STAY

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Inej se esgueirou pelos telhados de Ketterdam. Não precisava mais andar escondida nas sombras, com Jan Van Eck preso e Pekka Rolings há quilômetros de distância, sua vida não estava mais em risco, mas a familiaridade que havia criado com as lajes da cidade ainda era um conforto.

Sua família havia passado algumas semanas na cidade. Inej aproveitou cada momento para matar a saudade. Agradecia a seus Santos sempre que podia, sem conseguir acreditar que seus pais estavam bem, que Kaz conseguira trazê-los a seu encontro.

Apesar de ter passado momentos incríveis com eles durante os dois meses que se estabeleceram em Ketterdam, recusou a oferta de voltar com os Sulis. Sentia falta de participar dos espetáculos da família e teria saudade de seus pais, mas ela sabia que seu objetivo não seria alcançado se ficasse presa a eles. Seu barco estava estacionado no porto, esperando por ela e sua tripulação para que a caça a vendedores de escravos começasse. Todos os preparativos para começar a jornada estavam quase prontos.

Os telhados começaram a se tornar ainda mais familiares e Inej foi engolida pelo sentimento de nostalgia. Sentou-se na beirada de um dos prédios, de onde era possível ver o Barrio. Se lembrou de todas as noites que caminhara sob a luz da lua para chegar ao que tinha de mais próximo de um lar. Fazia algumas semanas que não fazia aquele trajeto. Com seus pais na cidade, não teve tempo de visitar a antiga casa. Estava morando com Wylan e Jesper na mansão, não tinha outro lugar para ir e o conforto com o qual se acostumara a viver no últimos meses era algo que não pretendia deixar muito cedo.

Se levantou e continuou o percurso. Silenciosamente, como o Espectro, chegou à única janela que ainda tinha as luzes acesas. O quartinho do porão estava iluminado pela fraca luz das velas e Inej observou a figura sentada na escrivaninha. Kaz estava debruçado sobre uma mesa cheia de documentos, seus cabelos escuros caíam sobre seus olhos e suas mãos se ocupavam virando as páginas de um livro. Inej desfez a tranca e entrou no quarto. Não havia feito ruído algum, mas o olhar de Kaz se levantou para encontrá-la em pé, ao lado de sua cama, e logo voltou para sua antiga tarefa.

"Não esperava sua presença hoje," Kaz continuou lendo seu livro, sem levantar a cabeça para cumprimentá-la.

"Acabei de voltar do porto," ela disse, se acomodando na cama.

"Espero que tudo tenha corrido bem."

"Espero que sim," Inej disse, se lembrando da última vez que vira seus pais antes de reencontrá-los. Sentiu seu coração acelerar e o medo começar a dominá-la, mas tentou se lembrar de que eles estavam acostumados a viajar pelos mares e que dessa vez, saberia de seus paradeiros.

"Como estão as coisas na mansão?" O olhar de Kaz estava fixo nela e ela sabia que ele notara seu momento de terror.

"Está tudo bem. Jes está conseguindo se segurar em relação às apostas, apesar de Wylan ter me dito que alguns dias atrás o pegou tentando escapar para uma casa de jogos."

"Clássico Jesper," um pequeno sorriso apareceu no rosto de Kaz. Fechou o livro e o guardou na prateleira. Levantou-se se espreguiçando e dirigiu-se ao seu armário improvisado. Inej assistiu enquanto ele retirava uma blusa limpa de dentro da gaveta.

"Onde está indo?" Ela perguntou. Sabia que os dias de Kaz eram cheios e eram raras as vezes que ela o vira deitar-se para descansar, podia ver o cansaço sob seus olhos.

"Tenho alguns negócios a resolver," ele disse desabotoando sua camisa. Inej se levantou e se posicionou atrás dele.

"É urgente?" Ela perguntou.

"Você sabe que tudo é urgente no Barrio, Inej." Ele se virou e seus olhos se encontraram.

"Não tem mais ninguém que possa fazê-lo por você?"

Ele a encarou, seu olhar seria amedrontador se Inej não tivesse se acostumado a ser encarada daquela forma. "Por que se importa?" Ele continuou a desabotoar a camisa.

"Posso ver que não descansa há dias." Colocou a mão sobre a mão de Kaz para impedi-lo de continuar a tirar a camisa. Sentiu-o endurecer com o seu toque.

"Não preciso de descanso," sua voz saiu dura, como se lutasse internamente. Ela já havia tocado nele sem que ele estivesse de luva outras vezes, mas ainda levaria tempo para que ele desassociasse o toque a algo obscuro de seu passado.

"Kaz," ela disse seu nome com delicadeza. Encontrou seu olhar e ele soltou os botões de sua camisa. Estava aberta, porém ele não fez menção de tirá-la e colocar a nova. Ele a olhava com um olhar profundo e Inej sentiu a tensão sair de seu corpo. Viu seus ombros relaxarem e sentiu-o segurar sua mão e entrelaçar seus dedos.

"Não consigo fazer isso sozinho." Isso. Dormir. Ele negava o sono para não ficar a mercê de seus sonhos. Não podia controlar as imagens produzidas pelo seu cérebro quando não estava acordado. Inej o compreendia mais do que ele pensava.

"Não precisa," ela começou a conduzi-lo até a cama. "Ficarei com você."

Kaz assentiu. Sentou-se na cama ao seu lado e a encarou. Inej se deitou e esperou até que ele fizesse o mesmo. Podia sentir as imagens de seu tempo no Menangerie invadindo sua mente, mas tentou se controlar. Lembrou-se de que o homem que estava ao seu lado nunca se aproveitaria dela.

Os dois ficaram deitados, olhando para o teto, cada um contemplando o peso de seus passado. Inej sentiu os dedos de Kaz roçarem os seus depois de um momento. Virou o rosto para observá-lo. Ele já a encarava.

"Nunca fiz isso antes," ele disse, sua voz rouca quase inaudível.

"Para tudo se tem uma primeira vez," ela respondeu, se aproximando.

Kaz a acompanhou com o olhar, pousando-o em seus lábio e se aproximando mais um pouco. Inej podia sentir sua respiração quente em seu rosto, mas não se afastou. Focou nos olhos escuros de Kaz, nas pequenas sardas em seu rosto que ela nunca veria se nunca tivesse chegar tão perto. Queria algo mais, queria que ele a tocasse, que ele a abraçasse. Estavam prontos para isso?

A mão de Kaz se levantou para tocar o rosto de Inej. Delicadamente, contornou o desenho de sua face com o dedo. Não estava tremendo.

"Não me abandone," ela sussurrou. Ele assentiu e pousou a mão em sua cintura, trazendo-a para mais perto. Agora, seus corpos se tocavam por completo. Inej apoiou a cabeça em seu peito e ouviu a respiração calma de Kaz. Fechou os olhos e, pela primeira vez, dormiu sem se preocupar com seus pesadelos.

KANEJ ONE SHOTSOnde histórias criam vida. Descubra agora