Prólogo

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França, 30 de setembro.

A sua respiração acelerada junto do barulho de seus próprios passos era quase imperceptível, poderiam facilmente ser ignoradas em vista do silêncio e vazio que pairava. Qualquer morador do castelo poderia deduzir que o ruído pertencia a algum criado convocado em meio a madrugada, porém, a pessoa que corria em desespero não era ninguém menos que a senhora da casa, com o seu filho nos braços. A duquesa viúva sentia a sua pele arder em contato com o vento gelado, também sentia seus joelhos fraquejarem, mas ela não deixaria de correr. Nunca mais deixaria de correr!

Ela sabia que tinha pouco tempo, logo a sua ausência seria notada e eles viriam atrás dela, então percorreu todo o caminho até a escada e conseguiu escutar os ruídos das pessoas que provavelmente estavam à sua procura. Se sentia cansada e fraca, não havia de fato descansado nas últimas 30 horas, e ainda era atormentada pela forte dor em sua pélvis. Seu filho havia nascido poucas horas antes, o parto poderia ser descrito como brutal, pois além das dores esperadas a duquesa tivera muito sangramento o que a fez desmaiar assim que deu à luz. E com a morte recente de seu marido, se encontrou em uma situação doentia de desespero, o que não contribuiu para que conseguisse se manter saudável para a chegada do bebê. Mas apesar de tudo, a fuga havia sido a única saída que encontrou, não poderia ter outra escolha diante a tais circunstancias, por isso pegou o recém-nascido e correu pelos dois.

Quando finalmente conseguiu enxergar as escadas seus sentidos começaram a vacilar, porém, mesmo com a súbita tontura a duquesa prosseguiu e desceu os degraus. Ela já não conseguia distinguir se estava sendo seguida ou não, quando atravessou o hall de entrada e observou a porta tremular em sua frente.

— Não ouse dar mais um passo!

     A duquesa foi invadida pelo espanto, e logo depois pelo medo que se acompanhou de seu desespero.

— Sua insolente! Como se atreve a pelejar desafiar a coroa francesa fugindo com o duque!

Seus lábios se abriram a fim de desferir uma resposta, mas as palavras não fluíram de dentro dela. Era como se o próprio subconsciente estivesse tentando mostrar que havia desistido de lutar. Ela se virou para o dono da voz enquanto sua visão embaçada só conseguia identificar algumas silhuetas.

— Por vezes eu tentei lhe mostrar que nada do que tentasse mudaria os fatos, minha querida — a voz feminina começou — Esta criança não lhe pertence!

Não. Não era possível para ela entender, sua racionalidade já havia se dispersado há tempos.

— Tentei ser benevolente diante a tais atitudes que tomou, mas não fecharei os meus olhos para isso — o homem voltou a falar — mesmo que ainda possua o título de duquesa, o rei não perdoará tal ação.

Um fato, o destino cruelmente havia virado as costas para ela. O seu futuro era claro, não seria feliz, não veria o seu filho crescer, não sobreviveria nem para ouvir sussurros sobre a vida da criança que se formou em seu ventre. Morreria infeliz e sozinha, tão só como o futuro duque, que nunca conheceria a sua mãe e nem o seu pai. O pensamento lhe trouxe a lembrança de seu finado marido, tudo o que viveram juntos, os momentos que foram tão breves e ao mesmo tempo eternos, os toques que marcaram a sua pele com a ardente paixão que só ele havia conseguido lhe proporcionar. E os olhos... os mesmos que haviam sido deixados como herança para o seu filho. O pequeno recém-nascido, ainda não nomeado, havia sido abençoado com um rosto tão sublime como o de um anjo os olhos que ela agora encarava com fervor, pois talvez fosse a última vez que os veria.

— Por favor, tenham misericórdia de mim — ela sentiu o rastro quente de suas lágrimas — Uma mãe não deve ser separada de seu filho.

— Não deveria se opor ao curso que este rio tomava, sabia desde o início. Pedi para que não procurasse algo que não poderia conter, e agora deverá pagar por isso. — A sombra de um movimento passou pelos seus olhos — Chame os guardas! O seu fim está determinado, jovem duquesa.

E com a sentença, ela só pode se agarrar ao pequeno em seus braços, e sentir aquela sensação de ter seu filho em seus braços pela última vez, o sentimento novo que havia habitado o seu corpo não deveria ter durado tão pouco, ela merecia mais tempo. Perdida no momento, enquanto soluçava sem ter noção alguma de quanto tempo estava ali, o som da porta atrás de si invadiu os seus ouvidos, os guardas deveriam ter chegado para levá-la.  E com o isso, o corpo da duquesa entendeu que havia perdido, e pouco a pouco, tudo foi ficando escuro, suas pernas deixaram de funcionar e antes dos seus joelhos encostarem no piso ela pode sentir uma mão gelada e firme em seu ombro. Era o fim. Havia encontrado o seu fim.

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