•Prazeres da Caverna• - Capítulo 2

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Harper

Movi os pés até aos dois vultos, cobridos com uma estranha escuridão, que não me permitia ver nada de seus corpos, exceto as suas figuras. Como fumaça escura, porém... estranhamente sólida

Parei mais uma vez. O que dois féricos fariam ali? O que tinha acontecido? Minhas mãos apertavam bem minha capa, o frio passando por mim como uma garra. Eu tinha que ajudá-los, certo? Com este frio seco e cortante, eles morreriam de hipotermia. Ainda mais com o escurecer se aproximando a passos largos.

Talvez... talvez eu devesse ir embora... Uma vozinha sussurrava na minha mente.

E eu estava disposta a aceitá-la. Só o Caldeirão sabe quem poderiam ser aqueles estranhos féricos, envoltos em sombras.

Conheci o sentimento antes mesmo de ele se formar no meu peito, o coração acelerado mas desta vez por outro motivo. Medo. Engoli em seco. Dei mais uns passos, os corpos agora a poucos metros de mim, podendo agora enxergar entre as brechas das sombras. Não consegui conter o meu gemido de surpresa.

Guerreiros Illyrianos

Um tremor saiu de meus lábios, logo sendo congelado pelo clima frio em minha volta.

Guerreiros Illyrianos. Sim, eu sabia quem eles eram, um povo guerreiro da Corte Noturna. Porém, eu nunca... eu nunca tinha visto um. E agora dois machos de encontravam na minha frente.

Eu não sabia que tinha me afastado tanto de minha aldeia na fronteira entre as Cortes Noturna e Diurna, constatei. Mas não havia erro, eles eram realmente Illyrianos, não bastassem suas enormes asas negras, parcialmente cobertas de neve, as garras surgindo ameaçadoras.

Corra...corra A voz insistia no canto da minha cabeça. Mas escolhi ignorá-la e me aproximei, cruzando a pequena distância que nos separava. Agora de perto, eu conseguia ver entre as sombras. Não consegui evitar corar quando os meus olhos viram os rostos dos Illyrianos.

Lindos... absurdamente lindos

Engoli em seco, lutando contra o repentino calor que vinha de meu pescoço. Olhei para o mais próximo de meus pés. Estava deitado de costas na neve, o rosto pendendo para um dos lados, os cabelos ligeiramente compridos, um tom entre castanho-escuro e preto, espalhados por seu rosto.

Um olhar mais atento revelou os lábios vermelhos e cheios, um pouco entreabertos, a mandíbula forte, os silíos longos sobre os olhos fechados, as orelhas redondas levemente vermelhas, o nariz perfeitamente esculpido, a pele bronzeada mesmo em meio à neve. Lindo, lindo Aquela vozinha de antes me atormentava. A afastei de mim.

Desci meu olhar por o seu corpo musculado, o traje Illyriano que reconheci das gravuras dos livros da história de Prythian, mal o contendo. Porém, também vi com terror gelado duas flechas atravessadas no seu corpo. Uma em sua coxa esquerda, a outra na junção do braço com o ombro. Olhei para suas asas cobertas de neve. Eram... deuses, eram majestosas. Mesmo com toda essa neve, podia notar o complicado caminho de veios, os pequenos ossos que formavam o esqueleto das asas, a cor escura que não chegava a ser preta. Sim, majestosas eram uma boa designação. As membranas estavam dolorosamente esticadas. Cinco. Cinco flechas espetadas em suas lindas asas, três numa e cinco na outra. Olhei para o outro corpo ao seu lado.

Notei, com algum espanto, que as sombras pareciam vir dele, como se lhe obedecessem. Ele estava deitado de bruços, um dos braços servindo de apoio ao rosto. E que rosto.

Os mesmos lábios avermelhados e generosos, o nariz reto, a beleza iluminado as feições. Os cabelos pretos, mais curtos do que o outro, caindo sobre sua testa, o mesmo tom bronzeado. Pareciam os dois exaustos. Olhei em seguida para suas asas, essa tendo sete flechas cravadas, cinco numa e duas na outra. Arquejei. Eu não tinha asas mas com certeza aqueles ferimentos doeriam muito. Apesar de lhe ver apenas as costas, estas eram sem dúvidas bastante musculosas. Não vi nenhum sinal de flechas em seu corpo. Notei a grande espada no seu cinto, e aquele brilho ferino me arrepiou. Quantas pessoas havia ele matado com isso?

Suspirei. E agora, o que fazer?
Pensei em minhas opções. Não podia levá-los para a aldeia, isso estava fora de questão, até porque lá não teria espaço para os tratar, por causa do que tinha acontecido... mas agora não era a altura de pensar sobre isso.

Também não sabia onde ficava o acampamento Illyriano e mesmo que soubesse não sei se conseguiria chegar até lá. Certo, eu conseguia atravessar pequenas distâncias, nada muito especial, apenas alguns poucos quilómetros. E isso era sozinha. quem dirá com dois grandes machos.

Pense! O que posso fazer para ajudar?!

Me concentrei. Estava na floresta, e ainda conseguia reconhecer um pouco do local onde me encontrava. Olhei em volta. Neve e mais neve, árvores depenadas de folhas, os ramos sombrios cobertos por o manto branco e gelado que caía livremente do céu cinzento acima. Se a memória não me falhava, havia uma pequena caverna escondida na neve, utilizada por meu pai, que me tinha mostrado anos atrás e que a usava para pernoitar alguns dias quando estava caçando. Com esse pensamento em mente, fechei os olhos e me agachei entre os machos, tocando de leve seus braços.

Soltei um suspiro, apertei os braços deles sobre o traje com um pouco de mais força e imaginei a caverna na minha mente. E então eu estava atravessando, luzes fortes e iridescentes em nossa volta, quentes e acolhedoras, se fechando sobre nós. E eu apenas agarrei com mais força os dois machos pois o medo de os perder no caminho era maior que a minha vergonha de os estar agarrando tão próximos a mim.

Num segundo, luz branca nos abraçava e no outro estávamos em um chão de terra escura, a escuridão em nosso redor. E eu deitada em cima do macho de cabelos maiores e debaixo do que convocava sombras, meus seios sendo esmagados contra o peito forte do primeiro e o peso do segundo. As suas respirações leves arrepiando meu pescoço e minha nunca. Senti o ar travar na minha garganta e com cuidado, embora minha mente gritasse para eu sair dali o mais depressa possível, consegui sair daquele novelo humano.

Me levantando, passei as mãos pelo vestido branco, agora sujo de terra.

Consegui trazer eles até aqui mas... e agora?

Continua

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