Cápitulo 1 - Ótima escolha, mãe. Meus parabéns.

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Dia 26 de março de 2012, às 16h, em uma tarde ensolarada e de nuvens pomposas no céu, que faziam sombras refrescantes em meio ás arvores que... Tô de zuera, não me lembro nem o que eu comi ontem, vou me lembrar em que dia aconteceu. Nem fodendo que eu lembro. E também me orgulho disso, é ótimo não lembrar de certas coisas de ruins que acontecem. E como a minha vida é uma compilação de merdas, eu prefiro me esquecer de cada minuto, portanto, se eu fizesse um cabeçalho para esse dia, seria mais ou menos o seguinte:

Dia bosta. Hora bosta. Sol bosta com nuvens bosta fazendo um monte de bosta nas árvores bosta.

Pronto.

Era aniversário da minha prima. Festa de 15 anos, na qual eu resumia desta maneira:
Várias garotas gostosas que eu nunca vou pegar. Primeiramente porque não tenho um perfil adequado (sou feio pra porra), e segundo porque, mesmo que eu fosse lindo, as garotas não ficariam com um garoto nada sociável, o qual elas não poderiam mostrar para as amigas e dizerem com os olhos: ''Na. na. na nanana! Olha o pinto andante que eu tenho e vocês nã. ão''. Por isso.

E também minhas tias perguntando: ''Cadê as namoradas?'', e eu respondendo: ''Não sei'', como se eu não soubesse. Mas minha vontade mesmo era responder com um: ''VAI. SE. FUDER!!!''.

Por que ser tão rude com uma linda pessoa que quer apenas saber como vai a minha vida? Vou dizer o porquê: Pois as perguntas sobre onde estão as tais namoradas são frequentes apenas com os sobrinhos mais feios, ou não-descolados. Aqueles fódinhas que usam camisa de botão e andam enclinando o corpo para frente não são questionados. Ou seja, as perguntas são irônicas e retóricas. O prazer do ser humano não é obter a resposta, e sim o que vem durante ela: A minha cara de tristeza e vergonha, e o vermelho que se expande e se mistura com o amarelo das minhas espinhas não estouradas.

*1 (Isso serão observações que eu vou pôr aqui no meio para comentar minhas indignações sem precisar interromper a narrativa, mas já interrompendo. Foda-se, as pessoas me interrompem o tempo todo, não fiquem putos).

Por que eu tenho tantas espinhas? Eu não como mais do que as pessoas que eu convivo. Meu dermatologista disse que comer não influencia no crescimento avantajado de espinhas, que isso surge em relação à quantidade de hormônios no corpo, por isso na puberdade se nascem espinhas.
Uiii!!! Eu tenho muitos hormônios. Nossa. Por isso eu sou tão alto, e de corpo definido, e voz grossa. SEU CU! Quando eu como uma paçoca, parece que um enxame de abelhas fizeram sexo na minha cara.

Recaptulando. Estamos na festa da minha prima.

Eu odeio festas em família, tanto pelos motivos acima, quanto por centenas de outros. Nesse caso, porque a minha prima é uma imbecil. Acho que esse motivo é bem cabível. Volto mais tarde dizendo porque eu a detesto tanto, pois o foco principal aqui foi o que aconteceu no momento do microfone choroso.

O momento do microfone era uma hora que pessoas falsas pegavam aquela merda chamada microfone, que aumenta a voz do ser humano, como se já não fosse o suficiente, pois meus tios parecem ser surdos, e davam declarações à (puta) aniversariante.

Pois bem. O problema era que o meu padrasto tinha bebido uns três litros de vodka, e ele não era russo, portanto tava caindo e falando mais merda do que o comum. Ele, em seu estado deplorável, pegou o microfone e começou a falar umas coisas inaudíveis como: ''ahsanahanha''. E depois foi fazendo mais sentido:

— Parabéns, Suzanne! (o nome da aniversariante não era Suzanne, esse era o nome do namorado dele) Feliz trinta e sete décadas! (Tipo a idade da minha tia) Te desejo tudo de bom! (um bêbado que mente bem, uau) Mas também me desejo tudo de bom, pois mesmo sendo travesti, ninguém nunca desconfiou.

Ah, como foi bom. O único momento da festa que eu sorri. Aliás, eu gargalhei. Quando todos ficaram quietos, só se dava para ouvir as risadas saindo ofegantes da minha garganta. Eu achei que ele tava zoando, não achei que tava falando sério. Qual é, foi muito súbito, ninguém revela para duzentas pessoas que é travesti, antes de, ao menos, contar para a mulher que estava namorando há dois anos. É muita filha da putagem.

— Edson, largue esse microfone! - Minha mãe ficou de pé.

O cara é travesti e tem um nome melhor que o meu. Ah, é, esqueci de falar meu nome, é Gibiromeu. Meu pai gostava muito de gibi, e minha mãe de Sheakespear, portanto... SEI LÁ DE ONDE XAVASCAS VOADORAS ELES TIRARAM ESSE NOME. Estavam nos anos noventa. Onde as pessoas chamam Lucas, Carlos, César... Qualquer bosta, menos Gibiromeu. Eu fico puto sempre que leio meu RG, pois é a segunda coisa mais feia depois da minha foto.

Fácil nome para não se sofrer nenhum tipo de bullyng na escola. Aliás, devíamos fazer uma ONG dos Gibiromeu's, para que todos no mundo tivessem esse nome, aí não haveria mais preconceito. Gibiromeu é um nome totalmente fora da cogitação de bullyng, impossível fazer piada com ele, não há como. Ninguém vai mandar um ''Ô Gibiromeu, vem aqui pegar no meu''. Nem dizerem: ''Ow!!! AgaROMEU gibi!!! enquanto colocavam o pinto dentro de um gibi enrolado.

Sim. Meu padrasto era travesti. Seu nome profissional era Laconda. Que, ainda assim, é melhor do que Gibi puta que me pariu Romeu.

*2 - Acho que ficou claro que eu odeio o meu nome.

Depois dele largar o microfone, vomitar na minha prima (ISSO, LACONDA! TE AMO, CARA!), tropeçar e cair no bolo de cinco andares, ele desmaiou e dormiu, fodendo com a festa toda.

Minha prima não parava de chorar. Foi muito engraçado. E o bolo... Ah... Por esse coitado eu fiquei triste. Parecia tão gostoso. Mas fazer o que, para algumas coisas ruins na vida vem as boas. Pelo menos nesse dia foi.

Minha mãe me pegou pelo braço junto de meus dois irmãos mais velhos e nos jogou para dentro do carro. Nunca tinha visto ela tão enfurecida desde que pegou meu pai traindo ela com a vizinha de setenta anos (Que família escrota). Ela foi chorando até em casa. Só parava de secar as lágrimas quando precisava trocar de marcha. E o meu padrasto... Bom, ele foi jogado no porta-malas.

Você deve estar pensando: Como ela soube que ele estava falando a verdade? Ele podia estar falando merda que todo bêbado fala. Mas uma coisa eu e meu irmão não sabíamos: Ela já estava desconfiando a tempos, pois calcinhas que ela não havia comprado apareciam misteriosamente em seu guarda roupa.

Aquele dia foi estranho demais. Meu rosto não se decidia entre rir ou ficar triste. Entre odiar ou amar meu padrasto. Entre ficar com fome ou nojo. Caramba, quanta merda em menos de sete segundos. Mas foi um dia memorável. E, corrigindo o que eu havia dito antes, há muitas merdas que eu me lembro, e eu estou disposto a contar para quem quiser ouvir.



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