Parte 1

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1.

      Nunca pegue o seu flatmate. Esse é um ótimo conselho que recebi de inúmeras pessoas que, assim como eu, já haviam feito intercâmbio na Irlanda. Contudo, essa história não aconteceria se eu o tivesse seguido.

      Era a minha primeira viagem internacional. Nunca tinha viajado, nem para fora da minha cidadezinha no interior de Minas. No entanto, senti que precisava. Aquele lugar era pequeno demais para os meus sonhos e planos.

      Então, ouvi falar que podia ir para Dublin, ficar lá oito meses trabalhando e estudando o meu inglês que precisava aprimorar. Pareceu realmente uma opção perfeita para mim. Paguei parcelado, aos trancos e barrancos. Porém, finalmente chegava a hora que tanto esperei.

      Lá estava eu, muito animada, fazendo as malas. Era um desafio pensar no que levar. Minha amiga Daniela me ligou em uma chamada de vídeo.

— Tudo bem aí, Ana?

— Mais ou menos. Eu não tenho muita roupa. Mas quero levar todas essas comidas. — Mostrei para ela o estoque de produtos brasileiros na minha cama.

— Sua louca! Você sabe que lá tem loja brasileira, né?

— Eu sei. Mas não quero gastar meus euros nisso. Foi difícil juntar. E não dá para viver sem pão de queijo e guaraná.

— Você que sabe. Acho besteira.

— São oito meses. É muita coisa.

— Verdade. Tá animada para conhecer os boys irlandeses?

— Tô indo para estudar. Não para arrumar namorado.

— Uma coisa não atrapalha a outra. E nem precisa ser irlandês... Tem gente do mundo todo. Uma menina que conheci no Rio fez intercâmbio lá e pegou vários. Um de cada país.

— Perda de tempo. Quero viajar, estudar, aprender a língua.

— Você pode aprender muitas línguas. — Dani disse rindo do seu trocadilho ridículo.

— Miga, preciso ir. Tenho muita coisa para resolver ainda. E o meu voo é amanhã.

— Ok, mas se precisar de ajuda me avisa que dou um pulo aí. Beijos.

      Desliguei e voltei para a tarefa inicial. Já tinha deixado tudo pronto uma semana antes. Todavia, esqueci de considerar o espaço que precisaria para as comidas. Encarei as coisas entulhadas enquanto pensava no que Dani disse.

      A verdade é que eu não queria ficar com ninguém. Tinha acabado de terminar um relacionamento de dois anos que foi muito tóxico para mim. Queria distância de homem. Planejei cada segundo do meu intercâmbio e com certeza não tinha espaço para nenhuma boca, de nenhuma nacionalidade.


2.

      A viagem para Dublin foi tranquila. Fiquei com medo no avião, já que era a primeira vez, mas logo relaxei e deu tudo certo. O medo ficou de lado, e a animação deu lugar. Estava indo para outro país. Nada podia ser mais maravilhoso do que esse sentimento de entusiasmo que me preenchia.

      Que lugar lindo! Confesso que inicialmente, queria mesmo ir para Inglaterra. Só decidi pela Irlanda porque era mais barato e o visto me permitia trabalhar. Contudo, assim que vi aquelas ruas, os pubs antigos, tudo era tão mágico, que me apaixonei.

      Ainda assim, mal tive tempo para respirar. Tinha muitas coisas para resolver. Só agendei uma semana na acomodação temporária. Então a procura de uma casa fixa era a maior prioridade do momento.

      Entrei em uns mil grupos no Facebook, olhava todas as vagas e ia para lá e para cá procurando quartos. O meu objetivo era encontrar um que eu dividisse com apenas uma pessoa, perto da minha escola de inglês e com bom preço, no máximo 375 euros.

      Contudo, apesar de ter poucas exigências, estava tendo dificuldade de encontrar algo assim. Sempre era caro, ou longe, ou com muitas pessoas no quarto. Estava quase desistindo quando vi um anúncio perfeito. Um brasileiro que ofertava a vaga. Logo marquei de ir ver.

      Chegando lá, a casa era realmente uma gracinha. Adorei. O quarto, perfeito. Grande o suficiente, com duas camas, dois armários, uma mesa de estudo e algum espaço livre, o que era raro em Dublin.

— Nossa, amei. — Disse ao cara.

— Sério? Quero muito o meu depósito de volta. Vai ficar mesmo?

— Sim. Para mim tá perfeito. São 375, né?

— Isso. E 375 de depósito.

— Beleza. Quantas pessoas ao total na casa?

— São 6. Duas por quarto. E tem um banheiro por andar.

— Ótimo. E a menina que divido o quarto?

— Menina? — Ele pareceu confuso. — Não é menina, não. Espero que isso não seja um problema. É um garoto alemão.

      Hesitei por um segundo. A vaga realmente não especificava sexo, mas eu estava esperando conviver com uma mulher.

— Aqui os quartos são mistos. O dono não se importa com isso.

— De boa. Preferia dividir com uma garota, mas sem problemas. Não estou podendo escolher.

— Beleza então.


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