16 de Setembro de 2021
Em um contexto geral, a maioria das pessoas com acesso ao mínimo de informação, já visitou ou ouviu falar da grandiosa Paris, ou cidade luz, caso o indivíduo seja romântico e poético. De qualquer forma, muitos sonhos estão localizados em Paris, onde casais apaixonados declaram o seu amor, prodígios da culinária lutam para construir uma reputação, entre outros com milhares de objetivos. Para Amy Murphy, uma canadense de 28 anos, significava paixão, não por algum homem ou mulher, e sim, pelo significado da cidade, da sua história e tesouros perdidos. Desde que visitou o país pela primeira vez há quinze anos, ela soube que havia encontrado o seu objetivo, então, dedicou anos de sua vida aprendendo sobre o lugar, e estudando o que seu cérebro pode armazenar. Tudo isso, para poder se sentir satisfeita com o seu trabalho no centro de conservação em Liévin, a 200 km de sua casa em Paris. Lutou para ser um dos grandes nomes por trás de descobertas históricas significativas, e que conservaria todas elas para que o mundo soubesse as maravilhas perdidas no tempo. E junto de seu colega, Eren Cartier, conseguiu liderar uma equipe especializada em explorar o território nacional. Ao longo dos últimos 5 anos, foram responsáveis por 12,30% das novas peças expostas nos museus franceses, o que era um ótimo número levando em consideração os recursos disponibilizados ao grupo.
— Eu poderia ir para o Havaí — ponderou consigo mesma — ou poderia passar cinco semanas dentro deste apartamento... ótima ideia!
Amy estava encarando seu rosto refletido no espelho, perdida em um pequeno dilema. Precisava decidir o que deveria fazer na próxima semana, havia recebido um aviso de afastamento da psicóloga da equipe, Silvia, que aos olhos de Amy tinha uma ideia totalmente equivocada sobre sua saúde mental, dizia que todas as responsabilidades consecutivas estavam a sobrecarregando. Resumindo, deveria tirar férias mas não sabia o que fazer.
Ela encarou os seus próprios olhos escuros, como se o reflexo fosse lhe dizer o que faria afinal. No entanto, a imagem só repetia os seus movimentos. Amy quis se xingar por isso, mas continuou observando o seu rosto sem maquiagem. A luz que vinha da janela trazia um brilho bonito aos fios de cabelo castanho. Tinha a lembrança de tê-los prendido mas em algum momento a mechas escaparam e agora estavam modelando a sua face. Por fim, ela puxou o seu cabelo para cima, e o prendeu novamente no alto de sua cabeça, voltando a pensar em seus planos.
Não tinha muitos amigos em Paris, e toda sua família estava localizada há mais de seis mil quilômetros dela, e como os seus planos não incluíam viajar para o Canadá, tudo ainda era incerto. Talvez poderia investir em um curso de culinária, dessa forma não gastaria tanto dinheiro em restaurantes e deliveries. Bom, ela só tinha uma certeza, que o próximo mês seria longo.
Mesmo contragosto tinha que admitir que a psicóloga tinha razão, estava tão viciada em trabalhar que não conseguia fazer nada que fugisse disso. Silvia tinha uma boa teoria que se moldava na ideia de algo que precisasse ser compensado, mas Amy não sabia o que poderia ser pois tinha lembranças felizes de sua infância, já esteve em alguns relacionamentos ao longo de sua vida e nenhum deles trouxe nada menos que momentos agradáveis e prazerosos, que foram encerrados da melhor forma possível.
Sua cabeça já estava começando a doer ao mesmo tempo que o seu estômago roncava, então ela pôs fim à imersão de seus pensamentos e decidiu que tomaria café. O clima estava agradável, então ela preparou torradas, encheu a sua xícara de café e levou tudo até a mesa de vidro em sua varanda. E antes de começar a refeição tirou do bolso do roupão uma caixa amassada de Camel. Já fazia parte de sua rotina fumar um cigarro antes de comer, era um péssimo hábito, Amy reconhecia e pretendia parar um dia.
Entre uma e outra tragada, sentiu o celular vibrar em seu bolso, ela o pegou e leu "mãe" na tela do aparelho. Antes de atender Amy se reprimiu por precisar receber aquela ligação visto que raramente se lembrava de ligar para a mãe ou o resto de sua família.
— Olá. — Ela levou o cigarro à boca em seguida.
"Amy, querida, como você está?"
Sorriu ao escutar a voz do outro lado da linha.
— Eu estou bem, mãe. Me perdoe por não ter ligado, eu... fiquei enrolada.
"Não se preocupe, querida, eu te conheço muito bem, e sei que acaba se perdendo às vezes."
— Sim. E como a senhora está? Como todos estão?
"Estamos bem. Seu pai está em casa com o Mike, e eu... bom... estou ajudando a sua irmã com o bebê."
Sua irmã, Amanda, tinha dado à luz há um mês. Amy tinha conhecido o pequeno David por uma videoconferência, mas ainda não tinha se acostumado com o fato da família ter ganhado uma nova geração.
"Acreditaria em mim se eu lhe dissesse que ele está cada vez mais parecido com você? É como carregar uma versão masculina sua!"
— É mesmo? — Ela deixou a fumaça escapar de sua boca — Suponho que a Amanda tenha ganhado um motivo para se irritar comigo.
Ambas riram com o comentário de Amy.
"Eu sinto sua falta, Amy, quando pretende vir nos ver?"
A mudança repentina de assunto a fez inalar o ar com rapidez, ela não estava preparada para a enrascada que a mãe tinha lhe colocado. Sentiu o peso da culpa em seu estômago antes mesmo de começar a falar.
— Não sei dizer, eu ando muito ocupada ultimamente. E não estava planejando tirar férias no momento — mentiu — Talvez antes do natal.
A ligação ficou silenciosa por alguns segundos. Não sabia se a mãe havia percebido a mentira, ou se apenas estava magoada com as palavras frias de sua filha. A própria Amy não entendia o motivo de sua esquiva, mas era quase inevitável sentir calafrios diante a ideia de estar ao lado de sua família. Não significava que Amy não os amasse, ela os amava. Muito! Mas eles representavam tudo o que não queria para si, e mesmo que se esforçasse, Amy sentia que estava os desapontando.
"Entendo... quem sabe, eu e o seu pai possamos visitá-la antes, vou conversar com ele sobre isso."
— É... Pode dar certo...
Foi difícil para Amy controlar a vontade de dizer que a família não precisava visitá-la, assim poderia convencer algo dentro de si de que não era uma tremenda insensível.
"Amy, eu preciso desligar. São três da manhã, vou aproveitar que o David dormiu, e fazer o mesmo... eu te amo!"
— Eu também te amo!
Após desligar a chamada, Amy terminou de fumar o cigarro, e tomou o seu café sozinha e em silêncio. Ela poderia ter sentido algo em seu peito pela atitude que tomou, fracasso, aflição, ou até mesmo raiva, mas não sentiu nada além do pequeno remorso que de longe a incomodava o suficiente para atrapalhar sua rotina. Algum dia, ela se arrependeria de tudo isso, sabia disso, mas era egoísta ao ponto de não se importar com o seu futuro.
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RomanceAmy Murphy foi uma arqueóloga promissora em 2021 na França, conseguiu ser responsável por muitas escavações e descobertas valiosas. Não tinha grandes sonhos além de sua carreira, sem família, sem parceiros, sem animais, uma vida pessoal medíocre est...