som que fiz, como se tivesse tomado um susto também. Jogou a coberta para o lado e sentou na cama, encarando-me.

Aquela troca de olhares que nunca chegaram a se encontrar pela escuridão durou alguns segundos. Meu coração acelerado parecia estar querendo atravessar a porta atrás de mim. Minha respiração ofegante aquecia o ar próximo ao meu rosto. Mas nenhum movimento foi feito por ninguém.

O interruptor estava ao meu lado, eu poderia ver quem estava ali, na minha cama, conquistando a confiança dos meus gatos, mas eu não queria isso. Que tipo de pessoa invade sua casa e deita na sua cama? Mas esse pensamento foi interrompido por um som. Abafado, baixo, porém perceptível.

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⏰ Última atualização: Apr 21, 2021 ⏰

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