O mar se alvoroça às onze horas

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Tal como se encarnasse a Aurora de róseos dedos, Dia é a que cedo desponta, junto do Astro do dia que se erguia ao horizonte encoberto de nuvens. O esplendor de seus raios calorosos passa a tomar vagarosamente o piso de mármore, alastrando-se até chegar na curiosa cena da herdeira Ohara adormecida no colo de uma enorme escultura réplica de si mesma.


Na noite passada, Dia havia sido arrastada por ela ao pseudo-etéreo recanto, com uma fonte de águas verde cristalino ao centro e diversas estátuas de seres mitológicos. Mari contou-lhe a história dos irmãos Pólux e Castor, do seu próprio ponto de vista mirabolante, a voz vivaz e alta. Em minuto algum a contestou, mantendo-se reservada para não resvalar em mais atitudes nada profissionais. E o silêncio só pareceu dar corda à outra mulher, que tagarelou alguma caraminhola sobre o nascimento de Vênus, para depois ocasionalmente despencar em um sono pétreo.


Enquanto a lua ia desaparecendo, Dia ficou vagueando de um lado para o outro, esmiuçando com os olhos o estado impecável das estátuas, vagueando de novo, perguntando-se se Ruby passava bem em casa, lembrando-se do motivo que a levou para tão longe, e mais outra vez, vagueando sem sair do lugar.


Aproximou-se à estátua em uma direção fixa, afundando passos na água até estar na mesma base que Mari. Quedou-se ali, peregrinando os olhos na imagem que tinha dela, sem penumbra de movimento. O vestido amarrotado, cada centímetro de tecido cheio de carquilhas semelhantes a remoinhos, o cabelo emaranhado em uma miscelânea de nós, que se desfiam e se entornam do chão aos ombros. Tardou ao se dar conta de que, inconscientemente, seus dedos pairavam à beira daquele rosto, e neste instante, olhos áureos surgem ofuscantes perante a si. O gesto que fez de se afastar é detido pela recém-desperta, que pousa a palma de encontro a pele, germinando em uma singela carícia.


"Dia." Continuou trilhando o toque, até parar no dedo médio, triscando o anel ali fincado, e questiona: "Pode me contar sobre essa aliança? Eu prestei atenção nela a noite toda."


"É uma aliança de noivado." Respondeu "Tenho um noivo."


Dia quebrou o enlace ali, lembrando-se de que Mari deveria estar morta.


"Quer que eu prepare um café puro para você?" A voz saltou-se "Ou, quem sabe, um chá com leite?"


"Apenas me diga onde está a saída." Dia vira-se ao lado contrário, prestes a caminhar "Meu tempo aqui já se esgotou."


Em uma sacudida, Mari levanta-se, não estava à espera de uma resposta como aquela. E não era como se revigorasse a chance de ter seus convites despojados aceitos por alguém que era sua guarda-costas, todavia, avistar Dia indo embora, sem saber para onde iria, acabou por ferver uma encabulação tremenda. Embora não fosse de sua conta, algo lhe sussurrava que deveria atrasar o fim.


"Nós duas temos algumas pontas soltas." Mari brinca com alguns fios desgrenhados a mosquear na ponta do nariz, e desenrola-os assim como as palavras "Cinco minutos de conversa serviriam. Nem um pouco mais, nem um pouco menos."


"Senhora Ohara, novamente, é inadequado trazer assuntos pessoais à tona enquanto estamos nesses termos profissionais. Não complique meu trabalho."

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⏰ Última atualização: May 15, 2021 ⏰

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