Naquele dia

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Naquele dia...
A humanidade percebeu o verdadeiro significado de ser "humano". Uma pequena criatura, pouco maior que uma formiga. Que, ainda assim... Se acha alguma coisa. Perceberam a humilhação de estar preso em uma gaiola. Feito um pássaro.

A brisa calma e refrescante de primavera batia em meus compridos cabelos vermelhos como cobre, movimentando-os como em uma dança perfeitamente sincronizada. O vento acariciava minha pele pálida, banhada de algumas pequenas e discretas sardas em minhas bochechas e nariz.

Sentada, de olhos fechados e com um livro de capa escura aberto em minhas mãos, tudo o que eu conseguia era pensar sobre lá fora. Lá fora... Fora das muralhas. Onde existe um mundo real e imenso. Li em alguns livros coisas sobre o mundo fora das muralhas, mas nada muito profundo, muito concreto. Eu apenas costumava imaginar. Tentar de alguma forma, visualizar o que existe lá fora.
Abri meus olhos, encarando o livro agora em meu colo, que tinha suas páginas completamente reviradas por conta do vento. Segurei uma das páginas, encarando a primeira palavra que meus olhos conseguiram ler.
O mar...
Pisquei algumas vezes meus olhos castanho claro, quase âmbar, estreitando-os minimamente. O que é "o mar"...? Eu nunca tinha ouvido falar sobre esse "mar". Minha cabeça pensava profundamente sobre o que poderia ser. Talvez alguma comida? Não... Não acho que seja. Continuei a ler as palavras, engolindo cada letra daquelas páginas.

O mar:
Azul como um céu limpo de nuvens,
As vezes calmo, como uma pequena criança a sonhar
As vezes agitado, como uma tempestade
Um leão, protegendo seu território
Ou aquilo que mais ama
Consigo ver o reflexo de seus olhos neste tão profundo e desconhecido
Mar.

Folheei mais um pouco do livro, tentando encontrar a resposta da questão que agora preenchia minha mente. O que é esse mar, tão azul e profundo? Azul... Eu sempre gostei de azul... Mas qual tom de azul? Azul... Céu? Será alguma palavra desconhecida? Alguma expressão de fora? Isso realmente existe...? Esse mar?

-Kyasu! Corre! O almoço está pronto, se não vier comer vai esfriar.

Fui tirada de meus devaneios por um grito. Meu irmão, me chamando.

-Eu já vou, Kevin. -respirei fundo em resposta, me levantando com meu livro em mãos. Não podia perder aquilo, tinha que compreender melhor o que era aquele aparentemente tão belo e vasto mar.
Eu sou Kyasurin, mas pessoas próximas me chamam de Kya. Meu irmão cisma em me chamar de Kyasu, mas não tenho muitos problemas com isso.
Após o almoço, saí apressadamente, carregando meu livro. Precisava encontrar qualquer um. Qualquer um, qualquer coisa, qualquer pessoa que pudesse me informar sobre esse "mar". Esse azul, azul e profundo mar.
Azul...
De repente, a imagem de dois olhos, redondos e alegres vem em minha mente.
Armin. Armin tem olhos azuis... E profundos. Como... Como esse tal "mar". Seria o mar uma expressão simbólica para olhos como os dele? Armin sempre foi o mais inteligente de nós... Ele deve saber o que é o mar.
Eu, que corria sem rumo, agora tinha um novo objetivo: Encontrar Armin e tentar tirar alguma informação sobre o mar.
Apertei os passos, passando pelas ruas, até me lembrar de um fato importante. A volta dos soldados da divisão de reconhecimento é hoje! Eu não posso perder isso...
Corri para a praça principal, vendo-os chegar. Eram muitos soldados, mas uma quantidade bem menor do que a que saiu. Muitos, feridos gravemente.
Em minha mente, eu sempre idealizei uma vida fora das muralhas. Se me tornar um soldado da divisão de reconhecimento vai me permitir isso... Então é o que eu quero.
Meus pensamentos foram interrompidos por uma senhora chorando, e um soldado gritando coisas que só agora fui prestar atenção. Aparentemente, o filho dela morreu, e tudo o que restou foi um braço. Engoli em seco. É isso mesmo o que você quer...? O pensamento ecoou em minha mente, e apertei meu livro contra meu peito com força.
É sim o que eu quero! Eu não quero morrer, não quero sofrer. Ninguém quer isso. Mas eu preciso... Eu preciso ver o mundo lá fora! E eu vou. Eles são heróis... E eu também serei.
Olhando mais ao longe, pude ver Mikasa carregando lenha, ao lado de Eren. Mikasa, a garota magra de cabelos negros e olhos de mesma cor que morava com Eren e sua família. Eram como irmãos, ou melhores amigos? Não... O melhor amigo de Eren sempre foi Armin.
As vezes até mesmo eu tenho certo ciúmes da amizade dos dois.
Eren começou a bater em um homem com um pedaço de lenha. O motivo? Eu não sei, estava em uma distância considerável. Não consegui ouvir direito.
Mikasa o encarou, aparentemente nervosa e respirou fundo.
Agarrou o braço do moreno e começou a arrasta-lo até um beco.
Passando pela multidão, fui na direção de meus amigos, podendo ver o corpo de Eren largado contra o chão do beco e a lenha toda espalhada pelo lugar.
Para qualquer um, a cena seria um tanto estranha. Mas não para mim. Já estava mais que acostumada a presenciar brigas entre Eren e Mikasa.
Enquanto eles conversavam, coloquei meu livro abaixo de meu braço, começando a juntar a lenha, ajudando Eren a pega-la novamente.

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