Estou sozinho, mesa pra dois

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Acordo todos os dias sem mensagens me esperando. Entro nas redes, vejo que os amigos foram naquele show que comentaram a última vez que estávamos juntos. Minha mensagem de alguns dias perguntando o que faríamos no fim de semana não tinha sido vista.

Há algum tempo conheci uma mulher incrível, e ontem ela me mostrou que o ponto final sempre esteve ali, só eu não tinha visto. Mas não é culpa dela, eu sabia que provavelmente não decolaria. Eu só me deixei acreditar. C'est la vie.

Ela me respondeu que foi real sim, quando eu perguntei se viajei demais. Porque nas noites que passei pensando em tudo que foi dito, Deus sabe quantas vezes eu tive vontade de deixar uma mensagem dizendo que era tudo brincadeira, tudo personagem, e que eu não falava sério, mas como eu estava falando sério.

Ela falou que foi real, mas que atualmente pra ela, tudo que é real também é passageiro. Que nada fica, e isso foi a vida a ensinou, daquele jeito difícil que a vida tem de ensinar, e fazer com que seja passageiro dói menos quando acaba.

Eu entendo o ponto dela, o medo da dor talvez seja até pior que a dor em si. Acaba que os fins justificam os meios. E eu sei que quem acredita que os fins justificam os meios, acaba sendo capaz de fazer qualquer coisa.

Eu sou diferente, eu prefiro acreditar de fato em algo. Mergulho de cabeça, quando acho que pode ser profundo. Acabo me decepcionando de vez em quando.

A dor existe, e talvez chegue às 23:00h, mas a possibilidade de ela chegar não vai fazer eu desistir às 20:00h.

Bom, talvez seja um pensamento imaturo. Me jogo em precipícios acreditando que dessa vez talvez eu voe. No fim quase sempre estou caído no chão, mas me levanto de novo para me jogar no próximo. Talvez eu só não tenha caído o suficiente para desistir de pular. Mas enquanto isso, eu vou o máximo que conseguir.

Serviu de aprendizado, mas eu queria um romance, não um workshop.

Agora estou aqui de novo. Sozinho. A gente acaba sempre voltando pro mesmo ponto. Eu sou a única pessoa que tenho certeza que sempre estará comigo.

Eu sinto que nunca tive um melhor amigo, e isso me parece uma admissão de fracasso vergonhosa. De todas as pessoas que conheci, nenhuma eu poderia contar sempre, confessar segredos, ou fazer outras coisas que melhores amigos fazem, já que me falta experiência nessa área? Algumas pessoas parecem se mover pelo mundo em rebanhos, cercados por amigos, como bebês elefantes cercados pela manada, protegidos dos perigos da vida. Me sinto - sempre me senti - como se estivesse sozinho.

O estranho é que em todos os lugares que vou, as pessoas gostam de mim. Pelo menos demonstram assim. Riem comigo, dançam comigo, brincam comigo. Mas no final das contas, eu venho parar sempre no mesmo lugar. Sempre aqui, falando sozinho. Chorando e me consolando, a voz na minha mente, que sou eu mesmo fingindo ser um observador, me aconselhando. E no fim de tudo, sempre vou me lembrar das vezes em que fui o meu próprio refúgio. No final das contas, nós somos tudo que nós temos.

Ando comigo pela cidade. Pegamos o trem, ônibus e metrô. Vemos os prédios, ouvimos breves relatos de estranhos nos assentos e nos bares. Vemos o pôr do Sol. Vemos as ondas se quebrarem, a lua mostrando a sua atual fase. Talvez dessa vez ela apareça com piercings e tatuagens, mas tudo bem, ela está Crescente. Ah, quer saber? Acho que a Lua já está Cheia disso tudo. Piercings, tatuagens e maquiagem são vistos como fase rebelde, só pela lua estar Nova. Tudo isso de "é só uma fase", acaba Minguando a pobrezinha. Ela aparece como quiser, quando quiser. Não são fases, são metamorfoses. Estamos sempre em mudança. Nossa aparência, a forma de ver o mundo e a vida. As certezas de hoje podem estar tão distantes amanhã. O que hoje te faz chorar, poderá ser lembrado no futuro, quando você se perguntar como pôde se importar tanto. E assim a vida segue, e a gente segue atrás. Tentando errar menos a cada esquina. Ainda que saibamos que seria impossível não errar mais. Ainda assim, que Deus abençoe a tentativa e erro.

Continuo andando comigo, e agora vemos as luzes da cidade se acenderem, e penso se no meu coração ainda está escuro. Talvez esteja, ou não, e tudo bem. O Sol há de brilhar mais uma vez aqui dentro. A favela vai sair do luto, e quase já posso ouvir o baile no topo do morro do fundo do meu coração. 

Tudo que  não fui capaz de falarOnde histórias criam vida. Descubra agora