2. Lud

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O sono levou Amadeo de volta aos sonhos de paisagens brancas e geladas, risadas e ovos coloridos, cheiro de tinta fresca... Um tempo feliz enterrado em sua memória.

Naquela noite, Christopher não conseguiu dormir direito,  estava em alerta para caso Amadeo tentasse escapar durante a noite, e os sonhos que o atormentavam toda vez que pregava os olhos colaboravam com aquele sono mal dormido.

Os sonhos do moreno o levaram para o passado, uma memória na qual podia se ver usando um  uniforme desgastado, andando por um grande campo aberto de batalha, coberto pela lama que se formou por conta da chuva que caía. Passava por cima dos cadáveres espalhados pelo chão e logo sua atenção foi voltada para baixo assim que seu tornozelo foi agarrado por um homem ferido que se arrastava em meio a lama.

- P-por favor...Me ajude...e-eu prometi para a minha filha...que voltaria logo -Implorou em meio a grunhidos de dor.

Por conta do idioma Christopher logo percebeu se tratar de um soldado  inimigo, e para a sorte deste, o moreno conseguia compreender duas ou três palavras, o bastante para entender o contexto da frase e decidir o ajudar ao sentir seu coração pesar pela empatia. O soldado moribundo colocou a mão dentro do bolso puxando algo, e foi nesse momento que o reflexo falou mais alto, por medo, Chris estourou seus miolos com o fuzil que portava.Seus olhos se arregalaram com o sangue que voou em sua face e uma intensa sensação de remorso tomou conta de seu corpo ao perceber que o tal objeto nada mais era do que uma pequena foto de uma criança.

Na manhã seguinte, Amadeo despertou cedo, se sentia bem, era estranho e raro se sentir assim. Se levantou, lembrando vagamente de Chris dizer algo sobre a porta. Sempre esteve preso, então foi checar se a porta estaria mesmo aberta e a abriu. Mas logo se lembrou do cachorro, "Maria", se encolheu ainda perto da porta, procurando para ver se o animal estava por perto.

- Ma.. ria? – Falou para checar. Estava com um pouco de medo de sair andando por ali, do que ou quem poderia encontrar.

Escutou uma voz feminina vinda da sala, localizada no andar de baixo, e essa falava alegremente sobre algo que Amadeo não compreendia, porém reconheceu a voz de Chris a respondendo de forma monossilábica. Maria não parecia estar por ali, mas uma voz infantil o respondeu.

- ...vamos brincar!?

Parado ao fim do corredor havia um garotinho que aparentava ter no máximo três anos, seus cabelos eram loiros e seus olhos um azul intenso, muito parecidos com os de Christopher. O pequeno olhava com curiosidade para o platinado, e pareceu não hesitar em se aproximar de Amadeo, sorrindo.

Amadeo ficou confuso encarando a criança. Franziu o cenho.

- Quem...? Quem voc.. – Parecia ter dificuldades para falar, o sotaque era pesado em seu tom de voz e era notável o esforço para lembrar das palavras e ordem certas. – Nome...?

Quando conseguiu organizar aquelas palavras, se abaixou um pouco para ficar mais perto da altura do pequeno. A criança parecia feliz, tudo era estranho.

- Lud!! - Respondeu o menininho, com um enorme sorriso seguido de uma risada alta por conta da forma na qual o outro falava, parecia estar realmente animado e curioso com o fato de haver um indivíduo estranho naquela casa.

- Lud? – Repetiu como se tentasse acertar a pronúncia, logo em seguida apontou para si mesmo. – Amadeo.

Lud ergueu seus bracinhos na direção de Amadeo, como se pedisse para que ele o pegasse no colo, e em uma de suas mãos era possível ver um ursinho em forma de coelho, todo remendado com um dos olhos em falta. Amadeo não o pegou no colo, maneou a cabeça em negativo e só deu um passinho para trás.

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