3. Boate

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A música estava alta em meu apartamento, como minha investigação só começaria quando finalmente estivesse trabalhando na boate resolvi tirar o fim de semana para arrumar minhas coisas, ainda havia muitas caixas espalhadas pela casa, minhas roupas estavam sendo ocupantes de duas cadeiras que tirei do balcão da cozinha, acho que minha grande sorte foi o apartamento estar com uma pintura nova, os tons pastéis da sala e o verde do quarto eram aconchegante, a mobília era antiga e me lembrava as férias escolares quando passava um tempo na casa da minha mãe, eu havia sido criada pela minha avó, minha mãe sempre teve um espírito jovem e para ela lidar com uma criança ainda em sua adolescência foi uma das coisas mais difíceis, a responsabilidade bateu diversas vezes em sua porta e ela ainda não estava pronta, antes eu não entendia, passei minha adolescência querendo explicações e julgando suas atitudes em relação a mim o tempo inteiro porém hoje eu a entendo, ela só queria ser livre e aproveitar o máximo que podia, não sei dizer quantas vezes minha mãe se casou, foram inúmeros vestidos de noiva que tivemos que escolher, quase já não existia um buffet que não tivesse patrocinado suas festas, é, o espírito jovem da minha mãe permite que ela renasça quantas vezes forem necessárias e se existia algum tipo de qualidade que dividimos era essa, me lembro das vezes quando chorava por algum garoto que havia me magoado e minha mãe sempre me apoiava em palavras, " seja como uma fênix, renasça sempre das cinzas mas nunca se esqueça que você é mais forte do que pensa" era o que ela sempre dizia e essa era a maior lição de amor que ela me ensinou sobre a vida, claro que depois que conheci o Mike tudo ficou mais fácil e pude deixar o medo e as inseguranças de relacionamentos conturbados longe do meu caminho, mas eu nunca me esqueci de quantas vezes minha mãe renasceu das cinzas depois de sofrer por algum relacionamento que não deu certo, ela era a pilastra que eu me apoiava para viver, sempre aprendemos algo com alguém e devia muito isso a ela, metade do que eu era como mulher.

- Essa é a última! - digo a mim mesma rasgando a fita que envolvia a caixa de papelão. - posso dizer que foi um dia produtivo… - observo o sol se pôr pela janela do apartamento

Com uma toalha em mãos caminho em direção ao banheiro, a roupa que iria usar hoje já havia sido separada e estava na cama me esperando, meu banheiro já possuía tudo o que precisava para se parecer com um banheiro de verdade… ligo então a torneira da banheira enquanto observo a água quente formar uma densa fumaça por todo lugar, na ponta da pia a tesoura já estava pronta a minha espera, sempre fui muito boa com despedidas e essa seria mais uma que eu teria que fazer. Puxando algumas mechas de cabelo para próximo ao ombro começo a retirar todo o comprimento, meu cabelo antes na cintura agora estava na altura dos ombros, claro que isso não me tornaria uma pessoa diferente mas era um disfarce, era alguma coisa, sua cor já havia sido alterada também, antes o loiro cobria cada mecha e agora o castanho vivo era quem estava presente.

Retirando meu vestido entro na banheira sentindo a água quente preencher cada espaço do meu corpo, o aroma de rosas era delicioso, queria aproveitar cada minuto ainda como Kara  aqui nessa banheira, depois das 23:00 eu já não seria a noiva do Mike ,  não seria a detetive de NC  e também não faria parte do grupo de leitura da minha cidade, depois de hoje eu mudaria por completa… se existia algo que minha área me permitia era se envolver em novos personagens como em uma história de quadrinhos onde você se veste de superman e pode desejar ser quem deseja depois disso, algumas pessoas conseguem lidar com isso facilmente mas no fundo essa versão que temos que seguir corrompe a gente, não ter identidade mesmo que seja por um curto período te faz sair da sua rotina habitual mas no fundo tudo o que você deseja é voltar pra casa, para sua vida, para quem você realmente é e quem realmente deseja ser. A luz da cidade logo abaixo me faz sair de minhas fantasias, estava na hora de ser quem eu deveria ser aqui, nada é mais intenso que uma escolha, as escolhas mudam quem somos para sempre, não importava o que viesse, eu enfrentaria, tinha que enfrentar, o bom de viver um personagem em cada caso é que você não se torna mais notável, esse trabalho me ensinou a ser invisível.

60 Dias Com ela (Karlena)Onde histórias criam vida. Descubra agora