Caminho rapidamente pelo não-tão breve corredor, que liga a sala e a cozinha, ouvindo os passos apressados do garoto atrás de mim. Agora ele já não me chamava mais, porém parecia me acompanhar.
Ao adentrar o cômodo, me surpreendo. Primeiro pelo tamanho. Era muito grande pra uma cozinha, e pelo que parece eles têm um outro cômodo para a sala de jantar.. Segundo, Hannibal Lecter não estava em lugar nenhum ali.
Me viro no mesmo instante que Timotheé me alcança, esbarrando no mesmo.
- opa...- ele sussurra. Em um dia normal, eu teria ficado nervosa ao ponto de derreter por conta da proximidade de nossos corpos, mas apenas bufo e me viro novamente. Sem tempo para surtos apaixonados.. não que eu esteja, de todo modo.
Olho mais uma vez ao redor, sem encontrar Hannibal, ou mesmo um vestigio de comida sendo preparada.- e essa é a cozinha! podemos voltar pra sala agora? - ele diz, se posicionando à minha frente.
- cadê o sr. Lecter? - pergunto. Não obtenho respostas, apenas um olhar perdido e quase desesperado. - tudo bem! eu procuro sozinha..Adentro de vez à cozinha, ainda perplexa com a graciosidade e mistério do lugar. Timotheé vem atras de mim, resmungando algo que não entendo e, pela primeira vez, não faço questão.
- quer saber? vem aqui! - ele me puxa e me direciona a uma das três portas fechadas que haviam ali, a do meio. Mesmo não querendo, eu sinto um arrepio com seu toque.
- o que está fazendo? - questiono baixinho, de repente perdendo toda a coragem que adquiri nos últimos minutos.
- você quer saber onde meu pai está, não é? - sem me deixar responder, ele abre a porta e eu encaro o vão escuro. - desça a escada.
- isso é algum tipo de brincadeira de mal gosto? - ele nega e suspira.
- só estou dando o que você pediu! - sua voz é baixa e eu sinto o desespero novamente.
Cansada, eu dou as costas à ele mais uma vez e começo a descer lentamente os degraus. Cada passo dado parecia me levar a um abismo gelado. O que tem ali? uma câmara fria?
Ainda em meu encalço, Timotheé inspira e expira rapidamente. Minha vontade é virar e perguntar o motivo de tamanho nervosismo, mas me contenho quando vejo que cheguei no último degrau. Ou seria o primeiro?
- abra.. - ele sussurra e meu coração acelera. Tem outra porta, mas esta está entreaberta e eu sou perfeitamente capaz de ver a luz fraca que sai dela.Num súbito de coragem, eu respiro fundo e abro a porta rapidamente. Sem ter a menor ideia do que me espera do outro lado. E provavelmente, nem nos meus pensamentos mais absurdos eu teria imaginado tal cena.
À minha frente, diante de um enorme balcão de mármore branco, estava Hannibal Lecter, elegantemente vestido em seu terno azul escuro e isso seria perfeitamente normal, se não fosse a capa completamente suja que ele usava por cima. Suja do que eu suponho ser sangue, visto que o que está no balcão é nada menos que um corpo. Ou metade dele. Meu professor de biologia tem em uma das mãos um cutelo que me parece gigantesco e na outra, algo viscoso que eu prefiro não olhar. E nem acho que poderia, pois minha atenção se volta toda para seu rosto, que permanece o mais sereno possível, enquanto eu seria capaz de gritar o mais alto que posso... se não estivesse paralisada.
Não consigo esboçar reação nenhuma, nem mesmo quando o homem larga o cutelo e nos encara, com sua feição sempre calma, o
que me deixa ainda mais impactada.- achei que tinha dito pra esperarem lá em cima...
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• Est Devenu Réel •
Short StoryPequenos contos baseados em sonhos de uma mente perturbada, porém criativa. Ou não. . . . . . . . compartilhe :)