Capítulo 2 - O Canadá e as Aulas

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O apartamento que meu pai alugou pra mim tinha que ser extravagante. Tinha que gritar "olha, eu sou rico!" só pra variar.

Que merda. Eu sinceramente odiava essa coisa.

Ele nem fazia de propósito, claro, mas como se todo mundo não me achasse um babaca por causa disso. Na minha época a gente não tinha dinheiro, eu não tive essa vida fácil, até pelo menos meu pai conseguir se estabilizar na medicina quando eu tinha uns 14 anos. Mas nem queria saber, eu era um babaca só porque meu pai tinha conseguido ser um médico de sucesso.

Qual era o sentido de ter aceitado vir pra cá se ia chover o tipo de gente interesseira que eu tanto odiava aqui também? Eu tinha aceitado justamente pra tentar mudar as coisas e começar uma nova vida. Se fosse pra ficar na mesma, eu ia é voltar. Pra que sofrer duas vezes?

Mas pelo menos, era um local só para mim.

Eu trouxe meu videogame, meu filmes e meus jogos e meus livros, meus tudos. Ia ter um bom tempo aqui. No mínimo ia ser divertido ficar sozinho. Tinha mesa de sinuca lá em baixo também, a banheira hidromassagem no banheiro, frigobar...

Eu nem queria sair mais dali. Pra que eu teria que sair? Tinha tudo que eu podia querer.

Mas minhas idiotas das minhas aulas começavam no dia seguinte, então zero escolha.

Me dar conta de que eu não ia ter praticamente tempo nenhum para aproveitar morar sozinho me deixou puto. Muito puto. E era tão real, porque não teria mesmo.

Mas tudo bem, tudo bem. Não é como se minha vida conseguisse deixar de ser um inferno mesmo.

E era ficar sozinho na verdade. Pelo menos, foi o que eu percebi quando deitei na cama pra dormir. Jet lag do caralho, eu tava morrendo de cansaço e sono e mal eram dez da noite, e não era como se eu estivesse conseguindo dormir.

Tinha pedido uma pizza pro jantar e não lembro se meu pai tinha dito se já tinham feito compras. Talvez eu devesse ir no mercado amanhã.

Também pensei na casa, numa rotina para eu arrumar ela... 

Fiquei imaginando o que a mamãe acharia disso.

Não foi fácil vir pra cá. Óbvio que não. Quando meu pai foi comigo ver ela antes de eu vir para cá, eu juro que quase não senti vontade nenhuma de sair dali.

Sei que é bobo. Ela nem se quer existia mais eu acho. Mas sei lá, só me sentia próximo a ela e um filho melhor quando fazia isso.

Eu precisava dessa coisa sabe, precisava... ter alguma conexão com ela.

Acho que tudo isso era porque ela morreu quando eu era bem novo. Eu tinha... nem 9 anos direito ainda. Sabe, foi bem difícil perder ela naquela altura do campeonato.

Imagino que ela ficaria orgulhosa de mim se pudesse me ver. Ou, não sei, talvez não... eu não tinha sido lado muito bom, não é?

Mas tudo bem. Prometi para mim mesmo que todo ano daria um jeito de ir deixar flores pra ela no mínimo no dia do aniversário. 

Eu queria era ir todo mês, ficar lá conversando e contando as coisas novas no Canadá pra ela e quem sabe, eu podia levar umas flores diferentes e típicas daqui! Acho que ela ia gostar. Mas já tinha aceitado que seria impossível e não ia rolar (o clássico: sem tempo irmão)

Pensei em como brincadeiras em francês da mamãe quando eu era criança iam me ajudar agora. Isso e as aulas particulares que meu pai arrumou para mim.

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