CAPÍTULO 2: NOVOS E VELHOS AMIGOS

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19:30
A noite já havia caído a uma hora, Miguel encostava seu trator junto a um pedrão que ficava localizado na beira do mato que rodeava a lavoura que ele estava semeando. Ele desceu do trator e viu ao longe Jucá se aproximar com seu Ford, eles iriam jantar as quentinhas que a tia havia dado a eles, encheriam a plantadeira novamente e continuariam o trabalho até a meia noite, precisavam tentar terminar aquele campo hoje e ainda faltava alguns alqueires.
   Jucá desceu em silêncio do trator e sentou no estribo do velho Ford, esperando sua parte. Miguel abriu a tampa de sua caixa térmica, e examinou o conteúdo.
   -Más que diabos! - a exclamação foi a alto e bom som - a tia só colocou uma quentinha.
Ele observou Jucá murchar em silêncio ao ouvir aquilo, o cabra tinha ficado quieto o dia todo, e isso já estava lhe dando nos nervos, a luz do trator iluminava a face abatida dele, Miguel tinha fome, mas...
   -Toma guri, tu merece, pode comer, eu to de buxo cheio.
   -Obrigado, mas tu trabaiô bem mais que eu, devia comer - Nisso ele ofereceu a quentinha de volta, mas Miguel recusou
   - Trabalhei no ar condicionado, e com um trator bom, e tu numa imundícia caindo aos pedaços hahaha, anda guri come.
  O magrela abriu um sorriso e começou a devorar a comida, e logo em seguida que Miguel se acomodou sentado na pedra e ele puxou um assunto.
   -Cê viu que a filha do patrão, a dona Betina vem hoje? Já deve ter chegado até.
   -Óia eu não to sabendo nada dessa história, e também não tenho nada que ver com isso.
   -Má para home, todo mundo na fazenda sabe que ela é doida em ti, vê o que tu faz demônio, uma muié daquelas não aparece duas vezes.
   -Eu sei tchê, a guria é simpática, gente boa, e tudo mais... Mas não quero rolo com a fia do patrão.
    -Para de ser bobo, até o seu Pedro sabe que ela gosta de ti, e não se importa, aproveita.
    -Já deu né capeta, tu fala demais. - Miguel se recostou na pedra, baixando a aba do chapéu até cobrir os olhos e começou a pensar na vida e em todas as pessoas que tinham passado por ela, todos os amores que não tinham vingado, de todos os amigos que ele conhecia na sua cidade natal, apenas 3 ainda mandavam mensagens regularmente, ele não fazia falta lá, por isso não fazia questão de voltar, ele havia recomeçado sua vida e estava feliz... Ou quase isso.

    Miguel abriu os olhos alarmado, alguma coisa fazia barulhos altos no mato, e com certeza estava se aproximando deles. Jucá já estava de pé, e fazia sinal com os dedos para que ele não fizesse barulho, na outra mão havia um tubo de ferro que ele não sabia de onde tinha sido desenterrado, literalmente pois estava coberto de ferrugem.
  
    CLAC

Outro barulho, mas dessa vez muito mais próximo, provavelmente apenas cinco metros deles, e em seguida mais outro, e logo os arbustos atrás da pedra se moveram. Tateando por algo pra se defender, Miguel só conseguiu encontrar uma chave de roda
  "Melhor que nada" Esse pensamento o tranquilizou um pouco, pois o fez rir da própria desgraça.
   Após cinco minutos de mistério e mais uma série de sons, o motivo do alarme se mostrou, uma moça de cabelos desgrenhados e olhos assustados saiu de detrás da pedra e caminhou mancando até Miguel.
   -ajuda por fa... - e desmaiou bem na sua frente, como uma vela quando é assoprada ela só desmoronou em seus braços o deixando sem entender nada, mas uma coisa ele sábia, precisava ajudar aquela garota. Ele não tinha direito noção do que devia ser feito, primeiro verificou se estava respirando, e estava uma respiração fraca e bem lenta.
    -Jaguari, tu acha que ela ta bem? -a pergunta de Jucá o tirou dos seus pensamentos.
    -Eu preciso levar ela até um hospital - Ao dizer isso ele carregou a garota desconhecida até a cabine do trator, deixando-a confortável sentada no piso do trator encima de uma almofada de banco, que ele costumava levar consigo. Esperou Jucá desacoplar a semeadeira, e acelerou o trator rumo a fazenda, era três quilômetros até a sede, e isso deu a ele tempo de sobra pra prestar atenção na garota que estava sentada aos seus pés, ela tinha pele clara e cabelos escuros com mechas verdes atadas em um coque atrás da cabeça, era meio baixinha um metro e setenta no máximo, ela usava calças jeans rasgadas e ele não sabia se eram assim ou se ela tinha rasgado no mato, usava também uma camisa preta com estampa do led zepelim, e o que era surpreendente era que ela estava descalça, os pés pequenos tinham diversos arranhões e machucados, ela devia ter andando mais de 5 quilômetros no mato, mas por que, o que ela fazia lá.
   -Em que encrenca tu se meteu garota? -perguntou para ela, mesmo sabendo que não responderia, mesmo assim falou procurando uma resposta no ar, enquanto o cérebro criava milhares de teorias bizarras sem pé nem cabeça, e outras muito possíveis, ela podia estar fugindo de alguém, ou se perdeu enquanto acampava, podia ter batido a cabeça e enlouquecido. A garota tinha lábios carnudos, e bochechas arredondadas, o nariz era gordinho na ponta e tinha uma pequena curva no topo, ela era linda, era estonteantemente linda, era o tipo de garota que metia qualquer cara desinformado em uma fria, tinha quadris largos, seu cheiro era uma mistura de hortelã e folhas de eucalipto, algo peculiar, ele precisava parar de admirar a garota e focar na estrada e no que ele ia fazer.

     Todas as luzes do patio central estavam acesas, havia um pequeno movimento de carros na casa do patrão que ficava bem no centro da fazenda, um Jeep renegade branco que ele nunca tinha visto por lá, ao redor estavam o seu Pedro o dono da fazenda, a tia, uma garota que ele nunca tinha visto e também Betina estonteante como sempre. Miguel desceu do trator, pegou a garota no colo e a carregou até sua caminhonete, abriu a porta do carona e a acomodou no banco do passageiros, e claro afivelou o cinto, ele se sentou no banco do motorista e girou a chave, escutando ao mesmo tempo o som familiar do motor roncando embaixo do capô, e nisso acelerou estrada a dentro guiando até o hospital mais próximo.
    Já na metade do trajeto ele escuta seu celular tocar, era o Seu Pedro ligando.
    -Alô
    -O que esta acontecendo garoto, por que você saiu de pressa da fazenda essa hora? Jucá acabou de chegar aqui, falando tudo muito rápido e eu não entendi nada - O chefe dele que sempre foi um senhor simpático, parecia muito aflito na ligação, ele apostava que Jucá tinha tentando explicar e só tinha piorado.
     - É o seguinte senhor, eu estou levando uma garota que apareceu desnorteada nos seus campos pro hospital, não posso falar nada, estou dirigindo, ok?
     -Então tudo bem, me ligue mais tarde, quero saber direito essa história - E desligou.

Bah! PeãoOnde histórias criam vida. Descubra agora