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Me despeço e vou andando lentamente até meu armário, arrumando coisas e cumprimentando pessoas. Nunca fui a garota mais legal da escola, muito menos a mais inteligente ou popular, mas sempre me destaquei na questão dos eventos. Que bom que acabou.
Ao chegar nos armários, começo a recolher minhas coisas e arrumar o que ficaria por ali. Quando acabo, olho ao redor e vejo as pessoas indo embora. Sorrio, realmente feliz. No fim dos corredores, consigo ver Timothée se aproximar, com Hannibal em seu encalço. Os observo enquanto caminham, olhando ao redor, parecendo procurar por algo. Ou alguém...Sua busca parece cessar quando seus olhos escuros encontram os meus na multidão. É, eu deveria saber que era por mim que procuravam. Seus passos se apressam e logo estamos frente a frente.
- oi.. - ele sussurra, sorri e volta a ser o Timothée de todos os dias. O garoto tímido.
- oi.- sussurro de volta e também não consigo evitar o sorriso. Patético!
- está pronta? - pergunta. - meu pai foi pegar o carro.
- não achei Will para me despedir, acredito que já foram pra lanchonete.. Podemos ir. - digo e espero que ele ande, mas o mesmo permanece parado, me encarando. - o que foi?
- você foi sensacional naquele palco. - seu tom era calmo, mas seus olhos gritavam mais, tanto que eu poderia me afundar neles.
- obrigada. Eu só fiz minha parte.. - antes que pudéssemos dizer mais alguma coisa, ouvimos uma buzina e então o garoto me puxa em direção a saída da escola.Sinto o olhar de várias pessoas em nós ao passarmos pelo portão principal. É, eu também jamais me imaginaria indo jantar na casa do Sr. Lecter. Não na vida real, pelo menos...
Ao chegarmos no carro, Timothée e eu trocamos um olhar rápido e ele pareceu decidir que iria na parte de trás. Comigo. Meu nervosismo aumentou em um nível absurdo e então entramos no carro, que era preto e lustroso. Elegante e misterioso, como quem o dirigia.Do lado de dentro do automóvel, tocava algo parecido com música clássica no rádio e parecia agradar Hannibal. Não pude deixar de notar a mistura cítrica de aromas presos em cada canto do carro. Eu poderia passar o resto da noite sentindo isso, é inebriante.
Logo estamos cada vez mais longe da escola.
Eu olhava janela à fora, ainda tentando normalizar minha respiração, quando a voz do Sr. Lecter se faz ouvida.
- seus pais não viram problema em você jantar fora de casa, Lya? - sua voz era calma, como em todas as vezes que se dirigia à mim.
- eu não moro com meus pais, senhor...-digo baixinho, mas os dois parecem ouvir perfeitamente. Timothée me encara.
- então com quem você mora? - o garoto questiona e eu respiro fundo. Não é um assunto do qual eu falo com frequência.
- e-eu.. sou emancipada desde os 16 anos. - gaguejando.
A velocidade do carro é reduzida e eu percebo que paramos no sinal.
- se importa de explicar? - agora Hannibal é quem se mostra curioso. Timothée ainda segurava minha mão, só me dou conta disso quando o sinto apertá-la mediante a pergunta do pai. Não duvido nada que Will tenha dito algo pra ele.
- não, eu só...- respiro fundo pelo que parecia a milésima vez no dia. - meus pais sempre trabalharam na polícia, minha mãe é investigadora e meu pai era legista..
- era? - sinto o peso da mão do garoto novamente.
- sim, meu pai morreu quando eu tinha 14 anos. Ele tinha câncer. - Sr. Lecter agora me encara pelo retrovisor. - no começo foi bem difícil pra minha mãe e pra mim, mas aos poucos ela voltou à ativa. Ela se casou há pouco mais de um ano e resolveu ir embora.
- e você não quis ir junto? - apenas nego com a cabeça. - é realmente triste que tudo isso tenha lhe acontecido, mas fico feliz e orgulhoso que você tenha conseguido reconstruir sua vida, Lya.
- obrigada, as vezes sinto que não vou conseguir lidar, mas tudo acaba dando certo. - olho pro garoto e por algum motivo ele mostra seu sorriso brilhante pra mim.
- como você se sustenta? - Hannibal pergunta enquanto dobrávamos uma esquina. Eu já não sabia onde estávamos.
- ah, ela trabalha naquela loja de antiguidades incríveis que tem no centro, já lhe falei dela, pai. - Timothée responde, me fazendo arfar.Eu trabalho na loja há quase 1 ano. Estava prestes a completar 18 e cansada de depender da minha mãe, e não querendo mais ser um fardo, eu saí à procura de emprego e depois de três difíceis semanas o simpático Sr. Campbell me aceitou. Como fica perto do shopping, Will, Jane e Dan sempre iam lá, às vezes o garoto Lecter também aparecia e sempre ficava encantado com as peças.
Depois de muita conversa, toda sobre mim e minha vida complicada, finalmente chegamos. Eu acho.
A certeza vem quando Sr. Lecter para o carro e sai rapidamente. Timothée, que estava na janela, abre sua porta e sai, segurando a mesma pra mim, enquanto estende a mão livre em minha direção e então estamos de mãos dadas novamente.
Tento não focar nisso e sim na enorme casa à minha frente. Qualquer outra pessoa que a visse diria que pelo menos 6 pessoas extremamente ricas e elegantes moram aqui.
- sua cara já diz tudo, mas por favor não diga coisas como "meu deus, você é rico?" - seu tom é suplicante e eu acabo com rindo.
- desculpe, é que eu pensava que vocês moravam em alguma espécie de prédio...- Digo e ele solta minha mão para que eu passe primeiro pelo portão e depois a pega de novo. Ele não vai parar com isso? é possível se viciar em mãos?
- estamos constantemente em seus pensamentos, então? - ele questiona e eu me sinto corar violentamente. Se ele soubesse...
- de todos os meus amigos, você era o único que eu ainda não sabia onde morava.. - respondo baixinho quando já estamos perto do professor Lecter, que abria a porta da residência.Eu invejava a calma deles, pois por dentro eu ainda parecia tremer como um pinscher raivoso. Hannibal Lecter, mesmo segurando caixas, abre a porta com elegância e então estamos do lado de dentro da casa. Achava não ser possível, mas consegui me surpreender ainda mais com o cômodo principal.
continue...
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• Est Devenu Réel •
Short StoryPequenos contos baseados em sonhos de uma mente perturbada, porém criativa. Ou não. . . . . . . . compartilhe :)