CAPÍTULO I: REENCONTRO SOMBRIO

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Deitado sobre o mármore frio, o homem despertou atordoado. A dor lacerante na perna direita o impedia de se levantar.

O cheiro podre exalava de sua própria carne e o chorume viscoso escorria pela pedra.

Tudo ao redor estava turvo e um zumbido macabro assoviava palavras terríveis em seus ouvidos:

Signa... Signa... Mortis... Mortis... — o eco pairava no ar. — Domini!

— Conte para nós, Petrus... — outra voz maligna ecoou longínqua, porém o espectro estava ao seu lado. Ele fincou seus dedos finos na perna apodrecida do homem e se deleitou de sua dor. — Onde está a coroa de Berília?

— Ahhhh... — Petrus gemeu doloroso. Compreendeu que estava na presença de um general das trevas, pois o sussurro em seus ouvidos provinha das vibrações da capa negra. — O que... o que aconteceu?

— Aquela que se dizia a Imperatriz das trevas não retornou com os cristais sagrados de Pontus. — o espectro maligno permaneceu afligindo sua vítima. — Como os marianos conseguiram derrotar o valete cinzento do Imperador das Trevas e seu exército de heliótrofos?

Petrus se lembrava do momento em que tinha sido lançado na prisão de trevas por Roderici. Mas seu coração temia tanto que o príncipe pardo tivesse falhado.

Porém, naquele momento, lhe pareceu claro que Lipe havia vencido Erica e seu império demoníaco.

— Ele cumpriu seu destino. — Petrus suspirou aliviado, apesar do esforço que seu algoz fazia para torturá-lo.

Essa certeza tornou o homem feliz como nunca. Uma luz pálida surgiu em seu corpo como um último sopro de vida e avançou pela mão de seu carnífice.

Apesar de ser muito descorada, a luz destruiu em instantes aquele espectro, que era feito da pura escuridão.

A capa sibilante que adornava o general dançou nas sombras até cair vazia ao chão.

— A esperança ressurgiu para os reinos perdidos! — Petrus gritou para a multidão de espectros, heliótrofos e seres malignos que o cercava. — Vocês se escondem neste covil das trevas onde impera a traição e o medo. Reconheço este lugar onde Erica encurralou Henrich e o venceu com seus métodos sórdidos. Na escuridão, os corações se corrompem, mas há uma luz capaz de purificar os espíritos e dissipar as trevas com as quais vocês se vestem!

— Então, os boatos são verdadeiros. — uma voz serena concluiu. Não era o eco difuso como a do outro espectro, mas um brado grave e imponente. — O lendário príncipe pardo se revelou.

Ao lado do mármore, o homem alto removeu o capuz branco e olhou diretamente para Petrus sob a luz fraca que ainda banhava o salão.

Era um homem branco, de cabelos negros e porte altivo.

Os olhos eram pretos, sem alma. Na mão direita, ele segurava uma taça prateada enquanto a mão esquerda perfurou o peito do homem deitado, como uma faca afiada.

— Você? — uma lágrima escorreu dos olhos de Petrus. — Isso é imposs...

O corpo estava anestesiado pela própria dor, mas reconhecer aquela figura pálida despedaçou o coração do moribundo. Aquele a sua frente era um homem cuja face Petrus jamais esqueceria.

Ignorando a dor que causava, o cavaleiro branco retirou sua mão das entranhas ensanguentadas e trouxe consigo o coração pulsante do guerreiro.

Então, o depositou na taça que segurava. A peça brilhou palidamente.

— Exatamente como suspeitava. — o homem branco sorriu. — O coração esmeralda foi aceito pela Telum Neptunum.

A vida e a esperança se esvaíram de Petrus. Ele não conseguia enxergar. Todos seus sentidos foram se perdendo e a luz de seu espírito esmoreceu.

O cântico terrível da morte que zunia difuso em seus ouvidos anunciou o abraço final.

Signa... Signa... Mortis... Mortis...

LIVRO II - POMPEIA: O Príncipe e Pardo os Reinos Perdidos (DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora