Prey

79 7 2
                                    

Existem milhares formas de interpretação diferentes, é algo que passa de pessoa para pessoa. Mas nem tudo que parece, é o que realmente é. Existe apenas uma verdade e normalmente é aquela que as pessoas não querem enxergar.

Quando eu tinha 13 anos, fui para a diretoria da escola por roubar a maquiagem de uma colega. Bom, ela não era bem minha colega, nem mesmo nos falávamos, mas vez ou outra eu assistia ela se exibir com um estojo de maquiagem e então, eu simplesmente o peguei e coloquei escondido entre meu material dentro da minha mochila e voltei para casa. Logo no primeiro momento não entendi a necessidade que tive de ter aquele objeto em minhas mãos, era apenas eu estalar os dedos e meus pais poderiam me dar vários iguais ou até mesmo superiores. No dia seguinte quando cheguei na escola todos me olhavam acusatoriamente - este foi um momento em que as pessoas me interpretaram erroneamente - e a diretora já estava a minha espera, ela aconselhou meus pais a procurarem um psicólogo e foi ai que minha vida se tornou uma ruína.

Eu fui diagnosticada com Cleptomania, um distúrbio psicopatológico que faz a pessoa roubar coisas diversas, inclusive sem valor. Depois desse dia, meus pais começaram a me fiscalizar e procurar por coisas escondidas pelo meu quarto. Eles encontraram uma caixa em que eu mantinha tudo o que eu pegava. Seria mentira dizer que não me surpreendi com o que encontraram lá dentro. Havia desde pedaços de giz a peças de roupas caras, coisas que eu poderia ter facilmente ou coisas que eu nem me lembrava porque havia pego. Efeito colateral do distúrbio.

- Posso ajudar? - Uma mulher simpática veio me atender, sorri fracamente e neguei com a cabeça.

- Estou apenas olhando. 

A mulher continuou a sorrir simpática pra mim e se distanciou, suspirei. Abaixei a cabeça e sai da loja, evitando olhar para os lados. Segurava firme a alça da minha bolsa, nela eu carregava meu celular e milhares de cartões que meus pais fazem questão que eu tenha. Eles acreditam que se eu tiver maneiras de pagar por aquilo, não sentirei vontade de roubar. Tolos, não é como se eu tivesse escolha.

Meu celular vibrou, perdido entre os pequenos pertences que eu carregava ali dentro. Um sabonete, - este eu peguei quando vinha pra cá e passei em frente a uma farmácia. - brincos de bijuteria - este eu não sei porque peguei exatamente. - e um chaveiro que peguei na ultima loja em que estive. Sentia vontade de devolve-los, mas pareceria estranho voltar sem nenhum motivo aparente. Peguei o celular em minhas mãos, suspirando ao ler o contato.

- Oi. - Atendi, caminhando lentamente por entre as pessoas.

Onde você está, Alissa? - Disse raivosa. Odiava quando mamãe agia dessa forma, ela sempre ficava louca quando tinha algum evento promocional de sua marca de roupas. 

- Vim ao shopping mamãe. 

Alissa você não...

- Não mamãe, esta tudo bem, já estou voltando pra casa. - Interrompi.

Ótimo, venha logo, temos que chegar cedo na loja para recepcionar os convidados. 

- Estarei ai em um minuto. 

Senti algo bater em meu ombro e me virei rápido para me desculpar, embora não tenha sido minha culpa. A mulher que se chocou em mim passou direto sem ao menos olhar em meu rosto. A acompanhei se distanciar e automaticamente focalizei seus óculos presos no bolso externo da bolsa pendurada em seu ombro. Minhas mãos começaram a tremer involuntariamente.

Acompanhei os passos da mulher, os olhos ainda grudados no objeto. Acelerei, passando do seu lado. Minhas mãos passaram suavemente em torno do óculos e em um movimento rápido o passei para a outra mão, colocando dentro da bolsa em seguida. Continuei caminhando normalmente até decidir que já era hora de ir embora. Mamãe surtaria se eu me atrasasse para um de seus eventos.

- Você, pare ai mesmo. - Ouvi uma voz dizer alto atrás de mim. Continuei andando até ouvir passos se aproximarem. - Eu mandei parar, sua ladra. 

Senti duas mãos segurarem firme meu pulso e me virarem, me deparando com um dos seguranças do shopping. Ele puxou minhas mãos para trás do meu corpo e as prendeu com um lacre.

- Mas o que é... - Comecei a dizer mas fui interrompida. 

- Se explique para a polícia. 

O homem me arrastou pelos corredores do shopping, os olhos dos curiosos presos em mim. Quando notei, meu corpo era jogado brutalmente na cadeira de metal da administração. Um velho sorriu sarcástico pra mim e eu contorci meu rosto em uma careta.

- Creio que sabe porque está aqui. 

- Na verdade, não. - Menti

- Tem certeza que não sabe? - Apontou para um monitor sobre a mesa diante de mim, mostrando as câmeras do shopping. Diversas imagens começaram a passar, mostrando todos os delitos que cometi. Praguejava mentalmente, como eu podia não me lembrar de metade do que mostrava ali?

- Vocês querem tudo o que eu peguei, é isso? Esta na minha bolsa, é só pegar e me soltar daqui. - Me remexi desconfortavelmente na cadeira.

- Não é esse o ponto senhorita, não queremos uma ladra solta por ai. Iremos fazer o boletim de ocorrência e deixar isso nas mãos da policia. 

Neguei desesperadamente com a cabeça. Meu maior medo era chegar ao ponto ser presa e agora estava se concretizando por alguns objetos miseráveis. Odeio minha  vida, odeio não ser capaz de controlar meus próprios impulsos. 

Meu corpo foi empurrado novamente e me permiti afundar em pensamentos. Alissa Winston presa por roubo, já podia imaginar nas manchetes de amanhã e meus pais me olhando com desgosto mais uma vez. Não era minha intenção, desde que viera ao mundo, ser um estorvo na vida deles, mas era isso que acontecia com frequência. Eu não era uma boa filha, tampouco pensava nas consequências de meus atos. E por mais compenetrada que eu estivesse em tudo o que eu fazia, eu não podia deixar de fazer o que faço. Eu preciso roubar coisas.

Você leu todos os capítulos publicados.

⏰ Última atualização: Feb 23, 2015 ⏰

Adicione esta história à sua Biblioteca e seja notificado quando novos capítulos chegarem!

KleptomaniacOnde histórias criam vida. Descubra agora