Eu lavei, passei, cozinhei, limpei; assim como Amélia me pediu. O que mais poderia fazer?Tive tendências em me culpar, inclusive de maneiras insanas. Mesmo criança, pensava que eu poderia ter sido destinada ao inferno, ou que minha alma era corrompida e esse era o meu carma. Tinha certeza absoluta, de que nada que eu pudesse fazer iria acender um lado bom meu.
Em meu pensamento simples e infantil, eu faço o mínimo sendo obediente e serviçal, já que eu era um fardo.
Não via qualidades em mim mesma. Penso que era porque, uma criança, deve ser estimulada a admirar suas habilidades e qualidades para que possa explorá-las.
Minha mãe não perderia tempo tentando procurar meus talentos, tampouco os enaltecendo diante de mim, mas meu irmão fez esse papel.
O meu irmão realmente me amava. Diferente do meu inimigo, meus pensamentos próprios obscuros, ele não acreditava que eu tinha culpa do que Amélia constava. Tinha pensamentos além. Não era o tipo de pessoa que analisa como fatos pelo que vê e escuta e sim pelo que ele acredita ser correto. Nunca absorveria qualquer coisa que o dissessem sem dar atenção ao passado, presente e futuro.
Superficial não é nem de longe algo que o definia.
Admito que sou como ele, e não entendo de quem puxamos. De nossa mãe, era falta de cogitação. Porém éramos filhos de pais diferentes, então penso que, como ele foi uma única figura afetiva que eu tive, posso ter me inspirado nele por todos esses anos.
Apesar de tudo, eu tive sorte.
Poderia ter crescido ao lado de um ignorante e me tornaria insípida. Se eu fosse, como mencionei, superficial e tola, nunca teria chegado ao ponto em que duvidei das imposições da minha mãe. Teria um destino trágico, de certo.
-Maria? - escutei Luiz do outro lado da porta do meu quarto.
Havia se passado três dias desde que assumi o posto de dona de casa - ou escrava da casa. Passei a primeira e a segunda noite insones, consumida por diversas vozes que pareciam falar na minha cabeça mais alto que eu.
Meu irmão chamando por meu nome na porta do quarto me acordou e me fez perceber que compensei as duas noites sem dormir nessa e, deveria ter passado meu horário. "Mamãe deve estar furiosa" - pensei.
-Estou aqui. Perdi meu horário? - tinha levantado e vestido roupas adequadas em um minuto, e me apressei para abrir a porta.
-Claro que perdeu. Veja, são uma da tarde.
Estremeci e me perguntei como minha mãe havia me permitido dormir por tanto tempo, mas mantive o controle de mim mesma:
-Acha que terei tempo para terminar tudo o que devo fazer?
-Hoje não tem o que se fazer.
-Claro que tem.
-Não. Terminei tudo e deixei-a dormir, estava com tanto sono que podia ver seu pulmão inflar de ar e se esvaziar com tranquilidade enquanto sonhava.
-Não brinque. Mamãe jamais permitiria.
-Mamãe saiu hoje cedo, sou só eu e você.
Meu espírito aquietou-se em saber que poderia ter meu irmão com a atenção voltada para mim, uma vez que quando minha mãe está somos cruelmente separados por nossas tarefas - meu irmão estava em constate estudo para a medicina, mesmo com quinze anos. Mas precisava me certificar antes de qualquer comemoração:
-Lavou a louça?
-Lavei.
-Lavou a roupa?
-Sim.
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Apenas Maria
RomanceMaria, filha do meio de Amélia: uma mulher promíscua, fora dos padrões exigidos de sua época (anos 1920). Tinha três filhos, cada um com um pai diferente. Maria era a segunda, nem mesmo ela sabia quem era seu pai, diferente dos seus irmãos que tiver...